Tarifas em alta e incertezas renovam fantasmas da Grande Recessão, enquanto gerações trocam dicas de sobrevivência nas redes sociais
Há algumas semanas, enquanto Kiki Rough se sentia cada vez mais preocupada com a situação da economia americana, ela começou a pensar em períodos anteriores de dificuldades financeiras. Rough lembrou-se das habilidades que aprendeu para fazer os mantimentos renderem durante os tempos difíceis que acompanharam as crises econômicas passadas. Enfrentando sentimentos semelhantes de incerteza sobre o futuro financeiro do país, ela começou a criar vídeos com receitas de livros de culinária publicados durante recessões, depressões e períodos de guerra anteriores.
Aos 28 anos, ela disse aos seguidores que não é uma chef profissional, mas sim que aprendeu a cozinhar enquanto dependia de vale-refeição. Na sua cozinha amarela e preta, nos subúrbios de Chicago, ela ensina os espectadores a preparar refeições baratas e substitutos caseiros para itens como strudel de café da manhã ou donuts. Ela frequentemente lembra as pessoas de substituir ingredientes por alternativas que já tenham na despensa.
“Vejo essa piada repetidamente nos comentários: ‘Os pobres antigos ensinando os novos pobres’”, Rough disse à CNBC. “Só precisamos compartilhar conhecimento agora, porque todo mundo está assustado, e aprender vai dar às pessoas a segurança para lidar com essas situações.”
Os vídeos da consultora autônoma rapidamente ganharam público no TikTok e no Instagram. Entre as duas plataformas, ela conquistou 350 mil seguidores e cerca de 21 milhões de visualizações nos últimos meses, segundo sua contagem.
O anúncio do presidente Donald Trump, no início de abril, sobre tarifas amplas e elevadas aumentou o medo de que a economia dos EUA entre em recessão nas últimas semanas. À medida que americanos como Rough ficam cada vez mais preocupados com o futuro, eles estão relembrando as dicas e truques que usaram para sobreviver durante capítulos financeiros sombrios, como a crise financeira global de 2008.
O Google prevê um aumento nas buscas este mês por termos relacionados à recessão que marcou o final dos anos 2000. As pesquisas por “Crise Financeira Global” devem atingir níveis não vistos desde 2010, enquanto as buscas por “Grande Recessão” devem chegar ao maior patamar desde o início da pandemia de Covid.
Costeletas de porco, festas em casa e ‘jungle juice’
No TikTok, um grupo de millennials e da Geração X assumiu o papel de irmãos mais velhos, oferecendo lembranças e conselhos aos mais jovens sobre como economizar. Alguns da Geração Z pediram insights aos mais velhos sobre como é viver uma recessão nesta fase da vida, já que eram muito jovens para sentir os efeitos completos da crise financeira.
“Esta é, potencialmente, pelo menos em grande escala, a primeira vez que os millennials podem ser os ‘especialistas’ em algo”, disse Scott Sills, um profissional de marketing de 33 anos da Louisiana. “Somos especialistas em ter o tapete puxado debaixo de nós.”
Quem dá os conselhos está revisitando o final dos anos 2000. Viagens baratas para a Flórida eram a norma, em vez de passeios luxuosos no exterior. Eles tinham pastas para guardar recibos, caso itens caros entrassem em promoção depois. Roupas sociais casuais eram comuns em eventos porque não podiam pagar por vários estilos de roupa.
Costeletas de porco eram um prato comum devido ao custo acessível, levando um criador de conteúdo a declarar que elas “têm gosto” da Grande Recessão. Eles bebiam “jungle juice” em festas caseiras – uma mistura de bebidas baratas – em vez de coquetéis em bares.
“Há coisas que eu não percebi que eram ‘indicadores de recessão’ na primeira vez, porque pensei que eram apenas tendências”, disse M.A. Lakewood, escritor e arrecadador profissional no interior de Nova York. “Agora, você consegue ver de longe.”

