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O papel das Agências Reguladoras no setor de gás natural
por Luís Carlos de Souza e João Paulo de Oliveira
Parte da indústria do gás natural, especialmente representada pela ABEGÁS e seu porta-voz Adriano Pires, tem procurado promover um diálogo com a sociedade e o mercado, questionando as decisões da Agência Reguladora do Rio Grande do Sul e exaltando a agenda privatista. Essa agenda desestatizou um setor de baixíssimo risco e alta remuneração, justificando o movimento como uma busca por “nova competitividade”.
No entanto, é fundamental ressaltar que cabe às agências reguladoras garantir a qualidade e o equilíbrio dos serviços prestados, não segundo os interesses das concessionárias ou seus investidores, mas em função das necessidades do Estado, do mercado e, sobretudo, da sociedade. O gás natural, considerado um serviço essencial e de utilidade pública, deveria ser um instrumento estratégico de desenvolvimento nacional.
Para compreender o cenário atual, é necessário adotar uma análise histórica, fugindo do “flash fotográfico” de episódios pontuais, como o do Rio Grande do Sul, que tenta ajustar a “gorda” margem de lucro dos acionistas paulistas da concessionária local. Os problemas, entretanto, são nacionais e vão além da baixa competitividade tarifária.
A crise do gás natural como instrumento de desenvolvimento regional foi agravada pelo afastamento da Petrobras da distribuição, reflexo de políticas incongruentes como o Novo Mercado de Gás (NMG) e de movimentos iniciados nos anos 1990, que sistematicamente enfraqueceram a maior empresa brasileira. Isso vai na contramão das estratégias adotadas por países continentais.
A chamada Nova Agenda Pública, ao impor a lógica empresarial a estatais e concessionárias, priorizou a lucratividade em detrimento do interesse público. As concessões para a iniciativa privada não blindaram a governança dessas empresas, deixando os governos sem controle decisório e submetendo as agências reguladoras a uma dinâmica desenhada por agentes privados.
O resultado mais marcante do NMG, anunciado como um processo de desverticalização e ampliação da competitividade no setor, foi o aumento dos preços e a maior concentração de mercado em poucos agentes. Essa concentração é evidente na atuação conjunta da Mitsui e da Compass (Grupo Cosan), que formaram a Commit, desbancando a Gaspetro com o apoio controverso do CADE.
Outro aspecto negligenciado é que o gás natural, sendo uma commodity internacional, está sujeito à dinâmica oligopolizada do petróleo. O Brasil ainda enfrenta desafios como a limitada infraestrutura de escoamento do gás do pré-sal, restrições ao modal rodoviário nos terminais de GNL e a precificação subordinada ao dólar e à dinâmica do mercado internacional.
No âmbito regional, a Commit tem imposto estratégias comerciais voltadas ao mercado residencial, onde as margens de lucro são maiores, enquanto investimentos em redes de abastecimento industriais — mais eficientes e relevantes para o desenvolvimento regional — podem ficar em segundo plano.
O setor industrial, especialmente o ramo cerâmico em Santa Catarina, enfrenta pressões insustentáveis com o aumento de mais de 250% nos preços do gás entre 2019 e 2023. A FIESC já aponta que parte dessa indústria pode desaparecer ou migrar para outros centros.
Se o gás natural quiser cumprir seu papel no desenvolvimento nacional, é urgente a nacionalização dos preços, com aumento da demanda interna focada em grandes consumidores industriais, redução da rentabilidade excessiva das concessões e um reposicionamento estratégico que priorize o setor produtivo e clientes âncoras como petroquímicas, fábricas de fertilizante e o mercado térmico.
Atender bairros ricos, balneários ou cidades verticalizadas e concentradas, como atualmente acontece, sacrifica o setor industrial e compromete a competitividade de um país já sobrecarregado por desafios logísticos e estruturais.
O gás natural deve voltar a ser um instrumento de desenvolvimento nacional — e não apenas mais uma commodity rentável para poucos.
Luís Carlos de Souza — Pesquisador da UDESC e coordenador do Núcleo de Estudo, Pesquisa e Observatório de Gás Natural da Vision Gas
João Paulo de Oliveira — Administrador, economista e contador, mestre em Planejamento Territorial e ex-presidente da Companhia de Gás de Santa Catarina