Com um artigo intitulado O crescimento econômico esconde a realidade do desemprego (Revista Focus Brasil, 16/7/2024) o dirigente petista Alberto Cantalice apela para a fantasia ao dizer que “os resultados alcançados pela equipe econômica do governo Lula III surpreendem os ‘analistas’ do mercado, inibe as apostas negativas da mídia e melhora a imagem pública do governo”, aparentando completo alienamento do meio social m que vive e de todo o debate promovido pelo próprio partido em relação à proliferação de memes criticando a política do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Quais, no entanto, seriam os resultados “surpreendentes” alcançados pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva? Cantalice responde:
“A geração de 2,5 milhões de empregos, em 1 ano e meio de governo é outra boa notícia que é obscurecida por parte da mídia e cujo crédito exclusivo é da normalidade e da previsibilidade das ações governamentais sem pirotecnia ou magia. Sem contar o aumento dos investimentos públicos e privados e a melhora significativa favorável ao país no balanço de pagamentos.”
Parece muito, mas o Instituto de Pesquisa Econômica Avançada (IPEA) estipulou o desemprego real no mês de maio de 2024, afligia 16,1 milhões de pessoas, entre desempregados oficiais (7,8 milhões), os 5 milhões de trabalhadores sub ocupados, que não tem um emprego verdadeiro (trabalhando menos horas do que a média da força de trabalho) e por fim, mais de 3,3 milhões de trabalhadores “desalentados”, isto é, que por diversas razões, desistiram de procurar ocupação. Finalmente, até o mesmo balanço, entre os trabalhadores que não estão desempregados, o Brasil conta com mais de 39,13 milhões de “informais”, setores esmagados da classe que vivem dos famosos “bicos”, o que nem por acaso pode ser confundido com um trabalho no sentido econômico do termo. Uma chaga produzida pelos governos neoliberais dos anos 1990 e que permanece sem solução, mas que tornam o desemprego real imensuravelmente maior.
Tudo posto, teria que ser visto a qualidade desses 2,5 milhões de postos, mas finalmente, são incapazes de mudar significativamente o quadro geral desolador para a classe trabalhadora. Mais, desde o duro ataque aos direitos trabalhistas promovidos pelos governos golpistas, a elevada volatilidade do mercado de trabalho, esses empregos podem ser criados em um trimestre e extintos em outro.
Sobre o enfrentamento necessário aos ataques empreendidos pela política golpista e que deterioraram significativamente as condições de vida dos trabalhadores, Cantalice nada tem a dizer. Até agora, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem enfrentado uma dificuldade extrema em fazer qualquer coisa a respeito, entre outras coisas, pelas pressões que a ala direitista exerce sobre o Palácio do Planalto (sede do governo federal), o autor entre eles.
A defesa feita por Cantalice do programa econômico do ministro “Taxad”, com isso claro, é acima de tudo uma posição assemelhada ao famigerado aforismo do general da Ditadura Militar (1964-1985), Emílio Garrastazu Médici, sob cujo governo (1970-1974), a economia ia bem, mas o povo, mal. Ao dizer que os resultados da política de Haddad “surpreendem os ‘analistas’ do mercado” e apresentar concretamente “2,5 milhões de empregos em 1 ano e meio de governo”, Cantalice faz um malabarismo similar. O problema é que Médici estava no poder para garantir os interesses dos inimigos do povo trabalhador, ao contrário de Lula, que venceu as eleições apoiado pelos trabalhadores em luta contra o que Cantalice chama eufemisticamente de “mercado”, isto é, o imperialismo.
“O país cresce”, continua, “os cortesãos do ‘mercado’, seus bonecos de ventríloquo, insistem em reafirmar ser o Presidente Lula um homem de sorte. Não é sorte. É trabalho. Não custa nada reconhecer”, diz. Falar que “o país cresce” é exatamente os direitistas fazem ao comentar índices isolados, como a projeção de que o PIB cresça míseros 2,09% ao final do ano, tirando tais indicadores, porém, do quadro geral da economia nacional, que marcada por uma escalada crescente dos preços em total descompasso com os reajustas salariais e por um desemprego extremamente elevado (que por sua vez, empurram os salários para baixo e colocam mais pressão sobre a classe), indicam uma melhora meramente contábil da economia.
Temos, portanto, um endosso à política que tem colocado o governo do presidente Lula contra a parede no artigo. Cantalice atua não como um dirigente dedicado a orientar as bases populares que apoiam o governo, mas como um animador de torcida, alguém que se vale de ilusões totalmente fora da realidade para tentar elevar o moral dos apoiadores do governo. Da forma como o faz, no entanto, só pode atingir uma camada mais privilegiada da esquerda, que sem sofrer as pressões contra os salários que sofrem os setores mais esmagados da população, tendem a se deixar levar pelo sonho cor de rosa do autor.
“A pauta é a economia. É ela que tem potencial para encurralar os inimigos do Brasil: tributando altas rendas e diminuindo a perversa concentração de rendas que envergonham o país e dificultam o verdadeiro crescimento do Produto Interno Bruto e da Paridade do Poder de Compra da nação (PPC).”
De fato, os dramas mais urgentes da classe trabalhadora colocam os problemas econômicos como uma prioridade, um nó para o presidente Lula destravar, sem o que, o governo tende a se desmoralizar muito rapidamente e impulsionar, com a mesma rapidez, um fortalecimento das forças reacionárias. Ocorre que a solução para o entrave econômico não se traduz em melhoras meramente vegetativas deste ou aquele indicador isolado, mas da economia de conjunto.
Para isso, é necessário que Lula enfrente a ala direitista de seu governo, se livre das pressões contrárias ao desenvolvimento nacional real e adote um programa que traga êxitos verdadeiros, de impacto à vida dos trabalhadores. Isso não será feito, porém, sem um rompimento com o conjunto de alianças com a direita feitas durante o período eleitoral, o que em outras oportunidades, foi entusiasticamente defendido por Cantalice.
As ilusões difundidas pelo dirigente petista, dessa forma, tem uma finalidade prática: manter o arranjo político que trava o governo. Por isso, essa defesa desmoralizante da política de Haddad deve ser entendida como o que realmente é, um ataque à política desenvolvimentista de Lula e uma defesa da famigerada frente ampla.