O golpe de Estado contra o presidente sírio Bashar al-Assad não foi apenas um ataque imperialista contra a Síria, mas também um golpe contra o Eixo da Resistência e, portanto, contra os palestinos. No entanto, setores da esquerda pequeno-burguesa querem não apenas comemorar a vitória da CIA como também afirmar que ela foi uma derrota de “Israel”. É o que afirma o texto “Aqueles que apoiam os palestinos devem celebrar a queda de Assad” publicado no jornal Red Flag.

O texto afirma que “Bashar al-Assad não teria sido derrubado tão rapidamente pelas milícias sem uma oposição massiva ao seu regime. De fato, nas cidades do sul, Sweida e Daraa, as pessoas se levantaram para expulsar os oficiais do governo sem precisar da intervenção dos combatentes islâmicos do norte. O exército sírio efetivamente se dissolveu, seus soldados vestindo roupas civis e não oferecendo resistência—Assad não tinha apoio popular, nem dentro de seu próprio exército. Da mesma forma, quando os rebeldes se aproximaram de Damasco, as forças do governo desmoronaram e recuaram. Assad fugiu”.

É um argumento absurdo pois ignora justamente o fator mais importante na guerra da Síria, o imperialismo. O argumento na realidade deve ser colocado de forma inversa. O governo Assad nunca teria resistido por 13 anos de intervenção imperialista sem ter apoio popular. Foram 13 anos em que bilhões foram enviados para a oposição, que o país foi ocupado pelos EUA em sua região mais rica, que sanções monstruosas foram impostas e ainda assim Assad conseguiu sobreviver por todo esse tempo.

O maior absurdo de toda a sua argumentação é justamente que a critica é totalmente voltada para Assad, para o Irã e para todo o Eixo da Resistência, o imperialismo e “Israel” aparecem como agentes secundários, algo totalmente absurdo ao se analisar qualquer país do Oriente Médio. A comemoração das milícias que tomaram o poder ignora completamente que elas foram criadas pelos EUA, a província rebelde de Idlib foi literalmente uma conquista da CIA, que organizou e armou a sua tomada.

O artigo segue: “A Guarda Islâmica do Irã e o partido-milícia libanês Hesbolá intervieram para resgatar o regime, mas nem mesmo eles conseguiram esmagar a revolta popular. Em 2015, a Rússia finalmente interveio para salvar Assad, lançando bombardeios de barril em cidades inteiras”. Mais uma vez a mesma tese aparece. A intervenção externa é do Hesbolá, do Irã e da Rússia, a intervenção dos EUA e de “Israel” é totalmente ignorada. Em 2015, os norte-americanos já haviam enviado bilhões de dólares em armas para a “oposição popular”. Se ela fosse tão popular assim com o apoio da maior potência do planeta seria impossível não ser vitoriosa. Mas Assad venceu a guerra em 2015, ele só veio a ser derrubado em 2024 em outra conjuntura.

Para embasar esse argumento ele tenta afirmar que o governo Assad não era inimigo do sionismo. O texto afirma: “mas Assad tem policiado a fronteira com “Israel” há décadas, recusando-se a desafiar a ocupação das Colinas de Golã. ‘Nós não tivemos um problema com o regime de Assad—por 40 anos, nem um único tiro foi disparado nas Colinas de Golã’, disse o Primeiro-Ministro de “Israel”, Benjamin Netaniahu, a jornalistas durante uma visita a Moscou em 2018”.

Ou seja, o autor toma uma das mentiras escancaradas do sionismo como uma verdade. A Síria foi um ponto de apoio importante para armar os inimigos de “Israel”, o Hesbolá e as organizações palestinas. “Israel” então bombardeou o país centenas de vezes para tentar impedir essa rota de armas. A Síria era um notório inimigo de “Israel”, o único governo do entorno que o Estado sionista desejava derrubar. Netaniahu fala assim da Síria pois estava em visita a Rússia, um aliado dos sírios, mas na prática “Israel” foi o segundo país mais importante para derrubada da Síria, tanto é que logo após a queda de Assad invadiu o território.

Então chega a tese de que Assad seria na verdade uma espécie de sionista. O texto afirma: “Assad tem perseguido e reprimido os palestinos na Síria. Nas últimas semanas, 67 membros das brigadas Al-Qassam foram libertados da prisão de Sednaya, juntamente com outros 630 palestinos”. Segundo a imprensa burguesa as prisões de Assad seriam as piores do mundo. Mas por que ele manteria preso membros do Hamas se ele estava ativamente enviando armas para a resistência palestina? O Hamas e Assad inclusive reataram laços em 2021.

E então aparece o ataque imperialista contra o Irã: “as ditaduras iraniana e síria, o centro da chamada Eixo de Resistência, nunca iriam libertar os palestinos. A evidência disso é o seu governo despótico sobre seu ‘próprio povo’. Nos últimos três anos, houve protestos e greves em massa contra o tratamento das mulheres e trabalhadores pelo regime iraniano e seus massacres de manifestantes. Eles nunca defenderão uma verdadeira libertação na Palestina, precisamente porque isso poderia inspirar trabalhadores e oprimidos no Irã a se libertarem da tirania”.

Se a ditadura iraniana é tão violenta assim ele deveria explicar porque o país sob sanções violentíssimas do imperialismo continua tendo um governo forte. Porque quando o presidente Raisi e Qassem Soleimani foram assassinados milhões de pessoas saíram às ruas em uma clara declaração de apoio ao governo. É ridículo falar em ditadura no Irã olhando os governos no entorno, monarquias no Golfo, ditadura militar no Paquistão, ditadura nazista em “Israel”.

A questão não é a oposição entre “democracia” e ditadura, mas sim a luta de classes. A República Islâmica do Irã tem como inimigo mortal os EUA e “Israel”, ou seja, é um aliado total dos palestinos em sua luta pois eles têm os mesmos inimigos. É por isso que o Irã é históricamente o Estado que mais apoia a luta do povo palestino. Recentemente apenas um governo ultrapassou o Irã neste quesito, o governo revolucionário do Ansar Alá do Iêmen.

E é essa tese da ditadura que faz o autor se colocar a favor do golpe de Estado contra Assad. Dado que ele era um ditador a sua derruba é boa, mesmo que seja uma vitória da CIA e de “Israel”. O golpe de Estado na Síria não é de forma alguma uma vitória do povo palestino.

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Last Update: 26/12/2024