No dia 11 de Setembro ( quinta-feira) a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, em um julgamento técnico ( e não político), por 4 votos (Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin) contra 1( Luiz Fux) fundamentada a Primeira Turma, então, em farta prova documental ( lives, anotações em agendas, troca de mensagens apreendidas, transcrições de áudios e um documento intitulado minuta do golpe) condenou Jair Bolsonaro.
A Primeira Turma do STF também condenou os demais integrantes do núcleo crucial da trama golpista:
Alexandre Ramagem, Almir Guarnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Souza Braga Netto por constituírem organização criminosa armada, sob a liderança de Bolsonaro, visando por meio de Golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito impedir a alternância de poder, após a derrota no escrutínio de 2022.
As penas imputam ainda responsabilização por dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
No caso específico de Bolsonaro, líder da organização criminosa armada e, portanto, maior beneficiário na eventualidade de êxito da trama golpista, sua condenação – já aplicadas as atenuantes devido o réu já ter mais de 70 anos – ficou assim especificada:
☆ 7 anos e 6 meses, por liderar a organização criminosa armada.
☆ 6 anos e 6 meses, por tentar abolir violentamente o Estado Democrático de Direito
☆ 8 anos e 3 meses, por articular um Golpe de Estado
☆ 2 anos e 6 meses, por dano qualificado
☆ 2 anos e 6 meses, por deterioração do patrimônio tombado
Logo, totalizando sua condenação em 27 anos e 3 meses, dos quais 24 anos e 9 anos de reclusão e 2 anos e 6 meses de detenção mais 124 dias-multa de 2 salários mínimos.
Bolsonaro que já cumpre prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica por decisão do STF, que adotou a medida cautelar, para a apuração do suposto crime de coação, a fim de obstruir a investigação referente a organização criminosa e atentado à soberania nacional ainda não será preso mesmo com esta condenação pelos 5 crimes praticados; sim, não será preso de imediato, pois, a decisão judicial não sendo ainda definitiva não pode ser executada, uma vez que, antes do trânsito em julgado cabe, portanto, recursos como:
● os embargos de declaração que embora não mudem o mérito da decisão ou seja, o resultado do julgamento visam esclarecer eventuais dúvidas, possíveis ambiguidades ou supostas omissões da sentença podendo, assim, reduzir a pena.
● e os chamados embargos infringentes, que é o recurso da defesa que pode alterar o resultado do julgamento, se houver 2 votos divergentes e que, no entanto, julgo, neste caso, ser impossível de ocorrer.
Então, que o condenado não alegue posteriormente, que não houve amplo direito de defesa, uma vez que, em estrita observância e obediência à Carta Magna, o processo legal é reverenciado assegurando-se à execução da pena somente após o trânsito em julgado e, portanto, após a apresentação de todos os recursos pela defesa.
Desta forma, a Suprema Corte, ao condenar os criminosos respeitando a Constituição, desde já sinaliza aos radicais e extremistas adeptos da revolta antidemocrática, que eventuais novas aventuras autoritárias serão, sem perdão, exemplarmente punidas.
A Suprema Corte firma ainda sua autonomia como um dos Três Poderes constituídos e ao condenar os mentores da trama golpista do 8 de Janeiro, desde já sinaliza que a busca pela pacificação nacional não se confunde em ser conivente com os crimes praticados, nem procura beneficiar-se os membros da Corte sujeitando subtrair-se da pena os criminosos, quer seja por covardia ou corrupção de caráter.
A Suprema Corte ainda reafirma a soberania do Brasil e de suas instituições ao condenar Bolsonaro e a cúpula golpista, ao não se render: nem as pressões, nem às chantagens do presidente norte-americano, Donald Trump, que impôs tarifas aos produtos dos EUA, por querer interferir no julgamento de Bolsonaro.
A quem poderá alegar, seja de direita ou mesmo de esquerda, para desprestigiar minha consideração à mais alta Corte, que o próprio Supremo fez parte do Golpe de Estado e que seus membros estavam inclinados ao impulso golpista adotando, então, postura diversa apenas e tão somente, quando constatou-se que o próprio Supremo seria alvo das pretensões de Bolsonaro e da extrema-direita, a fim de perpetuar-se no poder o núcleo deste grupo político autoritário.
