No dia 1 de maio de 1921, o Partido Comunista Judeu havia realizado um desfile para comemorar o Dia dos Trabalhadores. No dia anterior, o partido havia distribuído panfletos em árabe e ídiche – idioma germânico adotado por judeus europeus – pedindo a derrubada da ocupação britânica na Palestina e “solidariedade internacional do proletariado judeu e árabe”. O ato sairia de Jafa e terminaria em Telavive, cidade vizinha à época.
O Partido Comunista Judeu (PCJ) da Palestina – ou Partido Socialista dos Trabalhadores – foi criado em 1919 e dissolvido após os Distúrbios de Jafa. O PCJ possuía um racha interno com relação ao sionismo – apesar de uma parte do partido ter uma inclinação política ao sionismo, seus quadros já apresentavam uma clara ruptura com a ideologia imperialista e uma aproximação com a Internacional Comunista. Após os Distúrbios de Jafa, o PCJ foi desmantelado, com parte de sua direção fugindo da Palestina. Os militantes que permaneceram na região quebraram totalmente seus laços com o sionismo e fundaram o Partido Comunista da Palestina (PCP) em 1923, adotando uma posição fundamentalmente antissionista.
Na manhã do Dia dos Trabalhadores, um alto oficial da polícia de Jafa compareceu a sede do Partido Comunista Judeu e advertiu 60 militantes do partido para que não realizassem a manifestação.
Paralelamente ao desfile organizado pelo PCJ, outra manifestação estava marcada para ocorrer em Telavive, organizada pela Unidade Trabalhista, com autorização oficial dos britânicos. A Unidade Trabalhista era um partido sionista de “esquerda”, autodenominado “socialista-sionista”, que surgiu de um racha entre seus membros mais ligados à Internacional Comunista (ala antissionista) e os mais ligados à Organização Sionista.
Em Telavive, ambos os partidos se encontraram e o choque entre eles foi imediato. A força policial britânica foi acionada e perseguiu os comunistas do PCJ. Ao ver o confronto entre os comunistas e os sionistas, a população árabe se junta ao conflito contra os sionistas.
A tensão aumenta entre manifestantes palestinos e judeus, e o confronto se espalha rapidamente para o sul da cidade até atingir Abu Kabir, vila satélite de Jafa. Árabes e judeus foram mortos durante o primeiro dia de conflito, que duraria por mais dois dias.
No dia 2 de maio, sionistas do Haganá – principal organização paramilitar sionista que, mais tarde, se tornaria a Força de Ocupação de “Israel” – lançaram ataques de represália contra a população árabe. Armados com automáticas, membros do Haganá invadiram casas árabes com instruções para “destruir tudo, poupando apenas as crianças pequenas”. O comandante que deu a ordem relatou “bons resultados” em resposta às suas instruções.
Entre os dias 1 e 3 de maio, os confrontos entre árabes, sionistas e a força policial britânica resultaram na morte de 43 judeus e 14 palestinos.
Nos dias seguintes, o confronto continuou a se intensificar. Desta vez, a situação explosiva atinge Petah Tikva , al-Yahudiyya (renomeada al-Abbasiyya em 1932) e Hadera , causando a morte de 4 judeus e 54 palestinos. Destaca-se aqui o papel das forças britânicas na morte dos 54 palestinos.
O Alto Comissário Herbert Samuel (sionista britânico) declarou estado de emergência, impôs censura à imprensa e solicitou reforços do Egito. A aviação britânica lançou bombas “para proteger os assentamentos judeus dos invasores árabes”.
Um arquiteto norte-americano de origem judaica russa, Peres Etkes, que trabalhava para os britânicos, transferiu secretamente um estoque de rifles do arsenal britânico de Jafa para as forças sionistas.
Vários judeus foram presos, inclusive um policial, por suspeita de envolvimento no assassinato de civis árabes, mas não foram acusados por “falta de provas”.
A cronista palestina Subhi Yasin de Shefa-‘Amer relatou sobre o conflito na época:
“A ansiedade reinava sobre o triste destino que aguardava a terra e o povo devido à política britânica que transformaria a Palestina na pátria nacional judaica, e na corajosa cidade árabe de Jaffa uma nova revolta eclodiu em 1º de maio de 1921. Os combatentes árabes da liberdade atacaram o centro de imigrantes sionistas e mataram vários judeus… Dezenas de combatentes árabes da liberdade foram martirizados pelas balas da polícia britânica… balas traiçoeiras disparadas para proteger os agressores judeus“, escreveu Yasin,
Em 7 de maio, o alto comissário Herbert Samuel nomeia o juiz-chefe da Palestina Thomas Haycraft para chefiar uma comissão de inquérito sobre os distúrbios.
A comissão concluiu que os distúrbios em Jafa e seus arredores foram espontâneos e não planejados. Ela observou que sua causa fundamental era o ressentimento árabe contra o projeto sionista e a imigração judaica:
“(…) A crença geral de que os objetivos dos sionistas e a imigração judaica são um perigo para os interesses nacionais e materiais dos árabes na Palestina é quase universal entre os árabes e não se limita a nenhuma classe em particular”.
O relatório da comissão listava as principais queixas da população árabe à época. Entre estas estavam a grande imigração de judeus para a Palestina (promovida pela Grã-Bretanha) com intuito de diminuir as capacidades econômicas dos palestinos árabes, a desproporção de judeus no governo e a colocação dos interesses sionistas a frente das decisões do governo.
O Dr. David Eder, chefe da Comissão Sionista, dirigiu-se ao comitê e declarou que somente os judeus deveriam ter permissão para portar armas e que “só pode haver um Lar Nacional na Palestina, e um lar judeu, e nenhuma igualdade na parceria entre judeus e árabes, mas uma preponderância judaica assim que os números da raça aumentarem o suficiente”.
Apenas a fala de Eder já demonstra o porquê do confronto entre árabes palestinos e judeus sionistas explodiu em maio de 1921. A ocupação britânica da Palestina estava empurrando a política de limpeza étnica no país. Através da colonização da Grã-Bretanha, o sionismo se infiltrou no Estado palestino e estava, na prática, capturando todo o aparato governamental da região à revelia da população local, de maioria árabe.
Se havia qualquer tipo de aversão aos judeus, era uma aversão ao que eles representavam, ou seja, o sionismo, o roubo das terras dos palestinos. Para além disto, se este sentimento era predominante na sociedade, isto se deu por conta da agressividade da ocupação bretã e da implementação da política sionista feita pelos ingleses na Palestina.
Os Distúrbios de Jafa em 1921 foram confrontos entre antissionistas e sionistas. Iniciado por um choque entre os comunistas e os “sionistas de esquerda”, mas que pela ocupação inglesa e infiltração sionista, tomou uma amplitude muito maior e um apoio da população árabe palestina que, 100 anos atrás, já estava farta da ocupação sionista da Palestina.