A violência e truculência de Trump contra os migrantes assumiram ares de uma ditadura latino-americana da década de 80. A polícia de imigração, com a sigla ICE investiu contra toda a população estadunidense implantando um regime de terror. Nenhum norte americano atualmente sai às ruas sem todos os documentos capazes de provar que são realmente norte-americanos! Para os migrantes o ICE é gelado, sequestrando na rua, nas escolas, no trabalho qualquer um que não seja absolutamente identificado com a “raça” nacional. O racismo é a única base para as perseguições, deixando de levar em conta os documentos que as pessoas possam ter. Mães são separadas dos filhos de forma violenta, profissionais com grande lastro acadêmico ou científico não escapam e tudo isto é mostrado diariamente nas redes e na tv. As decisões judiciais contra estas arbitrariedades são solenemente desrespeitadas.
Diante disso só cabe a indignação, a revolta, e a reação coletiva contra o Estado nazista que Trump já está buscando implantar na prática. Dezenas de milhares de manifestantes saíram às ruas desafiando e resistindo heroicamente em Los Angeles à brutal repressão ordenada pelo governo ultradireitista de Donald Trump. O presidente dos Estados Unidos determinou o envio de dois mil soldados da Guarda Nacional e, posteriormente, 700 integrantes das Forças Armadas a Los Angeles para reprimir os protestos contra a política de deportação do governo estadunidense passando por cima da determinação legal que exige a autorização do governo da Califórnia. Com a truculência que o caracteriza, Trump postou na rede social que o governo federal intervirá e resolverá o problema, se o governador e a prefeita de Los Angeles, Karen Bass, não fizerem seu trabalho.
O levante eclodiu na cidade de Paramount, Califórnia, ao sul de Los Angeles, onde os migrantes e seus apoiadores, alguns dos quais estavam carregando a bandeira palestina e usando lenços típicos, lutaram contra a polícia e os agentes do ICE. Muitos outros manifestantes carregavam suas bandeiras de origem, especialmente os da América Central e do Sul. Os jovens lutaram com pedras e garrafas contra agentes armados do ICE e policiais que usam gás lacrimogêneo, spray de pimenta, balas de concussão e bombas de gás lacrimogênio fumaça contra eles.
Los Angeles é a segunda maior cidade dos Estados Unidos e a de maior presença de migrantes, legais e ilegais. As manifestações, como reação a estas operações trumpistas, retaliam as agressões policiais, em um clima de guerra civil.
O levantamento da juventude e da classe trabalhadora migrante de Los Angeles está se espalhando por dezenas de cidades e já foram anunciadas manifestações unitárias em todo o país em 14 de Junho para dar uma resposta de classe à Trump.
Não é por acaso que a guerra contra os imigrantes está aumentando quando o governo e seus aliados de direita no Congresso estão se preparando para cortar o Medicaid (Programa de Saúde norte americano) e o vale-refeição para pagar incentivos fiscais para os ricos e um aumento maciço nos gastos com a guerra. Eles também estão preparando enormes cortes na educação, saúde pública e outros programas públicos absolutamente críticos. Eles querem culpar os imigrantes por todos os problemas da sociedade, problemas que na realidade decorrem da profunda desigualdade que permitiu que a burguesia acumulasse riquezas bilionárias, enquanto os trabalhadores não têm seus salários reajustados há anos e ocupam empregos cada vez mais precários.
Estamos perante uma das explosões mais potentes em anos, um movimento de massas contra as operações do ICE e as políticas abertamente racistas do governo trumpista que remetem inevitavelmente às revoltas pelo assassinato de George Floyd, quando o próprio Trump teve que se esconder no bunker da Casa Branca.
A coragem e valentia das massas de Los Angeles mostra ao conjunto da classe trabalhadora estado-unidense o caminho para derrotar as medidas cada vez mais autoritárias e antidemocráticas do trumpismo. Hoje, são os migrantes latino-americanos o alvo da sua ofensiva e aqueles que tomam as ruas para se opor a este governo de extrema-direita. Mas as políticas de Trump têm a sua origem na profunda decadência e crise interna do imperialismo estado-unidense e representam uma declaração de guerra ao conjunto de todos os oprimidos.
A ofensiva racista e fascista de Trump
Desde janeiro, a ofensiva contra os migrantes provocou a deportação de mais de 70.000 pessoas, a maioria de origem latino-americana. A fúria com que estas políticas são executadas empurrou milhares de imigrantes —incluindo muitos com documentos, jovens de segunda geração e famílias inteiras— a tomar as ruas.As detenções já não ocorrem apenas em batidas noturnas, mas dentro dos próprios tribunais migratórios onde as pessoas vão para tentar regularizar o seu estatuto.