Para tanto alegar-se-á que, no caso de Lula, não houve, por parte do Supremo, cumprimento ao mandamento constitucional ( e isto é verdade), não sendo acatado o trânsito em julgado e, portanto, sequestrando-lhe o Supremo as garantias constitucionais ao renunciar-se ilegalmente, ao preceito da presunção de inocência; preceito este conforne reza a Constituição e que considera que todos são inocentes até que se prove o contrário ( e, de fato, fica-se por isso, indignado com a postura injusta daquele Supremo).
No entanto, há de se considerar, e alerto a título de esclarecimento, que não só as circunstâncias históricas eram outras, mas também que a composição do Supremo era diversa e sendo assim, conivência, omissão e covardia juntas ou separadamente e em distintos graus cooperaram para que aquela Suprema Corte, em outro contexto histórico se posicionasse como coautora de um Golpe de Estado que, felizmente, não vingou.
Hoje, porém, não só o contexto histórico está mudado ( com o avanço das forças progressistas capitaneada pelo Partido dos Trabalhadores) como também transformou-se subjetivamente alguns ministros do Supremo ( ao meditarem sincera e profundamente sobre o erro que incorreram ao lançar o país à beira do abismo de uma aventura autoritária como, por exemplo, Gilmar Mendes), bem como alterou-se a própria composição da Corte (com a presença de Cristiano Zanin e Flávio Dino), o que, no conjunto, possibilita, então, subsídio suficiente para assegurar que, ao menos atualmente, a Suprema Corte zela, de fato, pelo ordenamento jurídico, uma vez que, a rigor não se pode mais dizer tratar-se do mesmo Supremo.Ou seja, a tese por mim defendida é que: o Supremo que agindo justamente condenou Bolsonaro, não é o mesmo que injustamente agindo condenou Lula.
Com efeito, sem subsumir – penso – o Supremo ao contexto histórico modificado pelo avanço das forças progressistas, bem como desconsiderando-se as mudanças no bojo da Corte por meio da introdução de novos membros afeitos aos valores democráticos e, inclusive, as alterações que se dão também no curso da subjetividade de alguns membros do Supremo que ao reavaliarem suas posições equivocadas modifica-as, sem, portanto, considerar-se esta constelação de mudanças havidas, mantem-se uma interpretação rígida, ossificada, estreita, enfim, superficial da atuação da Suprema Corte por não considerá-la dialeticamente tão mutável como tudo que é vivo e, com isso, interpreta-se, julga-se e condena-se um Supremo, desconfiando-se,hoje, de seu amor à Justiça, quando, na verdade, aquele Supremo comprometido com o golpe ( e que ao arrepio da lei condenou Lula) já nem existe mais.
Daí porque, não só faço esta distinção técnica entre o Supremo ( o de antes: golpista e o atual: guardião da Constituição), mas também a necessidade de que, sobretudo, os ativistas e militantes de esquerda e progressistas em geral, sempre se mantenham vigilantes quanto a introdução de novos elementos autoritários no cotidiano das instituições ou nos círculos sociais ( família, relações pessoais, igreja, etc), pois, é na “repressão” de posicionamentos antidemocráticos no dia a dia, que será possível impedir outra contaminação do corpo social e a extensão de mais uma doença autoritária por este organismo vivo que é a sociedade.
A condenação do núcleo golpista é a prova cabal que, hoje, o Supremo, não é o mesmo de ontem e que havia se enamorado do projeto autoritário em andamento.
O Supremo, hoje, faz jus à sua vocação de guardião da Constituição e ao condenar Bolsonaro e os demais delinquentes integrantes do núcleo da trama golpista pelos crimes cometidos, sinaliza desde já para que: a Justiça prevaleça no Brasil desencorajando novas reincidências criminosas e aventuras autoritárias que atentem contra a ordem democrática e o Estado Democrático de Direito, ainda que se saiba – sem ilusões- que a democracia brasileira ainda é sim insuficiente para abarcar o conjunto da população, mas é preciso também admitir-se que se está em pleno desenvolvendo, a fim de aprimorar-se a nossa democracia e elevá-la a uma etapa superior de beleza e perfeição.
Charles Gentil
Presidente do Diretório Zonal PT do Centro (em final de mandato)