A prisão do general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022, trouxe à tona um dos capítulos mais sombrios da tentativa de golpe que ameaçou a democracia brasileira. Acusado de envolvimento na trama que visava sequestrar e assassinar autoridades, como o presidente Lula, o vice Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes, Braga Netto se tornou o primeiro general quatro estrelas a ser encarcerado no país desde o fim da ditadura militar.
Agora, a Polícia Federal concentra seus esforços na investigação de quem financiou a tenebrosa operação que, caso fosse bem sucedida, instauraria uma nova ditadura no país.
“Pessoal do agronegócio”
Em depoimento à PF, o tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, afirmou que o dinheiro para a operação antidemocrática “foi obtido junto ao pessoal do agronegócio”. Segundo Cid, os recursos para levar a cabo o plano de assassinato — um total de R$ 100 mil — foram entregues ao major Rafael de Oliveira em uma caixa de vinho, para depois chegarem às mãos de Braga Netto. A verba, em espécie, foi utilizada para a compra de celulares, que serviram para o monitoramento de autoridades e o planejamento das ações.
Apesar de extremamente preocupante, o alinhamento de partes do agronegócio a tentativas de golpe não chega a ser novidade. Após as eleições de 2022, empresários da área financiaram manifestações antidemocráticas, como bloqueios de rodovias e mobilização de caminhoneiros, com o objetivo de deslegitimar a vitória de Lula. Em seguida, o setor patrocinou os atos extremistas de 8 de janeiro de 2023, que invadiram e depredaram os palácios da Praça dos Três Poderes e objetivavam tomar à força o poder.
A Frente Parlamentar da Agropecuária, uma das mais poderosas do Congresso Nacional, tenta se distanciar de qualquer envolvimento com os golpistas. Porém, as investigações continuam a desvendar os laços entre empresários do setor e as ações antidemocráticas. A Frente argumenta que os envolvidos devem ser responsabilizados sem que isso prejudique a imagem de uma atividade fundamental para a economia do país.
A busca de pistas
“As dezenas de pen drives apreendidos com Flávio Botelho Peregrino, principal assessor do general Walter Braga Netto, são o melhor caminho para se buscar pistas sobre o ‘pessoal do agro’”, afirmou Míriam Leitão, em recente coluna no jornal O Globo. Segundo a jornalista, o material traz novos dados sobre a origem dos recursos e as conexões entre os financiadores e os executores do plano.
Leitão continua: “A lei diz que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Mas os investigados produziram e isso tem indicado o caminho da investigação”. A quantidade de evidências já reunida é robusta: além dos R$ 100 mil entregues ao major Oliveira, há documentos, mensagens de texto e áudios que detalham as etapas da trama. Até o momento, 40 pessoas já foram indiciadas pela Polícia Federal. Esse número pode aumentar, à medida que as investigações avançam.
“Kids pretos”
Embora Braga Netto negue participação, as delações de Mauro Cid indicam que ele teria papel central na articulação financeira e logística da operação. Além dele e de Rafael de Oliveira, o general Mário Fernandes e os oficiais Hélio Ferreira Lima e Rodrigo Bezerra de Azevedo também foram apontados como operadores do esquema.
O grupo faz parte do “kids pretos”, militares da ativa ou da reserva do exército especialistas em operações especiais. Segundo a PF, a equipe havia preparado um “detalhado planejamento operacional, denominado ‘Punhal Verde e Amarelo’, que seria executado no dia 15 de dezembro de 2022”. O plano, como se sabe, culminaria com o assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes.
Sem anistia
Em postagem nas redes sociais, a deputada federal (PT/PR) e presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, lembrou que a ação foi realizada por aqueles que “queriam se manter no governo a todo custo, para continuar a venda do país”. E citou ainda “a condenação de Roberto Jefferson a 9 anos de prisão pelo STF e a formação de maioria no TRE-SP para cassar a deputada Carla Zambelli”. Junto com Braga Netto, “são três nomes da cúpula bolsonarista que cometeram crimes gravíssimos contra a democracia”.
Braga Netto foi preso preventivamente porque tentou atrapalhar as investigações da polícia, isso depois de todos saberem que entregou dinheiro vivo em caixas de vinho, participando de plano para matar Lula, Alckimin e Alexandre de Moraes. Queriam se manter no Governo a qualquer…
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) December 14, 2024
Felizmente, para os envolvidos e para a democracia brasileira, a nova tentativa de golpe de Estado, aparentemente financiada pelo “pessoal do agronegócio” e mais uma vez executada pelo exército, não foi bem sucedida. “Com essa gente não pode haver impunidade. Punição para todos, a começar pelo chefe inelegível. Sem anistia”, declarou Gleisi.
Da Redação