Há uma febre no ar. Mas não se iludam. É passageira. Como foram os filtros nas redes sociais que mostravam o envelhecimento a partir de uma foto. Absolutamente sem importância. No ano de 2025, todos serão famosos por 15 mil cliques. A febre passageira tem jeito de criança, cara de criança, vestem-na como criança. Mas é uma peça de silicone que imita um bebê e é chamada de reborn.
O que aparece como novidade e desperta análises comportamentais exageradas, não passa de um processo alimentado pelos algoritmos das redes sociais. Os renascidos – traduzindo o tema, já foram muito mais interessantes e divertidos. Como o Pet Rock.
Talvez você nunca tenha ouvido falar em Gary Dahl. Em 1975, o então publicitário Garry, estava em um bar ouvindo amigos reclamando de seus animais de estimação. Quase que como brincadeira ele pensou que o animal perfeito seria uma pedra. Transformou a ideia em um produto que chamo de Pet Rock. Começou a vender pedras em uma caixa com furos para a pedra respirar. E com um pequeno berço de palha. Pedras merecem descanso. Sucesso absoluto e sem redes sociais.
O lançamento em uma feira gerou interesse de varejistas. Em cerca de um ano foram vendidas cerca de 1,5 milhão de unidades. O produto foi descontinuado pois a onda inicial se sustentou. Mas rendeu para Garry algo em torno de 1,4 milhão de dólares, que na época era uma bolada. Apesar de estar fora do mercado, a Super Impulse comprou, em 2022, os direitos da marca e os relançou. O produto estourou na Coreia do Sul, com grupos de K-pop colocando nas redes sociais o dia a dia de seus Pet Rocks.
A ideia inicial foi criar um objeto bem-humorado. O sucesso veio por ser exatamente isso. Se você quiser comprar seu Pet Rock, acesse o site da Amazon. O preço é de cerca de 270 reais. É o Pet Rock original, com as mesmas características: dispensam passeios, não ficam em creches e nunca vão ao veterinário. Todo Pet Rock tem pedigree. Existem imitações mais baratas, mas nunca se sabe se as raças são puras ou houve cruzamento com argila, cimento e similares.
Já foi um terror
O cinema já tratou do tema de relações entre seres humanos e de plástico. Recentemente os dois filmes mais conhecidos foram o francês Monique: Sempre Feliz, de 2002, e o americano A Garota Ideal, de 2007. Mas o primeiro renascido de fato no cinema foi Frankenstein, lançado nos cinemas em 1931. Desde então foram muitos filmes a partir da franquia original, até chegarmos em Pobres Criaturas, de 2023.
Frankenstein foi um personagem reborn, muito mais original. O romance, escrito por Mary Shelley, foi publicado em 1818. O personagem nunca é citado pelo nome no romance. Talvez porque a autora não reconhecesse nele um elemento de humanidade. Frankenstein foi um sucesso de vendas. E o primeiro reborn a ganhar as telas e a dimensão de influencer. O personagem ofuscou a criadora.
Os bebês renascidos equipados com algoritmos
Há uma hipervalorização do tema. Os bebês renascidos não são um fenômeno de novo comportamento humano. Olhe para o lado e veja quantas pessoas com bebês reborn você encontrou nas suas andanças. Quantas creches reborn você viu? O que querem tratar como fenômeno de comportamento faz parte do modus operandi das redes sociais.
Os bebês renascidos apareceram para o grande público nas vitrines de lojas há mais de 20 anos. Foram acompanhados pelos cães, gatos e pássaros. Apareceram nos braços e berços de quem come cliques. Numa relação parasitária, alimentam as redes sociais e o lucro das plataformas. O que dá vida a eles são as redes sociais. Isso não é renascimento. É redundância.
Algoritmos captam e testam oportunidades. Identificam temas que podem se tornar relevantes não como conteúdo profundo, mas como indutores da atenção. São temas que podem chegar a mais pessoas, fazendo com que fiquem mais tempo conectadas. Assim serão mais impactadas por anúncios. Esse é o mercado de verdade. O resto é reborn.
Quem posta seu bebê renascido, as supostas creches para renascidos, atendimento em hospitais ou babás para os bonecos, não estão expondo comportamento, ao menos não nas fotos. O comportamento é a caça de cliques para si. Sabem que o bizarro atrai. A curiosidade humana sempre olha para o bizarro devorando curiosidade e críticas. Tudo é reborn quando se olha para dentro de cada um.
Eu, de minha parte, prefiro ver uma enxurrada de bebês “Rebord”, filhos da Rê Bordosa, icônica personagem criada por Angeli. O pai poderia ser o Meia Oito. Mas ela, acho, tinha uma quedinha pelo Geraldão, do Glauco, que, por sinal, tinha uma namorada reborn, uma boneca inflável apelidada de Sonia Braga. Seriam bebês com óculos escuros, com olhos de ressaca, notívagos e achando os reborn um porre. Rê Bordosa, Meia Oito, e Geraldão, continuem a nos salvar!