Eu assisti ao debate entre Biden e Trump. Os relatos da imprensa estão certos: o desempenho do democrata foi constrangedor.
Trump foi Trump. Um mentiroso contumaz. Negou o óbvio, emendou uma mentira atrás da outra. Sempre agressivo ao extremo. Ele não diz que uma medida de seu adversário é equivocada ou mesmo nociva. Diz que é “ridícula, insana e muito estúpida”.
Um valentão de pátio de escola. Idoso, sim, mas cheio de vigor.
Ele está esclerosado, como se dizia antigamente? Difícil saber, já que sempre falou muita asneira. Mas transmite a imagem de que está forte.
Já Biden parece estar à beira da senilidade. Fala enrolada, se atrapalhando em raciocínios simples, incapaz de encontrar as palavras, às vezes não falando coisa com coisa, olhar perdido, abúlico.
Quem via seu semblante durante o debate diria estar diante de um senhor que se perdeu durante a excursão do asilo e não sabe bem onde se encontra.
Alguém há de reclamar de etarismo. Mas a questão não é o número de anos, mais de 80, que ele tem. É a percepção óbvia de seu estado atual.
Lembro que uma vez encontrei Oscar Niemeyer num restaurante. Estava comendo um filé, tomando um vinho, conversando e fumando um charutinho. Já tinha passado dos 90, mas mostrava muito mais vitalidade e agilidade mental do que Biden.
Não vou discutir aqui os projetos que eles representam – Trump é abominável, Biden é muito ruim. A disputa entre eles para ver quem era mais sionista foi de embrulhar o estômago. Mas Biden revelou claramente que não tem as condições físicas e mentais para disputar as eleições ou exercer a presidência.
Ayah Ziyadeh, diretora da organização Americanos pela Justiça na Palestina, escreveu no Twitter: “Quem é o menor dos dois males? Um é abertamente racista, quer nos deportar a todos e pensa que Biden não está sendo genocida o suficiente. O outro mal consegue funcionar, é uma cobra e alimentou conscientemente, política e financeiramente um genocídio literal durante nove meses”.
Agora, muitos democratas estão tentando arranjar uma maneira de substituí-lo. Mas nem é surpresa. Faz tempo que ele está debilitado. O espantoso é que tenham deixado que ele ganhasse as primárias.
Biden resiste, quer ser o candidato. Imagino que vão encenar uma situação para que ele mostre ânimo e frescor. Um estratagema que já foi tentado várias vezes nos últimos meses – e que sempre terminou em fiasco.
Que a disputa esteja entre dois anciões, que não inspiram a confiança do público – e que mesmo assim não haja espaço para se constituir uma terceira via – isso é um sintoma claro de que o sistema político estadunidense está em crise profunda.
Temos que pensar na nossa situação, no Brasil. O candidato natural do campo democrático vai completar 80 anos em 2026.
Lula não é Biden, claro. Está mais ativo, mais inteiro.
Mas, ainda assim, vamos ser honestos: ele não é mais jovem. O Lula da eleição de 2022 não era aquele das disputas anteriores. Estava mais cansado, tinha menos agilidade.
Nos debates, o Lula de 2002 teria jantado Bolsonaro e usado os ossos para palitar os dentes. Em 2022, se embananou com bobagens, perdeu oportunidades óbvias, caiu em esparrelas.
E, ainda mais importante, Biden não é Lula. Não se compara em importância política, em liderança.
Lula – e, com todas as críticas que fiz e faço a ele, nunca deixei de reconhecer isso – é um patrimônio das lutas do povo brasileiro.
Ainda assim, é preocupante que nossa única carta para impedir o retorno da extrema-direita seja um homem de quase 80 anos.
Publicado originalmente no Facebook do autor.