A guerra na Faixa de Gaza se aproxima cada vez mais de uma vitória do Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) e de toda a resistência palestina. O jornal libanês Al-Akhbar revelou essa semana que a cúpula das forças armadas israelenses já começou a pressionar o governo Netaniahu pelo cessar-fire. Um dos grandes problemas para o fim da guerra é o que os israelenses chamam de “dia seguinte”, ou seja, como será o governo de Gaza após a derrota de “Israel”. Uma opção que está praticamente descartada é do governo árabe reacionário, com participação da Autoridade Palestina, da Arábia Saudita e do Egito.
As próprias organizações do imperialismo descartaram essa possibilidade há alguns meses. Foi publicado no dia 27 de maio no Carnegie Endowment for International Peace’s Middle East Program o texto “Armando uma nova guerra civil árabe” que se refere justamente a qual seria o resultado dessa política. Ele cita um dos planos do governo Biden que era “o Egito, os Emirados Árabes Unidos (EAU) e o Marrocos implantarem uma força conjunta árabe de manutenção da paz no território uma vez que o combate termine, com o objetivo de garantir a segurança de Gaza até que uma presença de segurança palestina credível possa ser estabelecida lá”.
Esses dois reinos e a ditadura militar do Egito estão entre os regimes árabes mais reacionários de todos. A política é absurda, pois o Hamas está derrotando “Israel” uma ditadura muito mais poderosa e brutal que a dos governos árabes, ou seja, derrubar essa coalização seria quase inevitável. O autor do texto discute alguns pontos práticos que mostram que isso é impossível.
“A força de manutenção da paz seria encarregada de desarmar membros do Hamas e outros militantes, interná-los, desmantelar suas organizações? Investigaria toda a Faixa de Gaza, casa por casa? Ou esperaria cegamente que a população local continuasse a acolher, até proteger, os pacificadores, mesmo enquanto a perspectiva de independência se torna cada vez mais distante? Os pacificadores acabarão infligindo ainda mais baixas a uma população já abusada—e incorrendo nas suas próprias”, afirma o autor.
O que isso significa? Que o povo de Gaza já compreendeu que não deve se desarmar sobre hipótese alguma. E após a independência da Palestina ainda será necessário se armar. Em outras palavras, os governos árabes que nada fizeram não enganam os palestinos. Ao mesmo tempo, os exemplos de sucesso nunca se desarmaram. É o caso do Hezbollah, da resistência do Iraque e do Iêmen. Este merece ser avaliado no detalhe, pois é onde essa política imperialista falhou.
O Ansar Alá tomou o poder no Iêmen na Revolução de 2014. O imperialismo então traçou o plano, derrubar o Ansar Alá e instaurar um governo fantoche dos sauditas e dos emiradenses. Isso deu origem a uma guerra brutal de 8 anos que terminou com a vitória do Iêmen. Ficou claro que esses governos reacionários árabes não tinham poder de contenção. Ao mesmo tempo, o Eixo da Resistência, que é unificado, já compreendeu isso. A experiência do Ansar Alá foi passada para o Hamas e a resistência palestina.
Além disso, o Hamas se tornaria uma oposição política a esses regimes que já estão ameaçados de cair. O autor afirma: “os riscos são ainda maiores porque tanto o Egito quanto os Emirados Árabes Unidos têm razões para perseguir suas próprias agendas em Gaza: eles veem o Hamas na mesma perspectiva da Irmandade Muçulmana, com a qual estão em guerra. Os Emirados Árabes Unidos certamente buscarão promover os interesses de seu aliado próximo, o ex-chefe de segurança de Gaza e líder do Fatá, Mohammad Dahlan, que mantém um seguimento em Gaza, inclusive entre clãs que recentemente se enfrentaram com o Hamas”.
Ou seja, o Hamas não é apenas uma força contra o que há de mais reacionário no Oriente Médio, o sionismo. O Hamas é um movimento que luta contra todo o reacionarismo da região. Se esses governos se envolverem diretamente com a Faixa de Gaza, a política revolucionária e extremamente popular do Hamas se voltará contra esses governos. Nesse sentido, tanto Egito quanto Emirados Árabes têm medo das consequências. Eles já são identificados como aliados dos sionistas, e isso iria piorar ainda sua imagem.
A realidade é que “Israel” não sabe o que fazer diante da derrota iminente em Gaza e a carta do governo árabe já não existe mais. “Uma força árabe ou internacional não se sairá melhor: simplesmente aliviará Israel assumindo uma situação insustentável que não tem mais chances de resolver do que Israel tem. Para o governo Biden negociar o desdobramento de uma força nos termos que está propondo, torna-o culpado de colocar seus aliados e amigos em risco conscientemente. E, com a violência radical dos colonos israelenses patrocinada pelo Estado na Cisjordânia sem controle, todo o arranjo servirá apenas a um resultado: desmantelar a Palestina completamente”.
A expectativa então é que o governo árabe iria levar tanto a derrota de “Israel”, porque recuou, quanto desses países árabes, que também seriam derrotados pela força do Hamas. No pior dos quadros para o imperialismo é o que o autor intitulou seu texto “guerra civil árabe”. Diante da ocupação de Gaza por governos árabes, o Iêmen poderia atacar os Emirados Árabes, o Hamas poderia atacar o Egito ou algum outro grupo da resistência lançar um ataque. E, com a fraqueza dos governos da região, essa guerra poderia escalar para toda a região junto a uma mobilização de todo o povo árabe em defesa da Palestina.