É claro que parte do debate gira em torno de como a pressão inflacionária tornou muitas dessas dicas obsoletas. Alguns criadores de conteúdo apontaram que o salário mínimo federal permanece em US$ 7,25 desde 2009, enquanto o custo de vida disparou.
Kimberly Casamento recentemente começou uma série no TikTok mostrando receitas de um livro de culinária de 2009 focado em refeições acessíveis. A gerente de mídia digital, de Nova Jersey, disse que os custos daquilo que era considerado refeição barata na época aumentaram entre 100% e 150%. Além de compartilhar as mudanças de preço, ela dá dicas sobre como reduzir custos.
“Todos os aspectos da vida estão tão caros que é difícil para qualquer um sobreviver”, disse Casamento. “Se você puder reduzir o custo de uma refeição em US$ 5, já é uma vitória.”
‘Algo muito humano’
Esse tipo de compartilhamento comunitário de conhecimento é comum em tempos de aperto econômico, segundo Megan Way, professora da Babson College que estuda economia familiar e intergeracional. Enquanto conversas sobre como cortar custos ou fazer comida render costumavam acontecer entre vizinhos nos anos 2000, Way diz que faz sentido que agora ocorram na esfera digital, com o crescimento das redes sociais.
“É algo muito humano buscar os outros quando as coisas estão incertas e tentar aprender com a experiência deles”, disse Way. “Isso pode fazer diferença para sentir que você está se preparando. Um dos piores cenários para uma economia é o medo absoluto.”
Way afirma que os americanos rapidamente olham para a Grande Recessão como guia porque essa crise foi chocante e amplamente sentida. No entanto, há diferenças importantes entre aquela situação e o que os EUA enfrentam hoje, como a ausência de dívidas podres que causaram o colapso do mercado imobiliário.
Ainda assim, há uma ampla incerteza hoje em várias frentes – seja ligada à economia, geopolítica ou políticas domésticas, como reduzir o funcionalismo público ou limitar a imigração. Isso pode reacender o sentimento de imprevisibilidade sobre o futuro que foi marcante durante a Grande Recessão, disse Way.
Em 2025, está claro que a confiança econômica do americano médio está despencando. O índice de sentimento do consumidor da Universidade de Michigan registrou uma das piores leituras em mais de sete décadas este mês.
Com essa perspectiva econômica negativa, aumenta o estresse. Quando Lukas Battle fez um TikTok satírico sobre como os divórcios pareciam mais comuns durante a Grande Recessão, os comentários do jovem de 27 anos ficaram cheios de pessoas falando sobre os pais se separando recentemente. (Embora o divórcio tenha sido visto como uma marca cultural da crise financeira, dados mostram que a taxa realmente caiu nesse período.)
“Está acontecendo uma segunda onda de divórcios agora”, disse Battle.
Paralelos culturais
Esse é um dos vários paralelos que usuários das redes sociais traçaram entre o final dos anos 2000 e hoje. Quando vídeos de um grupo dançando ao hit “Anxiety”, de Doechii, surgiram, vários comentários no X mencionaram um déjà vu das flash mobs, que eram comuns na época.
O reboot da Disney do desenho “Phineas e Ferb”, que estreou originalmente no final dos anos 2000, também trouxe a era de volta à tona.

O termo “recession pop”, que se refere ao subgênero da música pop que surgiu durante a Crise Financeira Global, teve um ressurgimento no último ano, enquanto os americanos lidavam com inflação e juros altos.
Agora, em 2025, com o coro de vozes projetando uma recessão à frente, a música pop traz sons familiares.
Em 2008, artistas como Miley Cyrus, Lady Gaga e Katy Perry dominavam as paradas. Cyrus e Gaga lançaram novas músicos este ano, e Perry começou uma turnê mundial nesta semana.
“É quase uma permissão para se sentir bem, seja através da música ou algo assim”, disse Sills, o profissional de marketing da Louisiana. “Não é necessariamente ignorar os problemas, mas talvez encontrar alguma alegria ou diversão no meio de tudo isso.”