Para os analistas geopolíticos, o declínio e a decadência do imperialismo e do seu centro nos EUA, já é um fato considerado objetivo e histórico. A extraordinária combinação de arrogância e ganância da burguesia imperialista norte-americana é um dos fundamentos que impede uma transição para uma sociedade e economia não imperialistas.Outra característica desta burguesia é a certeza de sua supremacia racial e a hegemonia ideológica que permeia o capitalismo anglo-americano, que não admite a Ásia como o novo centro do poder global.
O que torna esta situação mais dramática é o fato de que nenhum império anteriormente dominante chegou a ter o poder militar que os EUA possuem com 800 bases militares em 140 países, e uma quantidade de ogivas nucleares capaz de destruir o planeta várias vezes. Trata-se de uma ameaça permanente do imperialismo norte americano contra o conjunto da humanidade, já que, quando julgou necessário, ele não vacilou em destruir duas cidades no Japão, sem motivo militar evidente.
No entanto, o que realmente sustenta o império americano não é o poder militar, mas o poder econômico. Uma das bases desse poder assenta-se numa medida de força, adotada um pouco antes do final da segunda guerra mundial, a implantação do sistema de Bretton Woods. Na Conferência realizada na cidade de mesmo nome, em 1944, a proposta racional era a de criação de uma moeda internacional que não fosse a moeda de um país, cuja circulação seria controlada por um Banco Central Internacional.
Com a truculência de sempre, os Estados Unidos exigiram que a moeda internacional fosse o dólar, sendo o sistema econômico mundial coordenado por instituições onde o país tinha total poder de controle: o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. Tal como previa Keynes, cuja proposta de moeda internacional fora rejeitada, o governo dos EUA denunciou unilateralmente o Acordo, em 1971, ao retirar a conversibilidade do dólar em ouro.
Surpreendentemente, o dólar se manteve como moeda internacional em grande parte devido ao engenhoso acordo de petrodólares com a Arábia Saudita, recentemente denunciado por este país. Durante 70 anos o dólar foi a moeda que definia o preço de todas as matérias-primas do mundo; e a maioria dos países era obrigada a obter dólares para seu comércio internacional e para ter reservas cambiais. O imperialismo norte americano teve neste período três vantagens principais: (1) ser o maior exportador de quase todas mercadorias mesmo mantendo enorme déficit comercial e fiscal;(2) Denominar as dívidas externas dos países em dólar e obrigá-los a gerar excedentes exportáveis para obter os dólares necessários;(3) Usar a moeda para impor sanções e punir nações que não atendam aos interesses econômicos, políticos e ideológicos dos EUA.
Outro fator fundamental para a hegemonia norte-americana foi implantar um sistema cultural e informativo para difusão das idéias e valores capitalistas através de um sistema eletrônico internacional começando pelo rádio e o cinema e chegando às redes sociais atuais. Tudo isto facilitou a imposição de regimes políticos adequados aos interesses imperialistas, tembora sob a denominação geral de “democracia” mas sustentado, quando necessário, por cruéis e violentas ditaduras militares ou não.Esse sistema imperialista, que dominou o mundo no século XX, inclusive com a vitória sobre a URSS, seu principal inimigo econômico e ideológico, já entrou em um período de declínio.
Os sinais do declínio
Os EUA apesar da sua força militar, fazem guerras para destruir os países mais fracos militarmente e não conseguem a partir daí criar uma economia que seja provedora de recursos para o país. Países como o Iraque, a Líbia, Síria e Afeganistão são exemplos do desastre americano.Tiveram que sair em fuga do Afeganistão, destruíram a Líbia, um dos países mais desenvolvidos da África, hoje com dois governos, destruíram também o Iraque e a Síria, dos quais roubam o petróleo e que possuem guerrilhas que fazem parte do eixo da resistência a favor de Gaza. Nesta região a sua grande reação é patrocinar o genocidio contra a indefesa Gaza. Não conseguiram deter os iemenitas na sua guerra de solidariedade em favor de Gaza.Desde 2022 os EUA estão a perdendo a guerra por procuração contra a Rússia na Ucrânia.
O orçamento militar anual dos EUA e dos países da OTAN combinados ascende a espantosos 1,6 trilhões de dólares. Isto é 25 vezes mais do que o orçamento militar russo. No entanto, depois de mais de dois anos de conflito, a Rússia continua invicta. A Rússia é capaz de fabricar mais munições do que os desindustrializados EUA e Europa juntos! Além disso, toda produção bélica estadunidense depende de produtos e componentes chineses, incluindo elementos de terras raras, que são essenciais para praticamente todas as armas de alta tecnologia.
