O jornalismo de irrelevâncias e o episódio Janja-Tik Tok

Sempre que você ler uma notícia que fala de “sentimentos” de pessoas, fique com um pé atrás: é truque primário do jornalista para “esquentar” a sua notícia.

Durante meses, uma colunista de O Globo soltava dia sim dia não notas sobre o “incômodo” de militares com qualquer coisa. Lula falou A? A frase “incomodou” militares. Ou seja, tinha uma fonte militar que ficava dando palpite sobre tudo. E os palpites eram transformados em “incômodo” coletivo. E o uso do “incômodo” esquentava a nota, dava alguma relevância a uma informação irrelevante.

Depois, parou por excesso de ridículo.

O episódio do suposto “incômodo” causado por Janja em um jantar com o presidente Xi Jinpijng é do mesmo nível de ridículo. Os autores do “furo” foram os jornalistas Andrea Sadi e Valdo Cruz. Segundo os jornalistas: “Além de Xi Jinping, a primeira-dama da China, Peng Liyuan, teria ficado irritada com o comportamento de Janja durante o encontro. A postura da brasileira foi considerada desrespeitosa em relação ao presidente Xi Jinping”.

A fonte teria sido um Ministro de Lula.

Há um teste básico para qualquer notícia: o da verossimilhança. Teria sido fácil aos dois repórteres, fossem um pouco mais atilados, submeter a informação a esse teste.

Havia duas maneiras das tais fontes terem constatado o mal-estar provocado:

  1. Xi Jinping manifestar o desconforto durante o jantar. Alguém acha minimamente verossímil que, em um jantar que sela uma visita essencial para ambos os países, e sabendo do comportamento austero dos chineses, pudesse ter havido qualquer manifestação perceptível de desconforto em relação a uma frase banal? É evidente que não.
  2. Xi Jinping ser confidente de dois ministros que, por seu histórico político, não tem a mínima ideia sobre procedimentos diplomáticos, nem envergadura para conversas a sós com o mandatário chinês.

Lula tem uma relação de décadas com XI Jinping. E os gênio da mediocridade dizendo que “não era lugar de Lula falar tal coisa”. É de uma baboseira incrível.

Ouvindo a Globonews, agora de manhã, o nível de primarismo das análises é chocante. Um amontoado de palpites que ficariam melhor em conversas de bar.

A única observação pertinente foi de Daniela Lima – um peixe fora dágua em meio a tantos gênios da mediocridade. Segundo ela, o episódio permite tirar apenas uma conclusão: a de que Janja é torpedeada por fogo amigo, e há muito tempo.

Quando menciono “gênios da mediocridade”, baseio-me na definição de Luiz Weiss sobre aqueles jornalistas capazes de extrair, de cada fato importante, a informação mais irrelevante e, por isso mesmo, mais acessível ao “leitor mediano”. É curioso, porque a GN deveria buscar um público mais qualificado, mais de acordo com as TVs a cabo. Mas a mediocridade sempre sai vencedora.

Lembro que a repórter Andrea Sadi foi a mesma que, nos dias que antecederam a entrega de Lula à Polícia Federal, divulgou a falsa informação de que Lula resistiria à prisão. Imediatamente advogados de Lula entraram em contato com ela, pedindo um desmentido, já que a notícia, embora falsa, poderia provocar uma invasão da PM, com consequências dramáticas. Ela se recusou a corrigir a informação. Ligaram então para Natuza Nery, que divulgou o desmentido.

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