Em artigo intitulado Bangladexe e o seu ardente movimento estudantil, Iuri Tonelo celebra a mobilização apoiada pelos EUA e responsável por derrubar o governo de Sheikh Hasina, o que, segundo o autor, seria “um episódio decisivo em meio a uma situação revolucionária no país, com protestos que tiveram o movimento estudantil à frente”. No entanto, a coluna não apresenta uma única menção sobre a relação direta dos EUA com o movimento golpista, nem sequer menciona o problema do imperialismo, o que deveria ser a primeira coisa a ser analisada.
“Exortamos todas as partes a absterem-se de recorrer a mais violência. Perderam-se demasiadas vidas nas últimas semanas, e nós apelamos para a calma e a contenção nos próximos dias”, declarou Matthew Miller, porta-voz do Departamento de Estado em comentário sobre o caso, acrescentando ainda: “saudamos o anúncio de um Governo provisório [grifo nosso] e apelamos para que qualquer transição se efetue nos termos do quadro jurídico do Bangladexe”.
Tonelo ignora as classes sociais em confronto e termina ao lado da principal força reacionária de nossa era histórica. Em sua análise superficial, falhou em reconhecer o papel crucial do imperialismo na derrubada do governo de Sheikh Hasina.
O que ocorreu em Bangladexe foi um golpe da direita, orquestrado para beneficiar os piores inimigos do proletariado e, consequentemente, enfraquecer os povos oprimidos ao redor do mundo. A análise de Tonelo ignora a dinâmica de classe e as forças sociais em jogo, preferindo uma visão simplista que romantiza a mobilização estudantil sem reconhecer suas implicações mais profundas.
A nota do Departamento de Estado não poderia ser mais clara em sua hipocrisia: enquanto apelam para a “calma e a contenção”, apoiam silenciosamente a instalação de um governo provisório alinhado com os interesses norte-americanos.
Também são conhecidos os efeitos das chamadas “revoluções coloridas”, marcadas por forte presença de estudantes de direita e após as quais a derrubada do governo em questão pelas forças apoiadas pelos EUA não trouxeram qualquer avanço, mas um fortalecimento da dominação imperialista na região.
Tonelo simplesmente abandona tudo o que se conhece sobre o tema e falha em reconhecer que a luta contra o imperialismo é central para qualquer movimento revolucionário autêntico.
A luta dos países atrasados contra a ditadura mundial deve ser o ponto de partida para qualquer análise séria sobre mudanças de regime, especialmente quando os golpes ocorrem nas nações oprimidas.
A falha de Tonelo em reconhecer a centralidade do imperialismo na dinâmica global é uma omissão grave que termina criando nas fileiras da esquerda a ilusão de que se há um movimento de estudantes nas ruas, ele é progressista e deve ser apoiado.
Se as forças atuando por trás de uma determinada mobilização forem reacionários e tiver interesses contrários aos do conjunto da classe trabalhadora, não apenas devem ser denunciados como devem ser combatidos.
Para qualquer marxista sério, a luta contra o imperialismo deve ser prioritária. A experiência histórica nos ensina que qualquer movimento que enfraqueça a resistência ao imperialismo, mesmo que pareça progressista na superfície, acaba por fortalecer a opressão global.
Portanto, é crucial que a esquerda recupere uma perspectiva correta sobre a luta de classes e o papel do imperialismo. Devemos denunciar todas as tentativas de manipulação imperialista e apoiar os movimentos e governos que resistem à dominação estrangeira, mesmo que esses não sejam perfeitamente alinhados com nossos ideais.