A China agora tem a maior marinha do mundo, com capacidade de construção naval 250 vezes maior que a dos Estados Unidos.A China é muito mais avançada do que os EUA na produção dos drones. China e Rússia possuem mísseis hipersônicos em atividade, que os EUA nem desenvolveram ainda. A chamada Pax norte-americana estará oficialmente morta num futuro próximo.
A falência do dólar
O esforço de desdolarização acelerou em todo o mundo desde a imposição de sanções draconianas à Rússia e o roubo de trezentos bilhões de dólares em moeda russa, há dois anos. O comércio bilateral sino-russo é atualmente 90% realizado em moedas locais: rublo e yuan. Globalmente, mais de 50% de todas as transações transfronteiriças na China são atualmente realizadas em RMB chinês (e este valor foi praticamente de 0% em 2010). Em breve haverá o petroyuan, isto é, quando a Arábia Saudita e outros membros da OPEP começarem a vender petróleo e gás em troca do yuan chinês. Os BRICS+, que estão criando seu próprio sistema financeiro alternativo para contornar o dólar, o euro e o sistema SWIFT.
A economia imperialista em declínio
O colapso dos mercados bolsistas das principais economias no início de agosto, que começou nos EUA, não durou muito. Mas a queda no índice S&P-500 dos preços das ações das 500 maiores empresas americanas mantém o índice ainda abaixo do seu pico em meados de Julho e do início do “colapso” no final de Julho. Assim, parece que a grande recuperação das bolsas dos EUA desde o início do ano, e particularmente desde Maio, acabou. O que causou esta descida e será que isso anuncia algo mais sério para a economia dos EUA?
O índice de ações S&P 500 (para as 500 maiores empresas dos EUA) foi quase totalmente impulsionado pelas sete grandes empresas de redes sociais, tecnologia e chips – as chamadas Magnificent Seven (Alphabet, Amazon, Apple, Meta, Microsoft, Nvidia e Tesla) . Os preços de mercado das outras 493 empresas do índice S&P praticamente não se alteraram em relação aos lucros. Portanto, todo o índice de mercado dependia da sustentação dos lucros das Sete Magníficas.
O gatilho para o colapso surgiu quando o Federal Reserv dos EUA, na sua reunião do final de Julho, decidiu não reduzir a sua taxa de juro porque julgou que a inflação permanecia “pegajosa”. Poucos dias depois, os números do emprego nos EUA para julho foram anunciados e mostraram um crescimento muito fraco, com o emprego líquido a aumentar apenas 114 mil, metade do aumento médio dos 12 meses anteriores.
O Indicador de Recessão Sahm é um sinal bastante preciso para o início de uma recessão. É “quando a média móvel de três meses da taxa de desemprego nacional aumenta 0,50 pontos percentuais ou mais em relação ao seu mínimo durante os 12 meses anteriores”. E isso foi violado quando a taxa subiu a 4,3%.
Ao mesmo tempo, o setor industrial dos EUA manteve-se profundamente em fase de contração, de acordo com o último inquérito ISM sobre a atividade industrial, que caiu para 46,6 em Julho, face a 48,5 em Junho. (Qualquer pontuação abaixo de 50 significa contração.) O número de julho foi a contração mais acentuada na atividade industrial dos EUA desde novembro de 2023 e o 20º declínio na atividade durante os últimos 21 períodos.
Depois, quando os resultados trimestrais dos lucros empresariais foram divulgados no final de julho, apesar dos bons resultados proclamados, os investidores começaram a vender, pois estavam preocupados que os enormes gastos de capital em IA e semicondutores planejados pelos Sete Magníficos não proporcionassem melhores lucros no futuro. Na verdade, os inquéritos mostram que, até agora, apenas 5% das empresas utilizam IA nas suas operações, sugerindo um crescimento limitado, ou pelo menos um crescimento lento.
A situação foi agravada pela decisão do Banco do Japão de aumentar a sua taxa de juro com o objetivo de aumentar o valor do iene face ao dólar e de controlar o aumento da inflação. Isto enfraqueceu o que é chamado de “carry trade” na especulação cambial. É aqui que os especuladores tomam emprestado muitos ienes a taxas de juro anteriormente zero e depois compram ativos em dólares americanos (tais como ações tecnológicas) com taxas de lucro ou de juro maiores. A ação do Banco do Japão significou que o custo dos empréstimos em ienes subitamente aumentou e assim a especulação em ativos em dólares caiu.
Mas será que esta crise significa que a economia dos EUA vai entrar em recessão?