Nas últimas semanas, a maioria dos detidos têm sido mulheres, mães que eram presas enquanto os seus filhos permaneciam na escola. Muitos e muitas imigrantes, mesmo aqueles com documentos, temem sair de casa pelo risco de serem detidos apenas pela cor da sua pele, pois os agentes do ICE não se detêm para verificar se são legais ou não. Centenas de migrantes (incluindo muitos que conseguiram o reconhecimento legal do seu estatuto por parte do Governo dos EUA) foram deportados para autênticos campos de concentração como o de Guantânamo ou a mega prisão construída por Bukele em El Salvador como se fossem prisioneiros de guerra ou perigosos criminosos.
A gota que fez transbordar o copo foi uma operação particularmente violenta em frente a uma superloja varejista no distrito de Paramount: um comboio militarizado, armado com metralhadoras, fez dezenas de detidos imigrantes durante oito horas. Foi uma operação de guerra contra trabalhadores desarmados.
A resposta não se fez esperar. Mais de 10.000 pessoas tomaram as ruas de Los Angeles para impedir esta ofensiva. Esta mobilização está ligada às manifestações de 5 de abril que percorreram todo o país e se transformaram numa verdadeira revolta popular. O que começou como um comício diante de um centro de detenção de migrantes transformou-se numa manifestação massiva, alimentada por colunas que marchavam de diferentes pontos da cidade.
A hipocrisia dos democratas
Embora o governador democrata da Califórnia, Gavin Newsom, se apresente cinicamente como defensor dos migrantes, a realidade é que a polícia da Califórnia, em coordenação com a Guarda Nacional – força militar usualmente sobre o controle do governador do Estado -, reprimiu brutalmente o movimento. Foram utilizados gases lacrimogéneos, balas de borracha e granadas atordoantes. Pelo menos 70 manifestantes foram detidos e houve dezenas de feridos.
Trump, que sobrepôs a sua autoridade à do governador da Califórnia, começou por enviar 300 agentes da Guarda Nacional da Califórnia sem o consentimento do governador, mas já enviou mais 2000. Isto constitui uma violação legal sem precedentes desde 1965. Para justificar a utilização de um corpo policial-militar como a Guarda Nacional, Trump invocou a Lei de Insurreição de 1807. Apesar disso, não conseguiu dissolver a protesto.
A brutal repressão agora inclui ainda o envio de efetivos de um corpo utilizado historicamente para invadir outros países, os fuzileiros navais, conhecido pela sua brutalidade, torturas e crimes de guerra.
Para justificar esta repressão selvagem, Trump recorre a um discurso fascistoide, rotulando os manifestantes de “invasores”, “insurrecionistas” e de uma “ameaça à América”, afirmando que se não tivesse enviado a polícia e o exército, Los Angeles estaria destruído, quando a violência para reprimir e atacar as manifestações pacíficas – como mostram um sem-fim de vídeos e testemunhos – foi desencadeada pelo Estado.
A violência real não vem dos manifestantes, mas sim das políticas racistas e repressivas dos dois partidos da classe dominante: os Republicanos, claro, mas também os Democratas, cujo discurso de paz esconde a aplicação de políticas capitalistas e racistas contra os migrantes que pavimentaram o caminho para o trumpismo.
Os governos Biden e Obama deportaram uma série de migrantes à semelhança de Trump e mantiveram muitas das leis e medidas que ele usa agora. A administração Democrata de Biden iniciou a cumplicidade com o holocausto do povo palestino que está sendo executado pelo regime sionista de Netanyahu com o apoio entusiástico de Trump.
O inimigo interno
Trump chegou até ameaçar prender o governador da Califórnia e a Presidente da Câmara de Los Angeles, porque estes dois líderes Democratas, após inicialmente ordenarem e justificarem a repressão, tiveram que fazer declarações a denunciar a brutalidade do Governo, pressionados pelo ambiente de rejeição maciça a isso e do apoio aos manifestantes que existe entre a população. Mas a verdadeira face dos Democratas voltou a mostrar-se com o “toque de recolher” decretado pela Presidente da Câmara de Los Angeles.
As ameaças de Trump não são apenas bravatas, refletem as suas tendências autoritárias e ditatoriais e a gravíssima ameaça que representa este governo de extrema-direita para a classe trabalhadora nos EUA, tanto nativa como migrante.O governo precisa de escalar a violência. Não só para disciplinar a população migrante, mas para esmagar a resistência da classe trabalhadora como um todo.
