Colunista do jornal Gazeta do Povo, João Pedro usou seu espaço em um dos principais órgãos do povo brasileiro para denunciar um suposto movimento da extrema direita ao nacionalismo, em artigo intitulado Pedrinho gritou ‘lobo’! (19/7/2024). “O perigo iminente mora nos partidos que moveram-se para a direita nacionalista”, destaca João Pedro em seu artigo, nitidamente desconsiderando o fator mais importante: o fundo social do rótulo. O jornalista de Gazeta do Povo continua:
“A atual RN, de Le Pen, emanou de um longo processo de revisões históricas e dramáticas cisões internas que ainda não se concluiu. Nessa trajetória, renunciou às suas raízes, fincadas na França de Vichy, para aderir à narrativa gaullista da França da Resistência. A estratégia permitiu-lhe capturar a maior parte do eleitorado da centro-direita tradicional, relegando o velho partido gaullista a um gueto. A extrema direita tornou-se direita nacionalista.
A direita nacionalista é reacionária, xenófoba e islamofóbica, como a extrema direita, mas subordina-se às instituições democráticas.”
Depois de “ultrafascismo”, “turbo-fascismo”, “tecnofascismo” e afins, temos uma inovação introduzida por João Pedro: a extrema direita enlouquecida e uma “civilizada”, que “subordina-se às instituições democráticas” e por essa razão, seria “o perigo iminente”. Nos dois parágrafos supracitados, torna-se mais evidente uma campanha para criar distinções artificiais entre a extrema direita, que não existem no mundo real, mas que servem para um esquerdista pequeno-burguês mais desorientado, comece a propaganda de um perigo ainda mais iminente, representado pela ascensão de uma extrema direita “civilizada”.
Nos países desenvolvidos, a extrema direita é, necessariamente, nacionalista. Isso reflete sobretudo, os interesses de uma classe dominante que oprime as classes subalternas de seu próprio país e também, se beneficia da exploração outros, desencadeando a necessidade de defender o sistema de exploração que a sustenta. Mais recentemente, este setor da direita passou também a expressar as tendências de uma ala da burguesia mais numerosa, porém menos poderosa, que resiste a sustentar as aventuras do imperialismo ao redor do globo.
São capitalistas interessados na mão de obra semi-escrava dos imigrantes e no fluxo de capitais que deixa os países atrasados, mas que não querem arcar com os custos da política imperialista. A cisão já apareceu durante a pandemia, mas se tornou particularmente mais forte após o cerco à Rússia, o que desorganizou a economia real da Europa. Negócios que foram impactados pelo aumento expressivo dos custos de energia e que tem assistido vultuosas somas do Tesouro público sendo destinadas a uma guerra contra a Rússia na Ucrânia que não lhes interessa, ou pelo menos, não interessa tanto quanto aos grandes monopólios e bancos.
Estes, na ciência política de João Pedro, seriam a extrema-extrema direita, “extremista”, como escreveu o jornalista, comparando esse grupo aos trumpistas nos EUA e os bolsonaristas do Brasil.
“O Maga, movimento de Trump que tomou de assalto o Partido Republicano, é um fenômeno extremista, como atesta a contestação violenta à eleição de 2020. O bolsonarismo pertence à extrema direita, como prova a trama golpista que se desenrolou entre dezembro de 2022 e o 8/1 de Brasília.Na Europa, porém, os partidos da direita extremista, como a Afd alemã ou o Vox espanhol, permanecem circunscritos à periferia política.O perigo iminente mora nos partidos que moveram-se para a direita nacionalista, como o Fidesz, de Orbán, o Irmãos da Itália, de Meloni, e a RN francesa.”
O fenômeno observado por João Pedro, longe de ser uma campanha de marketing destinada a conquistar mercados como dá a entender o desorientador artigo, é o indicativo de que setores crescentes do imperialismo, isto é, o setor mais poderoso da burguesia, ligados aos grandes monopólios mundiais, inclinam-se para uma extrema direita. Isso é reforçado no trecho abaixo:
“A RN atingiu o umbral do poder pelo mesmo motivo, o que a torna mais –não menos!– perigosa para os direitos humanos e a coesão social da França. A ascensão do partido de Marine Le Pen ameaça consumir a ‘França de 1789’ na fogueira da ‘França eterna’. Já o partido original, extremista, de Jean-Marie Le Pen, produzia apenas ruídos, por vezes sonoros, nas franjas da sociedade francesa.”
Com os partidos da ordem imperialista em franca decadência em todo o planeta, torna-se evidente para a ditadura mundial que cedo ou tarde, a complexa e potencialmente problemática cartada da extrema direita. Até lá, apoia-se no medo dos setores desorientados da esquerda para manobrar o sistema político, na Europa, nos EUA, no Brasil e em diversos outros lugares.
A isto que serve o artigo de João Pedro, retardar ao máximo essa operação, cujo final é sempre imprevisível, fazendo uso da desorientação dos setores mais direitistas da esquerda para isso, para que levem essa política ao interior do campo e com isso, confundam as bases sociais da esquerda e mantenham o sucesso do golpe sofrido pela França Insubmissa, onde a histeria guiou a esquerda aos interesses do imperialismo e deu sobrevida ao fragilizado regime de Macron. Enquanto for possível, apostarão nessa tática, contando com o colunista da Gazeta do Povo e os esquerdistas que ainda nutrem ilusões no órgão golpista para isso.
O articulista não chega a dizer expressamente, mas ao dizer que o “PT chegou ao Planalto porque mudou”, indica que a política, afinal, é a mesma submissão aos partidos ditos de centro visto na França e que foi realizado no Brasil também, pelo maior partido da esquerda nacional, porém, em um grau ainda insuficiente às necessidades do imperialismo. Às bases da esquerda, trabalhadores, camponeses, estudantes, etc., cumpre a tarefa de fazer o oposto aos compromissos derrotistas assumidos: é preciso encarar o fundo social do problema, a luta contra a burguesia e seus distintos setores, de maneira independente e sem vacilações. Só assim, será possível derrotar o fascismo real, a extrema direita e os golpistas “civilizados” que a alimentam.