A rentabilidade do capital do setor não financeiro (e não dos lucros em si) está no seu nível mais baixo desde o final da Grande Recessão em 2008-9. Isso significa recessão no futuro. Mesmo que este colapso do mercado de ações não seja um presságio de uma recessão na produção real, no investimento e no emprego neste momento, a tendência atual na rentabilidade sugere que uma recessão acabará por ocorrer em breve.
Porque o imperialismo está em retrocesso
A crise económica que abalou o mundo em 2007-2008 está longe de estar resolvida. Seus efeitos mais imediatos e marcantes de rebentar as bolhas imobiliárias e financeiras deram lugar a outras contradições de enorme significado. É também evidente que as causas que conduziram à Grande Recessão continuam presentes e condicionam o desenvolvimento da economia mundial.
A luta feroz pela hegemonia entre o imperialismo estado-unidense e a China está a alterar a ordem geopolítica internacional e a pôr a nu a decadência ocidental a níveis verdadeiramente surpreendentes. A China, que durante muitos anos foi fornecedora de produtos industriais baratos e de baixa qualidade, tornou-se numa potência industrial capaz de desafiar a liderança mundial dos Estados Unidos.
Nenhum dos grandes acontecimentos internacionais dos últimos tempos pode ser explicado sem compreender a ascensão vertiginosa da China como potência econômica. A alteração na liderança da globalização econômica e das relações internacionais que o regime de Pequim está a forçar contra a potência dominante das últimas décadas, os EUA, é a chave para compreender o atual momento histórico e as perspectivas de médio prazo nas relações internacionais e na luta de classes.
No capitalismo atual, a polarização social, o empobrecimento de setores cada vez mais amplos da classe trabalhadora e a erosão das classes médias continuam a aprofundar-se enquanto a decomposição da ordem e das instituições capitalistas estabelecidas após o fim da Segunda Guerra Mundial se torna mais aguda. O grande pacto social que garantiu a estabilidade burguesa durante décadas acabou. País após país, os grandes partidos tradicionais que asseguravam a governabilidade entram em crise ou até mesmo desaparecem. A perda de legitimidade da democracia parlamentar é um fato e acontece num período de enormes conflitos em que só uma coisa é certa: a luta de classes aprofundar-se-á e o choque frontal entre as classes fundamentais da sociedade será inevitável.
Os relatórios mais recentes das organizações financeiras e económicas (FMI, Banco Mundial e OCDE) não conseguem esconder o fato de que uma série de fatores estruturais não só pesam de forma permanente sobre o crescimento, como causam um avanço assustador na desigualdade e na pobreza em todo o mundo. O FMI, no seu relatório de abril aponta que a última previsão para o crescimento mundial nos próximos cinco anos é a mais baixa das últimas décadas. A causa desta redução é a baixa produtividade da economia ocidental, consequência direta da redução do investimento produtivo. A OCDE, no seu relatório de maio, estima que o crescimento médio anual do PIB per capita até 2060 seja de cerca de 1,7%, em linha com a média pós-2007. Esta projeção de queda reflete um crescimento mais fraco do investimento e um ritmo mais lento de aumento da produtividade total dos fatores.
Como consequência da situação de superprodução a que a acumulação bem-sucedida de capital inevitavelmente conduz, como Marx e Engels explicaram há mais de 150 anos, chegamos a um ponto em que o investimento financeiro e especulativo é mais vantajoso para os capitalistas do que o investimento diretamente produtivo. Só na China, graças ao seu peculiar sistema produtivo, é que esta tendência foi mantida sob controle, levando ao forte desenvolvimento das suas forças produtivas e do seu mercado interno a um ritmo inimaginável no Ocidente.
Os lucros astronómicos das grandes instituições financeiras e das grandes corporações do imperialismo se explicam pela crescente pauperização da imensa maioria dos habitantes do planeta. Há uma gigantesca operação de transferência de riqueza que só pode conduzir a uma crise social e política de dimensões sem precedentes.
A queda da inflação se dá a um ritmo muito mais lento do que o esperado há seis meses o que faz o FED dos EUA não baixar as taxas de juros. De acordo com o Banco Mundial, as taxas de juros médias globais oscilarão em torno de 4% em 2025 e 2026, aproximadamente o dobro da média das duas décadas anteriores à pandemia. Estas elevadas taxas de juro implicam em um crescimento muito mais débil nas economias em desenvolvimento.
As altas taxas de juros, o aumento do preço do petróleo e do transporte marítimo, uma nova guerra tarifária que dificulta o comércio mundial, por exemplo, são riscos muito sérios que pairam sobre a economia mundial. Mas a maior ameaça são as suas consequências na superestrutura política, a começar pelos efeitos na luta de classes da agenda que os governos capitalistas colocam em prática para tentar enfrentar a crise.