Até o encerramento deste artigo (12 de junho), Trump enviou 10.000 soldados para a fronteira sul, 20.000 agentes da Guarda Nacional em operações de deportação em massa e estabeleceu “zonas de defesa nacional” em regiões fronteiriças do Texas e Novo México.
O objetivo é garantir a consolidação de um projeto autoritário ao serviço da oligarquia que Trump chama com cinismo de “Big Beautiful Bill” (Lei Grande e Bela). A meta é clara: militarizar a sociedade estado-unidense, semear o medo e esmagar qualquer forma de resistência social.
Este programa de extrema-direita representa um ataque brutal ao orçamento público: cortes de até 56% em ciência, saúde pública e pesquisa, eliminação do Título I (complemento do financiamento estatal e local para crianças de famílias com baixos rendimentos, especialmente em escolas de alta pobreza) e subsídios educacionais, demissões em massa no setor público, eliminação de direitos da comunidade queer, e desmantelamento do Medicare. Não é apenas um ataque aos migrantes: é uma declaração de guerra contra toda a classe trabalhadora.
Enquanto a hegemonia global dos Estados Unidos se desmorona – desde a derrota na guerra na Ucrânia até à confrontação tarifária derrotada com a China – agora intensifica a opção de reforçar a exploração interna. Para que as elites econômicas mantenham os seus privilégios, precisam de quebrar os direitos sociais e trabalhistas de milhões. Mas esta ofensiva desesperada pode vir a voltar-se contra si.
Uma reação internacional contra a extrema direita.
Os republicanos utilizam a clássica demagogia da extrema-direita culpando a imigração por todos os males do país. Pretendem usar os migrantes para justificar a militarização e desviar a atenção do verdadeiro inimigo. Os responsáveis pela crise econômica brutal e o deterioração dos níveis de vida e dos direitos da classe trabalhadora são os que sustentaram Trump, os especuladores e bilionários que têm saqueado o país durante décadas.
Perante estas ameaças, o discurso dos democratas, criticando verbalmente Trump enquanto na prática aplicam políticas muito semelhantes, é pura hipocrisia. Criticam a brutalidade da polícia quando se beneficiaram durante anos da ilegalidade dos migrantes para manter um voto cativo com falsas promessas de facilitar a sua exploração pelos empresários.
Os governos latino-americanos também não são aliados das massas que desafiam Trump nas ruas. Mesmo os supostamente “progressistas” na verdade agem como subordinados de Trump. Um exemplo claro é o governo do México de Claudia Sheinbaum, que enquanto critica Trump em discursos, militarizou a fronteira norte do país com 10.000 elementos da Guarda Nacional e se mantém em silêncio nas conferências do Tratado entre México, Estados Unidos e Canadá (T-MEC) sobre a regularização de migrantes.
A comunidade imigrante é a espinha dorsal da economia estado-unidense: 90% da força agrícola, 30% da construção civil. Só em Los Angeles, vivem mais mexicanos do que em qualquer cidade do mundo fora do México, há 65 milhões de latinos nos EUA, dos quais 38 milhões são mexicanos, dos quais apenas 4 milhões estão sem documentos. É uma força capaz de começar a demolir o imperialismo norte americano por dentro, que é responsável direto pelo genocídio em Gaza, pela guerra por procuração na Ucrânia e pela opressão e exploração de todos ao países do mundo.
Neste momento as manifestações já abrangem dezenas de cidades e continuam a expandir-se. É preciso que os trabalhadores e trabalhadoras afiliados à AFL-CIO —com mais de 15 milhões de membros— a se unirem às mobilizações e a obriguem os seus dirigentes a apoiar esta luta. Durante as manifestações, David Huerta, presidente do sindicato Service Employees International Union (SEIU) California e do SEIU-United Service Workers West, foi agredido e detido apenas por estar no protesto. Huerta, cujos avós migraram do México, é cidadão americano. Isto mostra que as violências atingem todos os trabalhadores , devendo os sindicatos se mobilizarem.
As mobilizações com epicentro em Los Angeles estão a sacudir todo o país, mostrando uma força imensa e mostrando o caminho para o resto da classe trabalhadora. Apenas a luta massiva nas ruas, como demonstram os trabalhadores e trabalhadoras imigrantes, unificando as reivindicações de toda a classe trabalhadora, pode derrotar esta declaração de guerra de Trump e das grandes corporações que o apoiam contra a classe trabalhadora.
As mobilizações contra Trump são um desafio e uma oportunidade para a esquerda combativa nos EUA, na América Latina e no resto do mundo. É urgente articular uma campanha internacionalista de solidariedade ativa com a luta da classe operária migrante, e convertê-la numa demonstração de força contra toda a extrema-direita global e o seu líder máximo Trump.