Foi publicada no dia seis deste mês uma coluna no portal Brasil 247 intitulada É trágico, mas se Trump decidisse materializar a “Riviera de Gaza-Auschwitz”, essa barbárie não seria impedida, assinada pelo colunista Jeferson Miola. O texto trata dos pronunciamentos recentes do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, após reunião com o primeiro-ministro de “Israel”, Benjamin Netaniahu, na qual Trump anunciou planos para a intervenção direta dos Estados Unidos em Gaza.
Segundo a coluna, não haveria nenhum impedimento para que o plano, que incluiria a expulsão de todos os moradores de Gaza, fosse colocado em prática. Os EUA não seriam confrontados por nenhum outro país, já que, segundo o artigo, as chamadas “potências mundiais” teriam medo de se envolver em uma guerra contra os norte-americanos.
A posição do colunista é compartilhada por muitos setores da esquerda brasileira e mundial, que olham para o genocídio na Palestina com horror, mas não acreditam em solução alguma. Isso demonstra o nível de pessimismo e medo que assola a esquerda em muitos países. Segundo as conclusões desses setores, nada poderia ser feito, já que a resposta dos opressores seria implacável, enquanto a população não teria meios para sair vitoriosa.
Em primeiro lugar, as chamadas “potências mundiais”, com exceção da Rússia e da China, são países imperialistas, que não apenas não entrariam em conflito contra os Estados Unidos para salvar os palestinos, como também ajudam “Israel” no genocídio desde sua fundação. Da forma como a questão é colocada na coluna, Miola também ignora que o governo anterior ao de Trump foi quem apoiou o genocídio por 15 meses e que, poucos dias antes da posse do novo governo, um acordo de paz já havia sido sabotado.
Isso, somado ao fato de que Trump é conhecido como falastrão, coloca em dúvida se realmente o plano de expulsar os palestinos de Gaza será colocado em marcha ou se tudo isso não passa de uma cortina de fumaça para encobrir que a derrota de “Israel” para a Resistência foi catastrófica e que o governo de Netaniahu ainda está por um fio. As palavras de Trump, portanto, podem ser simplesmente uma bravata, visando a não retirar Netaniahu do governo e, assim, impedir uma catástrofe ainda maior para o imperialismo na região.
No entanto, mesmo que o plano seja verdadeiro, é preciso lembrar que o genocídio em Gaza gerou uma das maiores crises da história do imperialismo, com a queda do governo no Canadá, a liquidação de Olaf Scholz na Alemanha e os sucessivos golpes de Estado de Macron para se manter no controle do governo francês, além da derrocada do Partido Democrata nos próprios Estados Unidos. Tudo isso ocorreu devido ao repúdio da população desses países ao genocídio.
Então, mesmo que não houvesse impedimento por parte dos demais países imperialistas em relação ao plano apresentado por Trump – como de fato, já dissemos, nunca houve qualquer obstáculo ao genocídio na Palestina por parte do imperialismo –, outros setores desses países se colocariam contra essa política, como já ocorreu ao longo dos últimos 15 meses.
A questão principal, porém, não está no repúdio internacional ou na solidariedade entre os povos. O ponto central em relação à Palestina diz respeito ao próprio povo palestino, que combateu a ocupação israelense de armas na mão. Dissemos acima que Trump, antes de tomar posse, já havia costurado um acordo de cessar-fogo entre “Israel” e a Resistência na Palestina, em especial o Hamas. Mas o que realmente levou ao acordo não foi um ato de vontade de Trump, mas sim a derrota sofrida por “Israel” em Gaza.
O número de soldados israelenses mortos ou inválidos é enorme, tanto que “Israel” tentou enviar à guerra os haredim, judeus ortodoxos que se opõem ao alistamento militar por motivos religiosos. A sociedade israelense enfrenta grandes dificuldades para reativar a guerra em Gaza, assim como não conseguiu lidar com o Hesbolá no Líbano e tampouco está conseguindo conter os palestinos na Cisjordânia.
Da forma como Miola apresenta a situação, no entanto, fica a impressão de que a resistência não existe em todo o Oriente Médio ou, caso exista, não tem meios para lutar. Nada poderia estar mais distante da realidade. Após o acordo de cessar-fogo, inúmeros vídeos surgiram nas redes sociais mostrando que o Hamas e os demais grupos da Resistência Palestina estão mais vivos do que nunca, bem armados e contando com o apoio total da população local.
Para que o plano de Trump e Netaniahu fosse colocado em prática, seria necessário derrotar a resistência. A pergunta que fica é: “Israel” tem os meios para derrotar o Hamas em Gaza e expulsar os palestinos? Se sim, por que não o fez antes, quando já tinha o exército em Gaza?
É preciso lembrar também que a ideia de enviar os palestinos para outros países não é nova. No início do genocídio, o imperialismo já havia tentado convencer o Egito a receber a população palestina. No entanto, além de o Egito ter negado a possibilidade, “Israel” não conseguiu vencer a Resistência para que isso fosse viável.