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Imagem: ilustrativa

A política invisível dos espaços controlados

Nos últimos anos, o crescimento dos condomínios fechados nas cidades brasileiras, especialmente em regiões periféricas e de expansão urbana, vem alterando silenciosamente o tecido social e político do país. Mais do que uma simples opção por segurança ou conforto, esse fenômeno reflete uma reconfiguração da vida coletiva — onde os muros, portarias e regulamentos internos criam um tipo específico de cidadania: controlada, autogerida e, em muitos casos, apartada da esfera pública.

Essa tendência não é nova, mas ganhou força com o esvaziamento das instâncias públicas de convivência, o medo da violência urbana e a crescente privatização dos serviços básicos. Em vez de praças, avenidas ou calçadas, a vida em comunidade se dá em salões de festas reservados, assembleias de moradores e grupos de WhatsApp. É uma política cotidiana, mas profundamente eficaz — moldada menos por partidos e mais por convenções condominiais.

Condomínios como microestados

Em muitos sentidos, os grandes empreendimentos imobiliários funcionam como microestados. Possuem suas próprias regras, tribunais (comissões de ética internas), sistemas de vigilância e, por vezes, até segurança armada. Isso cria um paradoxo: ao mesmo tempo em que garantem uma sensação de autonomia e proteção, esses espaços reduzem o contato com o diverso, o incerto e o comum — elementos essenciais à democracia urbana.

Além disso, os mecanismos de decisão nesses espaços geralmente não seguem lógicas democráticas amplas. Quem detém maior metragem ou mais unidades costuma ter mais voz. A política condominial é, muitas vezes, concentradora e pouco inclusiva. Debates sobre o uso de áreas comuns, contratação de serviços ou regras de convivência revelam disputas simbólicas que espelham conflitos sociais mais amplos, como o preconceito racial, geracional ou de classe.

A estética da separação e a arquitetura da desconfiança

A própria arquitetura dos condomínios reforça essa lógica de separação. Muros altos, câmeras em cada canto, guaritas blindadas. O urbanismo que predomina nesse modelo é o da defesa — uma cidade que se fecha em células isoladas, ligadas por vias rápidas e sem contato com o entorno. Isso impacta a mobilidade, o comércio local e até a formação de redes afetivas e políticas.

A vida se torna uma sequência de zonas protegidas: de casa para o carro, do carro para o trabalho, do trabalho para o condomínio. Em muitos bairros, os muros dos residenciais formam corredores de concreto onde não há espaço para o improviso urbano — o vendedor ambulante, a criança na calçada, o vizinho desconhecido.

Não por acaso, há uma estética própria desses espaços que valoriza a padronização e o controle visual. Sites como https://vbetaposta.com.br/ refletem, em seu design e estrutura, parte dessa lógica: interfaces que transmitem clareza, organização e domínio sobre a informação — uma tendência também presente na maneira como muitos condomínios estruturam sua comunicação interna e apresentação pública.

O impacto político da retirada do espaço público

Com a retirada progressiva dos moradores das ruas e praças, perde-se também a esfera da negociação urbana — o encontro com o diferente, o debate espontâneo, o conflito que exige mediação. A política do cotidiano se empobrece quando se restringe ao âmbito privado. E os moradores, muitas vezes sem perceber, deixam de se entender como cidadãos da cidade para se reconhecer apenas como condôminos.

Isso tem reflexos diretos nas eleições locais, na cobrança por políticas públicas e na articulação de lutas coletivas. A fragmentação geográfica e simbólica da cidade reforça a ideia de que os problemas “lá fora” não dizem respeito aos que vivem “aqui dentro”. É a lógica do enclave, onde a solidariedade cede espaço ao contrato de prestação de serviço.

Alternativas e fissuras no modelo

Apesar disso, há sinais de ruptura dentro desse modelo. Em alguns condomínios, moradores têm se organizado para criar hortas coletivas, rodas de conversa, feiras com pequenos produtores e campanhas de arrecadação para comunidades vizinhas. São gestos discretos, mas que apontam para a possibilidade de reencantar o espaço privado com práticas públicas.

Também cresce o número de iniciativas que tentam repensar o desenho urbano para além da lógica do isolamento. Arquitetos, urbanistas e movimentos sociais propõem condomínios integrados, com áreas abertas ao bairro, espaços de uso compartilhado com moradores do entorno e formas de gestão mais horizontais. A cidade pode, sim, ser construída com poros e não apenas com muros.

A cidade além dos portões

Pensar a vida nos condomínios é pensar, inevitavelmente, o futuro das cidades brasileiras. Os muros que nos protegem também nos limitam. Ao abrir espaço para uma política baseada no encontro, na escuta e na construção comum — ainda que dentro dos limites privados — é possível reimaginar o que significa viver junto. Porque, no fim, nenhuma portaria substitui a experiência de pertencer de verdade a uma cidade.

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Last Update: 14/06/2025