O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, mandou suspender a execução de todas as emendas impositivas apresentadas por deputados e senadores até que o Congresso estabeleça regras de transparência sobre a aplicação dos recursos.
A determinação, assinada nesta quarta-feira, não vale para valores destinados a obras em andamento ou ações para atendimento de calamidade pública. O despacho do magistrado, no âmbito de uma ação movida pelo PSOL, deve ser analisado no plenário virtual da Corte nos próximos dias.
As emendas impositivas são aquelas que o governo federal tem obrigação de pagar. Para este ano, a previsão é de que o Executivo tenha de enviar aos redutos eleitorais dos congressistas ao menos 33 bilhões de reais nessa modalidade de pagamento – o valor é mais que o triplo do registrado há quase uma década.
Para o magistrado, a execução das emendas que não têm critérios de eficiência, transparência e rastreabilidade é incompatível com a Constituição. O rito estabelecido com as emendas, segue Dino, tira grande parte da liberdade de decisão do Executivo sobre a implementação de políticas públicas e transforma membros do Legislativo em “co-ordenadores de despesas”.
“É uma grave anomalia que tenhamos um sistema presidencialista, oriundo do voto popular, convivendo com a figura de parlamentares que ordenam despesas discricionárias como se autoridades administrativas fossem”, escreveu. O ministro ainda ressaltou que o “equivocado desenho prático” das emendas impositivas gerou a “parlamentarização das despesas públicas”.
Na semana passada, o PSOL pediu que o Supremo suspendesse trechos de projetos que obrigam o Poder Executivo a pagar emendas apresentadas por parlamentares e pelas bancadas estaduais.
Essa forma de controlar parte do Orçamento, segundo o partido, viola a separação dos Poderes e “determina um desarranjo profundo” no modelo de determinação orçamentária previsto na Constituição, uma vez que confere ao Legislativo a primazia sobre a gestão e o poder de ordenar despesas.
A captura do orçamento alcançou níveis recordes e, para 2024, a previsão é de que o volume de emendas corresponda a 20,03% do total de discricionárias e com ela todos os seus efeitos nocivos: dificulta o ajuste fiscal, o planejamento e execução de políticas públicas, o equilíbrio das contas públicas e, até mesmo, o desempenho da economia no longo prazo.
Os dispositivos questionados pelo PSOL estão em propostas aprovadas no Congresso em 2015. As matérias obrigam o Executivo a pagar parte das emendas apresentadas pelos parlamentares, até o limite de 2% da Receita Corrente Líquida (individuais) e 1% (bancada).
Com a decisão desta quarta-feira, Dino engrossa a ofensiva contra o poder do Legislativo sobre nacos do Orçamento em razão da falta de transparência e controle na aplicação dos recursos públicos. Por outro lado, abre caminho para um mal-estar político com os congressistas, que ficaram irritados com ordens recentes do magistrado.
O magistrado abriu uma exceção apenas para transferências que atendem a requisitos de transparência e de rastreabilidade dos valores. Também há permissão no caso de repasses para obras em andamento e atendimento de situações de calamidade pública, desde que seja adotado um sistema de transparência.
Antes disso, proibiu o Executivo de executar emendas de comissão que não seguissem regras de transparência e rastreabilidade, além de fixar critérios para o seu pagamento. O ministro do STF também pediu à Controladoria-Geral da União um pente-fino nos repasses feitos nos últimos anos.
O entendimento de Dino é que a falta de controle sobre a aplicação desses recursos repete o problema das emendas de relator, que ficaram conhecidas como Orçamento Secreto e foram utilizadas pelo governo Jair Bolsonaro (PL) para azeitar sua relação com a cúpula no Congresso.