Abraham “Berger” Barzilai foi um líder importante do Partido Comunista da Palestina na década de 1920, por isso foi perseguido pelo stalinismo. Sua história é interessante, pois é um exemplo de como o stalinismo foi uma força contra-revolucionária, inclusive para a luta pela libertação da Palestina. Ele nasceu em Cracóvia em 1904, na Polônia austríaca. Em 1914, sua família fugiu do exército russo, que ameaçava invadir, indo para Viena e mudando-se em 1916 para Bielitz, na Silésia austríaca.
O jovem Abraham foi criado como judeu ortodoxo e sionista, tornando-se ativo no grupo juvenil sionista Wanderbund Blau-Weiß. Ainda na Europa, ele se aproximou da esquerda e tornou-se membro da organização sionista de esquerda Hashomer Hatzair. Em 1919, ele imigrou para a Palestina aos quinze anos. Lá, trabalhou primeiro na construção de estradas e depois como tradutor para uma empresa de engenharia.
Na Palestina, ele rapidamente se tornou marxista. Sua evolução para o marxismo foi motivada principalmente pelo fato de que até mesmo os sionistas de esquerda ignoravam ou desprezavam a expulsão dos árabes de suas terras pelos colonos sionistas. Foi nesse momento que assumiu o nome Berger.
Os militantes comunistas na Palestina se espalharam logo após o surgimento dos primeiros partidos comunistas fora da Rússia Soviética em 1919. Os comunistas na Palestina, assim como em outros lugares, estavam convencidos de que uma revolução mundial resolveria a Questão Judaica eliminando o capitalismo, que consideravam a única fonte de antissemitismo e assim eram uma linha política alternativa ao sionismo. Para eles era uma ideologia reacionária que retirava os trabalhadores judeus da luta de classes revolucionária.
Em março de 1919, os Sionistas Poale formaram o precursor do Partido Comunista, o Partido dos Trabalhadores Socialistas Judeus (Mifleget ha-Poalim ha-Sotsialistim Ivriim ou MPSI). O MPSI teve sucesso considerável na primeira eleição do Comitê Executivo da Histadrut, a Central Sindical sionista, em 1920, conquistando seis dos oitenta e sete assentos no comitê. Em setembro de 1920, um de seus dirigentes mais importantes, Yaakov Meyerson, foi convidado como orador para uma reunião do Comitê Executivo da Internacional Comunista (Comintern) em Moscou. Lá, ele enfatizou que o MPSI havia iniciado entre os árabes uma campanha de solidariedade e unidade de todos os trabalhadores e a criação de sindicatos, algo que não se tornou uma política real ao longo da existência da organização.
A organização quase foi acabou após sua manifestação do 1º maio em Jafa (atualmente Telavive) em 1921. O grupo sionista Ahduth Ha’avodah (Unidade do Trabalho) atacou a manifestação do MPSI. Os confrontos entre os dois grupos abriram marge para a população palestina também inicar um protesto contra os sionistas. A polícia do mandato britânico prendeu alguns militantes do MPSI e os deportou para a Rússia Soviética. Desde então, todas as atividades comunistas na Palestina tiveram que ser organizadas de forma ilegal.
Assim, uma ala do MPSI formou o Partido dos Trabalhadores Socialistas (Mifleget ha-Poalim ha-Sotsialistim ou MPS). Omitiram a palavra judeu para reconhecer o caráter binacional da luta proletária, ou seja, começaram a rachar com o sionismo. Mais tarde, adotaram o nome de Partido Comunista Palestino (PCP). Nesse momento o partido incluía cerca de 450 membros.
Em setembro de 1922, uma minoria, liderada por Berger, separou-se do PCP e formou o Partido Comunista da Palestina (“PCdaP”). Esta racha atacou vigorosamente o “PCdaP” por sua suposta posição conciliatória em relação ao “sionismo socialista”. Em fevereiro de 1923, membros de ambos os partidos foram expulsos da Histadrut, o que os aproximou um pouco. Em junho de 1923, a maioria aceitou a posição de Berger. O partido foi reunificado e adotou um programa que rompeu com o sionismo em todas as suas formas e caracterizou o movimento nacionalista árabe como uma “pedra angular na luta contra o imperialismo britânico”.
Assim, o PCP foi fundado por um movimento de fato revolucionário. Romperam totalmente com os sionistas e se aproximaram do movimento nacionalista árabe que representava a esmagadora maioria da população da região. Naquele momento a Palestina estava sendo colonizada pelos britânicos há apenas 6 anos e havia pouquíssimos imigrantes europeus judeus vivendo no país. Ao mesmo tempo, as fronteiras dos países árabes eram muito recentes e Revolução Árabe de 1916 estava muito próxima nas memórias de grande parte da população.
Abraham Berger foi um dos autores do programa do partido. Junto com Wolf Averbach, ele foi responsável pela unificação de vários pequenos círculos de esquerda que haviam temporariamente deixado o MPSI. O partido então adotou o nome em iídiche Palestinishe Komunistishe Partey (Partido Comunista da Palestina). Isso é importante, pois se opunha a linha sionista nacionalista que valorizava o hebraico. Ídiche era a língua falada pela população de grande parte dos judeus da Europa que migraram para a Palestina.
O Comitê Cenral então foi formado por Averbach, Berger, Moishe Kuperman e Nahum Lestshinski Atuando como secretário adjunto, Berger foi enviado a Moscou em março de 1924 para negociar a entrada bem-sucedida do partido na Comintern. No mesmo ano, ele e o militante palestino Ya’akov Tepper ajudaram a estabelecer uma filial libanesa do partido, que se tornaria uma organização independente. Como emissário do PCP, ele também viajou para o Egito, Síria e Transjordânia (atual Jordânia). Já o Secretário do Partido, Wolf Averbach, se encontrou com os líderes da rebelião síria contra o domínio colonial francês.
Mas este período revolucionário de Berger e do PCP seria muito curto. Após a morte de Lênin a burocracia stalinista reacionária tomou o controle da URSS e da Comintern. Isso afetou diretamente a política do PCP e no fim levou a repressão do próprio Berger e de toda ala esquerda do partido. Esse será o tópico da parte 2 desse artigo.