A limpeza étnica da Faixa de Gaza não é uma política que surgiu com a fala de Donald Trump em fevereiro de 2025. Também não surgiu em 2023 com o início da guerra genocida de 15 meses. Ela é uma política tradicional do sionismo, que se tornou mais concreta a partir de 1967 quando o Estado de “Israel” invadiu e tomou controle da Faixa de Gaza, então ocupada pelo Egito. Desde então os palestinos resistem à ofensiva sionista e se recusam a sair de sua terra.
Em julho de 1967, o Estado de “Israel” ocupou completamente a Palestina nas fronteiras estabelecidas pelos britânicos e depois pela ONU. A Faixa de Gaza, Jerusalém oriental e a Cisjordânia foram invadidas pelo exército sionista. Os governantes, na época da “esquerda” sionista, o Partido Trabalhista, imediatamente começaram a traçar planos para realizar a limpeza étnica desses territórios. Eles havia conseguido realizar o genocídio em 1948 e agora tentariam novamente, mas dessa vez sem sucesso.
No total, segundo fontes da ONU, “Israel” expulsou cerca de 180.000 palestinos nos primeiros dias da guerra, principalmente na Cisjordânia. Mas a esmagadora maioria da população continuou no território, muito diferente do que os sionistas haviam feito em 19 anos antes.
A proposta de limpeza étnica de Gaza foi discutida seriamente pela primeira vez em julho de 1967 por um dos oficiais mais respeitados do exército, Mordechai Gur, que foi convidado pelo governo para apresentar seu plano. Ele sugeriu absorver os refugiados de Gaza na Cisjordânia:
“Precisamos criar as circunstâncias que induziriam as pessoas a sair. Precisamos pressioná-las, mas de uma maneira que não as levasse a resistir, e sim a partir. Isso deve ser incentivado tanto entre os refugiados quanto entre os residentes permanentes, para que sintam que não há esperança na Faixa de Gaza do ponto de vista agrícola… Além disso, quando a UNRWA realizasse um novo censo, ficaria claro que não haveria porções de alimentos suficientes para os refugiados… Isso poderia ter graves implicações de segurança… Devemos congelar todo o desenvolvimento lá [para incentivar a transferência].”
A proposta de “transferência” foi levantada novamente em novembro de 1967. Veio do chefe do departamento de assentamentos da Agência Judaica, Yosef Weitz, que escreveu no jornal Davar, porta-voz do então governante Partido Trabalhista (ainda chamado de Mapai), sobre uma proposta de “transferência” (termo que ele usou) dos refugiados de Gaza para a Cisjordânia.
Ele foi então convidado para uma reunião com o Primeiro-Ministro para discutir a ideia. O governo considerou seu plano, e ele foi endossado pelo Diretor-Geral do Ministério da Agricultura:
“Podemos transferir um grande número [de refugiados] para o Vale do Jordão.”
O oficial militar responsável por coordenar as políticas do governo nos Territórios Ocupados, o coronel Shlomo Gazit, sugeriu um processo mais seletivo e gradual, ou seja, sem incluir toda a população, o que poderia resultar na remoção final dos palestinos da região:
“Movê-los para o [Vale do Jordão] pode levar à sua transferência para o leste; devemos criar uma atmosfera de transferência populacional.”
O assessor jurídico da ocupação, Zvi Dinstein, acrescentou:
“Devemos transferi-los para locais onde possam encontrar trabalho… A principal questão é: pode-se transferir uma população abertamente?”
Não há registro sobre como essa questão foi respondida. E os sionistas foram incapazes de realizar a limpeza étnica. O mundo em 1967 já era muito diferente do que existia em 1948. O nacionalismo árabe havia derrubado as monarquias do Egito, da Síria e do Iraque, que se tornaram grandes inimigos de “Israel”. Além disso a resistência palestina já se desenvolvia.
Foi a partir de 1967 que os palestinos começaram sua intensa luta armada. Novas organizações foram fundadas como a Frente Popular para Libertação da Palestina e o Fatá se transformou numa grande organização de massas. A principal base da guerrilha eram os refugiados palestinos, com destaque para os refugiados na Jordânia. Eles seguiram sendo o principal foco de luta revolucionária palestina até a Primeira Intifada, em 1987.
Nessa conjuntura nem os países árabes queriam aceitar mais refugiados e nem “Israel” teria tanto interesse. Ampliar o número de refugiados naquele momento seria um auxílio direto a guerrilha palestina. E essa guerrilha não era um problema pequeno. No caso da Jordânia, ela levou a uma guerra civil que precisou de um enorme massacre para expulsar a resistência. Quando ela foi para o Líbano o exército sionista precisou invadir para acabar com a resistência.
Os sionistas então mantiveram em Gaza o plano do general “precisamos pressioná-las, mas de uma maneira que não as levasse a resistir, e sim a partir”. Mas esse plano falhou completamente. Em 2025, fica claro que nada irá tirar o povo de Gaza de sua terra. Os 15 meses de bombardeio, bloqueio e invasão genocida apenas aumentaram a determinação dos palestinos.
Um setor dos sionistas falou em 1967 que ocupar Gaza e a Cisjordânia seria o fim de “Israel” pois tornaria a resistência inevitável. Não é uma realidade pois a resistência surgiria também sem a ocupação, ou seja, o fim de “Israel” é inevitável, mas o pesadelo dos que não queria ocupar Gaza se tornou realidade. Gaza se tornou o cemitério da entidade sionista, o berço do Estado da Palestina.