Após superar a sombra da política, o presidente Lula definiu como “metas compulsivas” para seu terceiro governo a recuperação da economia, a promoção de avanços nos indicadores sociais do Brasil e o resgate e o reposicionamento qualitativo do país no concerto das nações.
Em dois anos, o Brasil voltou a estar entre as dez maiores economias. Temos um processo inflacionário sob controle, e a renda do salário com crescimento recorde desde o Plano Real. A taxa de desemprego é a mais baixa da série histórica do IBGE, apesar do desafio ainda a ser vencido da elevada informalidade. Os programas sociais são diversos e expressivos para a proteção e garantia de direitos, notadamente das populações vulneráveis. E somente por desinformação, ou má fé, alguém poderia contestar o retorno em alto estilo do Brasil nos debates e encaminhamentos dos grandes temas globais.
Nesse contexto de avanços no país e de solidez dos fundamentos da economia, após tempo alongado de elaboração por conta das mediações requeridas por matérias complexas, o governo anunciou uma PEC e um PL com medidas para garantir a conformidade dos gastos públicos ao novo arcabouço fiscal.
Já em crise de ansiedade pela demora, setores do mercado reagiram com o conhecido ‘mau humor’, fazendo o dólar alçar à cotação inusitada de R$ 6,00, e igualmente levando à disparada dos juros futuros. Foi sintomático que o motivo da primeira reação dos ‘habitantes da Faria Lima’ tenha sido o vazamento da inclusão entre as medidas da ampliação da isenção do imposto de renda, em 2026, para quem ganha até R$ 5.000,00.
Ou seja, o que deveria ser reconhecido como cumprimento de promessa de campanha para a correção de uma injustiça tributária com a classe média brasileira foi interpretada e divulgada como suposta prova da falta de compromisso do governo com o corte de gastos. Na verdade, o que os moveu, além do impulso automático refratário ao governo, foi a insatisfação com a contrapartida da medida que terá impacto fiscal neutro, já que os seus custos (R$ 50 bi/ano) serão cobertos com a taxação de lucros e dividendos, e dos super salários (acima de R$ 50 mil).
No conjunto, estima-se que as medidas produzirão economia aos cofres públicos de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos, com a preservação dos compromissos do governo com a justiça social no Brasil. Mas isso também provocou a ira desses setores que julgaram os 70 bi como tímidos. Exigem sangue: ‘tesouraço’ na saúde, educação, previdência, bolsa família, minha casa minha vida, farmácia popular, etc! Como disse o jornalista Reinaldo Azevedo: o mercado quer enforcar o último trabalhador com as tripas do último aposentado.
Agentes desses setores que usufruem de polpudas desonerações tiveram a coragem de condenar a nova regra para o salário mínimo que continuará tendo crescimento real, como Lula prometeu na campanha, ainda que em menores proporções (2.5% acima da inflação).
O ‘pacote’ é amplo e traduz, sim, inegável esforço fiscal sem abdicar dos compromissos programáticos do governo. Fortalece os controles maximalistas já adotados que vêm combatendo a sonegação e aumentando a arrecadação. Corta privilégios entre os militares e tenta restabelecer o teto constitucional no serviço público. Aprimora regras do orçamento onde as emendas crescerão abaixo dos limites das regras fiscais com 50% das emendas das comissões sendo direcionadas para o fortalecimento do SUS.
Enfim, setores do mercado não desistem do golpe. Querem manter o Lula, mas com o programa do Bolsonaro ou, talvez, dado o ocaso do bolsonarismo, com a importação do projeto ‘terra arrasada’ de Javier Milei.
Artigo originalmente publicado no jornal O Liberal