No início do século 21 o Brasil tornou-se uma potência em software livre – desenvolvido por comunidades de desenvolvedores em código aberto. Houve grande impulso no início do governo Lula, em torno do sistema operacional Linux e de vários aplicativos, inclusive substituindo o campeão Office, da Microsoft. Tudo isso ancorado na adoção de sistemas abertos pelo setor público.

Ainda hoje, corporações como o Ministério Público Federal utilizam programas de código aberto em seus notebooks funcionais. O Banco do Brasil utilizava em suas agências, mas passou a substituir por sistemas fechados.

O lobby das empresas de tecnologia sempre foi muito forte e acabou reduzindo o espaço para o software livre. 

Agora, com o DeepSeek, o movimento ganha um novo fôlego. A empresa chinesa desenvolveu uma tecnologia barata e abriu o código para quem quiser. A Inteligência Artificial (IA) sai do controle das grandes corporações e se democratiza, justo no momento em que o Brasil preparou seu plano de IA, apresentado na 5a Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação.

O plano se baseia em duas âncoras.

A primeira, a regulamentação do FNDCT (Fundo Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação), proibindo o contingenciamento de seus recursos, conforme lei aprovada pelo Congresso Nacional. A segunda, a viabilização da captação de crédito para a Finep (Financiadora de Estudos e Pesquisas) e para o BNDES, por meio do Mais Inovação, a taxas de juros favorecidas.

O Plano Brasileiro de Inteligência Artificial 2024-2028 trabalha com cinco eixos principais:

Infraestrutura e Desenvolvimento de IA – Investimentos em supercomputadores, redes de alta velocidade, energias renováveis e software nacional para IA.

Difusão, Formação e Capacitação em IA – Educação e treinamento de profissionais para suprir a demanda do mercado de IA.

IA para Melhoria dos Serviços Públicos – Aplicação de IA para melhorar serviços de saúde, educação e segurança pública.

IA para Inovação Empresarial – Incentivo ao desenvolvimento de IA para aumentar a competitividade da indústria e do comércio.

Apoio ao Processo Regulatório e de Governança da IA – Criação de diretrizes para garantir o uso ético e seguro da IA no Brasil.

Eixos 1 – A infraestrutura

O PBIA prevê a aquisição de supercomputadores de alto desempenho e a ampliação da capacidade de processamento através da descentralização dos recursos tecnológicos pelo país. Ponto importante será a sustentabilidade energética, já que o processamento consome grande quantidade de energia.

Outro ponto relevante é a criação de um ecossistema de dados e software, facilitando a montagem de consórcios de pesquisa entre os diversos institutos.

Os recursos ainda são pequenos para o desafio: R$ 3,0 bilhões para a infraestrutura e R$ 500 milhões para sustentabilidade e energias renováveis para IA.

Os sistemas de software livre terão uma injeção de recursos de R$ 1,4 bilhão, com a criação de curadoria e disponibilização de conjuntos de dados nacionais para treinamento da IA em português.

Prevê também a criação de um modelo de IA fundacional em português.

Finalmente, o Programa de Pesquisa e Desenvolvimento prevê R$ 873 milhões para a criação de Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia voltados para IA, e cooperação internacional com América Latina, Caribe e África.

Eixo 2 – a capacitação

Serão R$100 milhões para campanha nacional de conscientização sobre IA para a sociedade. Inclui a criação da Olimpíadas Brasileira de IA.

Haverá R$ 548,5 milhões para a criação de cursos de graduação e disciplinas em IA em universidades e faculdades, a expansão do ensino técnico-profissionalizante, bolsas de estudo para graduação, mestrado e doutorado em IA, incluindo bolsas no exterior. E Laboratórios Interdisciplinares de Formação de Educadores (LIFE).

A meta é criar 5 mil vagas em cursos de graduação de IA em 3 anos, oferecer 100% das vagas em IA e ciência de dados no FIES, criar e ampliar 47 laboratórios LIFE e 1.200 bolsas para pesquisadores focados no desenvolvimento de soluções de IA.

Serão investidos também R$ 500 milhões em uma plataforma nacional de cursos online gratuitos de IA e parcerias com empresas e Sistema S para formação técnica em IA. 

A meta é capacitar 20 mil profissionais no primeiro ano, 30 mil no segundo e 50 mil no terceiro. E fornecer 250 mil vagas para formação técnica em IA até 2028.

Eixo 3 – serviços públicos

A previsão é de investimentos de R$1,76 bilhão para a modernização e digitalização dos serviços públicos através de IA.

R$ 59 milhões serão aplicados em um núcleo de IA do governo federal, que criará uma plataforma de IA para desenvolvimento e implementação de modelos nos serviços públicos, além de testar soluções, antes da implementação em larga escala.

As metas são de capacitação de 115 mil servidores, estruturação de 25 projetos estratégicos de IA (devidamente identificados) e 25 projetos-pilotos de experimentação com IA até 2026,

Ponto relevante é o investimento de R$ 1,4 bilhão na criação de uma Nuvem Soberana – para armazenar dados governamentais -, o estabelecimento de uma política de governança de dados públicos, e de sistemas de privacidade e segurança da informação.

A meta é catalogar 2 mil conjuntos de dados do governos federal até 2027 e economizar R$ 6 bilhões com a eliminação de exigências burocráticas.

Mais R$ 259 bilhões serão aplicados no Programa de Soluções de IA para Serviços Públicos, implementando soluções de IA em pelo menos 10 órgãos por ano.

Eixo 4 – inovação empresarial

São previstos R$ 13,79 bilhões em investimentos, R$ 4,49 bilhões dos quais para a criação de datacenters nacionais, apoio à cadeia produtiva, incentivo a startups, fomento à adoção de IA por micro e pequenas empresas e inserção de mestres e doutores em IA em empresas privadas.

R$ 2,3 bilhões irão para datacenters sustentáveis no Norte e Nordeste. Haverá a expansão da Rede Embrapii (uma parceria Ministério de Ciência e Tecnologia e Confederação Nacional da Indústria) para 35 unidades até 2026. R$ 400 milhões irão para apoio a startups de IA. E R$ 9,39 bilhões para desenvolvimento de soluções aplicadas à indústria, em alinhamento com a NIB (Nova Indústria Brasil).

O mapa da mina

É provável que nem todos os investimentos sejam realizados, nem todas as metas cumpridas. Mas a relevância do PBIA está no mapeamento de todo o setor, na definição clara das linhas de ação, na visão sistêmica para a implantação da política.

Leia também:

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 03/02/2025