Em 8 de maio passado, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom/BC) anunciou a redução da taxa básica de juros, a Selic, de 11,25% para 10,5% ao ano. A boa notícia é não foi uma decisão consensual do colegiado. Ao contrário – fazia anos que o Copom não se mostrava tão dividido.
Os cinco integrantes indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – a começar pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto – votaram pela queda mais modesta possível, de apenas 0,25 ponto percentual. Já os quatro membros nomeados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva defenderam uma baixa de 0,5 ponto.
Passados 45 dias, o Copom voltou a se reunir e decidiu, em 19 de junho, manter a Selic nos mesmos 10,5%. Desta vez, porém, a votação foi unânime. Pior: pelos termos da ata divulgada à imprensa, tudo indica que os juros permanecerão em patamar elevado até (no mínimo) o final de 2024.
Diz o texto: “O comitê avaliou que a política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação, como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”.
Embora admitam que a inflação está em condições de alcançar a meta estabelecida para 2025, os membros do Copom não hesitaram em deixar o Brasil com a segunda maior taxa real de juros. É como resumiu o economista André Roncaglia: o mercado “passou a cobrar do Copom uma posição conservadora e unânime, para que a credibilidade se firmasse na visão dos agentes de mercado”. Até os indicados por Lula rezaram na cartilha da Faria Lima.
Juros estratosféricos comprometem não apenas o crescimento do País – mas também a viabilidade de planos estruturantes, como o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e a NIB (Nova Indústria Brasil). Em certa medida, as imposições ultraliberais do Banco Central, com sua política monetária antinacional e antipovo, viraram um entrave maior ao governo Lula do que a própria oposição no Congresso.
O presidente da República está certo em retomar a cruzada contra Campos Neto e os juros altos. Às voltas com uma tentativa de investir mais em entrevistas à imprensa para levar sua mensagem à população, Lula tem insistido no tema.
“O Banco Central tem necessidade de manter a taxa de juros a 10,5% quando a inflação está a 4%? O Banco Central leva em conta que as pessoas estão tendo dificuldade de fazer financiamento?”, disse Lula ao UOL na quarta-feira (26). Segundo ele, o porta-voz dessa causa “não deveria ser o presidente”. Mas faltam vozes – sobretudo no empresariado – que levem a pauta a sério.
“A gente tinha o Antônio Ermírio de Moraes, o José Alencar, que batia muito na taxa de juros”, lembrou Lula. “Em vez de reclamarem do governo, os empresários do setor produtivo, a CNI e a Fiesp deveriam fazer passeata contra a taxa de juros, porque são eles que estão tendo dificuldades. São eles que não conseguem crédito, não é o governo.”
Já à Rádio O Tempo, de Belo Horizonte (MG), o presidente reconheceu a preocupação com a alta de preços dos alimentos – daí a prioridade, por exemplo, de zerar os impostos dos produtos da cesta básica na reforma tributária. Mas não existe risco inflacionário generalizado.
“A taxa de juros de 10,50% é irreal para uma inflação de 4%. Isso vai poder melhorar quando eu puder indicar o presidente do Banco Central”, disse Lula. De acordo com o presidente, “é hora de priorizar não o ‘mercado’ que tenta impor a pauta rentista – mas ‘o mercado de 203 milhões de consumidores’.
“Este é um grande mercado, porque, quando essas pessoas estiverem consumindo, tudo vai melhorar”, resumiu o presidente. “A hora que o pobre estiver comendo mais, a hora que estiver se vestindo melhor, que estiver morando melhor, tudo melhora.”