Os “trotskistas” da Organização Comunista Internacionalista (OCI) publicaram, no sítio Marxismo, o artigo Vučić ameaça repressão diante da resistência em massa na Sérvia, assinado por Francesco Merli e, como indicado pelo título, trazendo uma defesa da oposição golpista ao governo nacionalista da Sérvia, liderado pelo presidente Aleksandar Vučić. Emocionado, Merli diz em seu artigo:
“Durante oito meses, ocupações de faculdades, manifestações, bloqueios de estradas e milhares de protestos em todo o país permaneceram pacíficos, apesar das provocações calculadas do regime. Entre elas, está o uso imprudente de um canhão sonoro contra centenas de milhares de pessoas na grande manifestação de 15 de março, em Belgrado. A debandada de pânico provocada pelo impacto da arma sonora poderia ter causado muitas vítimas. Vários manifestantes ficaram feridos, mas as consequências poderiam ter sido muito piores.”
O que chama atenção é o sujeito oculto da análise do articulista da OCI, que não é oficialmente nomeado no trecho, mas está presente, sobretudo, pela política defendida: o imperialismo. Convenientemente, o autor foca nos “meses” de “ocupações de faculdades, manifestações, bloqueios de estradas e milhares de protestos”, mas esconde a posição do imperialismo, muito embora isso seja fundamental para um revolucionário se orientar sobre os fenômenos políticos em marcha no mundo. Vejamos então como o imperialismo se posiciona sobre a revolução que tanto emociona a OCI:
“Aleksandar Vucic domina a política sérvia há uma década, primeiro como primeiro-ministro e depois como presidente. Para seus apoiadores, é um líder pragmático que superou as profundas divisões internas da Sérvia e liderou um período de crescimento econômico sustentado. Para os críticos, consolidou o poder em suas mãos e minou as normas democráticas.”
A tentativa de aparentar neutralidade no artigo acima é um engodo. A opinião que o artigo realmente quer difundir é a última, que mostra o líder sérvio como um autocrata que “minou as normas democráticas”. Os responsáveis por ela são os jornalistas Ido Vock e Jovana Georgievski, autores do artigo Aleksandar Vucic: The man who remade Serbia, e o órgão que as publicou é o monopólio do imperialismo britânico BBC, que não deixa dúvidas sobre o que quer que as pessoas pensem de Vučić:
“Para Zorana Mihajlovic, ex-vice-primeira-ministra e hoje adversária política, Vučić é ‘um populista a caminho de se tornar um ditador’. A organização internacional Freedom House atualmente classifica a Sérvia como apenas ‘parcialmente livre’.”
Para o imperialismo, faz todo sentido do mundo atacar Vučić e a própria BBC indica o motivo: o atual mandatário é a expressão da resistência do povo sérvio contra o imperialismo. A rede monopolista britânica lembra até mesmo de Slobodan Milosevic:
“Em 1998, o ditador iugoslavo Slobodan Milosevic nomeou Vucic como ministro da Informação. No cargo, Vucic aplicou algumas das leis mais repressivas da Europa contra a liberdade de expressão. Zorana Mihajlovic lembra que foi uma era ‘marcada por limpeza étnica, ódio contra croatas e muçulmanos, sanções e guerras’.”
A parte do “limpeza étnica” ficou por conta da propaganda imperialista, porém, as sanções e guerras aconteceram, de fato, e foram parte da campanha da ditadura dos monopólios contra a extinta Iugoslávia, nação multicultural que tinha nos sérvios seu setor mais desenvolvido e opositor do imperialismo. Tanto que, após esquartejar o grande país do leste europeu, os países desenvolvidos mantiveram seus ataques contra os sérvios. Agora, não apenas eles.
Como já tem se tornado uma tradição entre pequeno-burgueses “trotskistas” apoiar a política imperialista, o OCI saiu-se com:
“Desde o início dos protestos, há oito meses, Vučić tem tentado constantemente miná-los, desencadeando uma campanha massiva na mídia para criminalizar os estudantes e qualquer pessoa que os apoie. O objetivo central é galvanizar e mobilizar seus próprios apoiadores. Ele chegou a afirmar, sem a menor evidência, que potências estrangeiras não especificadas estavam por trás dos protestos, com o intuito de provocar uma ‘revolução colorida’. É difícil conceber quais ‘potências’ estariam por trás dessa conspiração, dado que o regime é apoiado pela União Europeia, pelos Estados Unidos e até mesmo pela Rússia e pela China.”
Sim, naturalmente. OCI fala que Vučić “é apoiado pela União Europeia, pelos Estados Unidos”, mas não se dá ao trabalho de demonstrar a veracidade desse “apoio”. A BBC, por sua vez, deixou bem claro o quanto o governo sérvio é apoiado pelo imperialismo de maneira inquestionável.
Para uma organização verdadeiramente revolucionária, seguidora do programa da IV Internacional, não deveria haver a menor sombra de confusão: em qualquer conflito no qual o imperialismo é uma das partes, os revolucionários apoiam a outra. Fundamentalmente, as derrotas do imperialismo estimulam os movimentos que enfrentam a ditadura mundial, impulsionando outras derrotas que, combinadas, precipitam o desfecho positivo da luta dos povos oprimidos por sua libertação definitiva.
O fato de OCI se confundir em um aspecto tão central da luta de classes ilustra o quão domesticada a organização está, o que, finalmente, expressa o descolamento da entidade dita trotskista com o movimento operário. A vanguarda dos trabalhadores, porém, não pode se confundir: se o imperialismo está em um lado dos conflitos, a esquerda deve estar do lado contrário.