Observatório de Geopolítica discute o papel Brics além das parcerias comerciais

Um dos assuntos do programa Observatório da Geopolítica da última quarta-feira (21), cuja temática é Brics, foi a possibilidade de parcerias além da área comercial, com espaço para debates e alianças da sociedade civil. 

Para comentar os avanços neste sentido, reunidos na plataforma P2P (People to People), o apresentador e cientista político Pedro Costa Jr. contou com a contribuição da pesquisadora associada do GEBRICS Taunah Pereira.

A cada nova cúpula dos Brics, o bloco formado originalmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, reforça seu papel geopolítico no cenário internacional. Porém, longe dos holofotes políticos, cresce discretamente um outro movimento: a articulação da sociedade civil em torno do agrupamento. 

Durante a presidência brasileira, o destaque vai para a criação do Conselho Civil do Brics, marco importante para dar mais institucionalidade à participação popular no bloco.

Tainah pontou que, embora o Brics seja um grupo de alto nível geopolítico, com estrutura ainda pouco institucionalizada, sua face mais sólida é o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB). 

Criado para financiar projetos em países emergentes, o NDB é frequentemente chamado de “Banco do Brics”, apesar de nem todos os membros do chamado Brics+ fazerem parte da entidade. Hoje, apenas Emirados Árabes Unidos e Egito, além dos cinco fundadores, integram o banco.

No entanto, o que tem ganhado força nos bastidores do bloco é a atuação de movimentos civis. Segundo a pesquisadora, esse envolvimento não é exatamente novo, mas ganhou corpo a partir de 2010, com a realização do primeiro fórum empresarial durante a cúpula do Brics. Três anos depois, foi criado o Brics Business Council (C-Brics), voltado para pautas de comércio, indústria e investimentos.

Conselho Civil

O fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento também motivou o surgimento de iniciativas mais críticas ao bloco, exigindo maior escuta e participação da sociedade. Surgiram, então, articulações como o “Brics From Below”, conceito cunhado pelos pesquisadores Ana Garcia (Brasil) e Patrick Bond (África do Sul), que passou a reunir movimentos sociais e acadêmicos atentos às consequências sociais das decisões tomadas pelo grupo.

Outro nome de destaque é o pesquisador Oliver Stuenkel, que analisou o fenômeno como um “efeito de transbordamento” ou “socialização de burocracias”, refletindo a inserção da sociedade civil em áreas menos tradicionais da pauta do Brics, como saúde, cultura, educação e direitos humanos.

Hoje, há mais de cem espaços de cooperação vinculados ao Brics, com temas diversos. Alguns dos mais emblemáticos incluem a Rede Universitária Brics, com programas de intercâmbio acadêmico; os Brics Games, que promovem competições esportivas; o Brics Fashion Summit, voltado à moda; o Cyber Brics, que debate segurança digital; o Brics Feminist Watch, com foco nos direitos das mulheres; e o Festival de Cinema do Brics, voltado ao intercâmbio cultural.

Apesar da diversidade, a quantidade de iniciativas dificulta o acompanhamento sistemático. Por isso, a presidência brasileira definiu oito espaços prioritários de cooperação – considerados mais organizados e alinhados aos objetivos atuais do bloco – para receber apoio institucional e promover maior regularidade nos encontros.

Um avanço institucional e simbólico

A criação do Conselho Civil do Brics durante a presidência brasileira é considerada um dos maiores avanços recentes. A estruturação desse conselho representa um degrau importante dentro do chamado “Brics Social”. Segundo especialistas, existe uma hierarquia informal dentro dessas estruturas participativas: conselhos possuem mais peso que fóruns, que por sua vez estão acima de grupos e encontros. Por isso, o reconhecimento formal de um conselho fortalece a interlocução entre sociedade civil e lideranças do bloco.

Mas o caminho está longe de ser simples. A pluralidade interna dos países Brics gera conflitos sobre o que deve ser considerado “participação social”, especialmente em contextos políticos e culturais tão distintos quanto os de Rússia, China, África do Sul, Índia e Brasil. 

A barreira linguística também é apontada como um obstáculo relevante: apesar de ser um bloco multilateral, o inglês segue como língua de trabalho, o que dificulta a integração de países como Brasil, Rússia e China.

P2P: a força das relações de pessoa para pessoa

Apesar dos desafios, cresce o interesse na chamada plataforma P2P, que tem se tornado uma das prioridades no atual momento do Brics. Essas conexões humanas, promovidas por iniciativas da sociedade civil, mantiveram o grupo ativo mesmo quando os governos demonstraram pouco entusiasmo.

“O Brics já passou por períodos em que não era prioridade para alguns países, como o Brasil. Ainda assim, o envolvimento da sociedade civil manteve o bloco vivo, com encontros, intercâmbios e redes que seguiram funcionando”, destaca Tainah.

A expectativa agora é que, com maior estrutura e reconhecimento, a sociedade civil tenha ainda mais protagonismo na construção de um Brics mais plural, inclusivo e conectado com as demandas sociais dos países-membros.

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