O momento em que impedi a avalanche de críticas contra o Estadão, ao lado de Luís Nassif

Entrei no Jornal da Tarde em 1979. Em 1981, o Estadão enfrentava uma crise econômica e reduziu a redação. A direção de jornalismo passou para as mãos de Júlio César de Mesquita, assessorado por Miguel Jorge. 

Em 1981, o jornal conseguiu um furo importante. Com base em investigações de Bernardo Kucinski, o repórter Paulo Andreoli publicou uma denúncia de venda sigilosa de urânio para o Iraque. 

Os demais veículos caíram matando, desmoralizando o furo.. 

Na época, o Estadão tornara-se alvo de zombarias, após duas reportagens clássicas. Uma foi um artigo de Carlos Chagas, denunciando um atentado contra o Ministro Leitão de Abreu. De fato, ele conversava com Abreu em sua sala quando um projétil estilhaçou o vidro da janela. 

Veja investigou e descobriu que a explosão foi causada por um cortador de grama e o projétil não passava de uma porca expelida do motor pela explosão. O título da matéria da Veja “A porca assassina” foi fulminante. 

O segundo episódio ocorreu na seção de necrológios do jornal, cujo responsável atendia pelo solene apelido de Toninho Boa Morte. Ele publicou o necrológio de um cavalo do hipódromo, dotado de bons sentimentos, de lealdade. Foi um prato cheio para todos os concorrentes. 

Nessa toada, quando foi publicada a denúncia, os concorrentes caíram matando sobre o Estadão, especialmente a Veja e a Folha de S. Paulo.  Era uma pancadaria de dar dó. 

Por aqueles tempos, recebi um frila de uma das revistas da Abril – não me lembro se Nova ou Cláudia – para um artigo sobre o acordo atômico. Fui até o Departamento de Documentação do jornal e consultei mais de cem publicações sobre o tema. Aprendi os conceitos básicos de energia nuclear, os enganos mais comuns. Quando explodiu a campanha contra o Estadão, percebi a enorme inconsistência dos ataques contra o jornal. 

Após uma reunião de pauta do JT procurei o Ruyzito Mesquita, filho de Ruy: 

  • Ruizito, diga para seu tio Júlio, se ele quiser escrevo um artigo apenas e acabo com essa campanha contra o Estadão. 

Aceitaram. Fiquei dois dias em cima do tema e entreguei o artigo. Para se precaver, Júlio Neto pediu para o físico José Goldemberg conferir o artigo. Para meu orgulho, ele perguntou se o artigo fora escrito por algum físico nuclear. 

A experiência me foi muito útil. Deu para perceber, primeiro, a superficialidade do debate público. O acordo com a Alemanha naufragara e havia discussões sobre os caminhos a se seguir. Presidida por Goldenberg, a SBPC defendia a solução da água pesada, seguida pela Argentina. A Aeronáutica queria algo baseado em laser. E a Marinha propunha as ultracentrífugas, do Almirante Othon, tese vencedora. 

Dentre todas as entrevistas, a mais esclarecedora foi a de Rex Nazareth, que vim a conhecer quase quinze anos depois, como diretor do Instituto Militar de Engenharia. Na época, o IME desenvolveu drones – um artefato ainda pouco conhecido das forças armadas no mundo. Para meu espanto, pediu meu conselho sobre para quem mostrar o projeto, porque ninguém no governo parecia dar atenção às pesquisas do IME. 

Depois da publicação da reportagem no Estadão, cessaram imediatamente todas as críticas.

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