O crescimento gigantesco das dívidas
A realidade concreta é que as economias ocidentais saíram da Grande Recessão de 2007-2008 empurrando os seus efeitos com a barriga. Depois de aplicar cortes selvagens nos salários, nos serviços públicos e nas políticas sociais que não resolveram as causas profundas da crise, mas que impulsionaram enormes mobilizações sociais que ameaçavam conduzir a uma situação pré-revolucionária generalizada, a classe dominante não teve outra alternativa senão regressar às políticas de estímulo monetário.
A dívida mundial total atingiu um recorde de 313 trilhões de dólares em 2023, e a dívida pública subiu para 97 trilhões de dólares, afetando cada vez mais a economia mundial. Um pesado montante financeiro, nas mãos dos grandes bancos internacionais, que coloca a possibilidade de uma nova explosão financeira. O colapso dos bancos do Silicon Valley e do Credit Suisse há pouco mais de um ano não foi um acidente isolado, mas um aviso do que pode acontecer novamente a qualquer momento e com grandes bancos.
A ameaça mais imediata para a economia mundial é a espiral especulativa que a dívida gera, especialmente nos países ocidentais. Os derivativos financeiros que adotam títulos de dívida como título de dívida subjacentes (aquelas famosas siglas tão populares durante a crise de 2008: CDS, CDOs, opções…) continuam a crescer e são o destino de gigantescas massas de capital excedentário que não encontram um uso rentável no investimento diretamente produtivo.
O chamado “shadow banking” e as operações OTC (over the counter, transações financeiras entre empresas que não passam pela supervisão da autoridade reguladora) expandiram-se incontrolavelmente e exercem um peso morto de dimensões quase incalculáveis na economia mundial. Sofremos diariamente os efeitos desta onda especulativa. O mercado imobiliário, a produção e distribuição de alimentos e a cada dia mais setores produtivos estão completamente subsumidos na economia especulativa e são geridos à vontade por um punhado de grandes fundos de investimento que obtêm lucros astronómicos à custa do sofrimento da imensa maioria.
Veja-se o exemplo da SABESP , empresa estatal privatizada recentemente em São Paulo pelo governador fascista Tarcísio Freitas. O governo de São Paulo detinha 50,5% das ações da Sabesp e passará a ter 18%.Os 32% restantes foram vendidos de duas formas. A empresa Equatorial Energia foi a única interessada em se tornar o acionista de referência da Sabesp. Comprou 15% das ações da empresa oferecendo os R$ 67 por ação. A Equatorial Energia, por sua vez, tem seu capital social distribuído entre as gestoras Opportunity (6,3%), Atmos (5,5%), Capital World Investors (5,2%), Squadra Investimentos (5,0%), Canada Pension Plan (5,0%) e BlackRock (5,0%). Outros 17% em ações da companhia foi vendido de forma pulverizada, a investidores que manifestaram interesse em adquiri-las, entre os quais está de novo o Fundo Black Rock, com 5,17% das ações. Os novos proprietários são fundos financeiros sem nenhuma expertise no setor de água e saneamento básico. Um estudo do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema) encaminhado ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) indica que cada ação da Sabesp vale R$ 103,90. Considerando esse preço, o governo paulista abriu mão de cerca de R$ 8 bilhões ao vendê-las por R$ 67.
O caso da empresa estadunidense Tesla é também muito significativo. A sua produção decresce, as suas receitas diminuem e os seus lucros vão cair 21% este ano, mas o preço das ações continua a subir como espuma, até representar 90 vezes o valor dos lucros esperados no futuro. Os investidores dizem que os péssimos resultados da Tesla serão amplamente compensados pelos seus futuros e hipotéticos sucessos no campo da Inteligência Artificial e robótica. A Tesla não tem, no entanto, conseguido competir no mercado mundial de veículos elétricos com seus homólogos chineses, o que é também um bom indicador do declínio do imperialismo. Essa fraqueza do capitalismo hegemônico é agravada dia após dia pela polarização interna que os governos ocidentais estão a alimentar com as suas políticas. As divisões na classe dominante europeia e estado-unidenses estão se aprofundando e são irreconciliáveis, ao mesmo tempo que os protestos contra as guerras alimentadas pelo Ocidente, especialmente contra o selvagem genocídio sionista em Gaza, se espalham e radicalizam.Não devemos nos enganar com a propaganda ocidental de sua supremacia em todos os campos sendo fundamental compreender o que está acontecendo na luta de classes internacional para podermos intervir contra a exploração e opressão do imperialismo em todo o mundo.