Vanessa Mendonça, liderança da ocupação e militante do Luta Popular, e Israel Luz, de São Paulo (SP)
No dia 11 de agosto, o Ministério Público de Cajamar (SP), se manifestou pela reintegração de posse da Ocupação dos Queixadas. Mais do que nunca, é hora de solidariedade de classe para derrotar a ganância e o autoritarismo dos poderosos.
“Justiça” age com desprezo pelos moradores
Até o começo de agosto, o Ministério Público (MP) ainda não tinha se pronunciado sobre o processo referente à comunidade. Essa etapa é necessária para que um juiz possa decidir (a favor ou contra) a permanência dos trabalhadores e trabalhadoras no local.
Lamentavelmente, o MP se declarou favorável tanto ao despejo quanto ao plano da prefeitura, que não prevê para onde as famílias poderão ir, mencionando apenas abrigos temporários como alternativa. Isso é um crime.
A Ocupação dos Queixadas existe desde 2019 e, hoje, conta com praticamente 100 famílias. Formadas em grande parte por mulheres e crianças negras elas transformaram uma terra ociosa, antes usada somente como lixão, em um bairro vivo, com casas, histórias e laços comunitários.
Por outro lado, como destacado pela nota do Luta Popular, movimento filiado à CSP-Conlutas: “A pessoa que se diz dona do terreno não tem o registro do imóvel no seu nome e, inclusive, entrou com uma ação de usucapião, em 2016, para tentar passar o título para o nome dela”.
O modo como os dois lados desta história são tratados revela uma “justiça” que escolheu o lado dos ricos e da especulação imobiliária.
O capitalismo rouba a casa das pessoas
Ninguém acorda um dia e resolve ocupar terrenos, sem infraestrutura, para levantar a própria casa. Essa decisão é imposta pela negação do direito à moradia digna. Se você duvida preste atenção no exemplo que damos a seguir.
São Paulo é uma das 25 maiores cidades do planeta. Atingiu esse patamar expulsando trabalhadores das áreas mais estruturadas para as periferias. Hoje em dia, de todas as capitais do Brasil, é na capital paulista onde mais faltam moradias adequadas.
Cajamar é parte da Grande São Paulo e um dos municípios mais ricos do estado. Empresas como a Amazon e a Mercado Livre possuem galpões gigantescos, lucram milhões e garantem uma grande arrecadação para a prefeitura.
“Seria possível desapropriar o terreno, indenizar a proprietária e reverter a terra para as famílias, por meio de um projeto de regularização do bairro”, também mostrou o Luta Popular.
Em outras palavras: a solução justa é simples. Mas o prefeito, morador de um condomínio de luxo, que nem fica em Cajamar, não pensa assim.
Prefeito ainda não assinou documento
Kauãn Berto é do Partido Social Democrata (PSD), o mesmo de Gilberto Kassab. Como prefeito, tem competência legal para executar políticas públicas de habitação de interesse social e regularização de comunidades de baixa renda.
Sabendo disso, os moradores conseguiram uma vitória importante junto ao governo do estado, que abriu a possibilidade de incluir a Ocupação dos Queixadas em um programa habitacional. Para isso acontecer, bastava uma assinatura do prefeito num ofício.
Por isso nos últimos meses, o Luta Popular e diversos movimentos e personalidades vêm insistindo: “Pra não despejar, só falta o Kauãn assinar”. No entanto, isso não aconteceu até agora, mesmo com várias tentativas de diálogo por parte do movimento.
Na ocasião mais recente, em 16 de agosto, uma comissão de mulheres da Ocupação buscou falar com ele, em uma caminhada contra violência de gênero. Ao ser questionado por uma moradora que está há 10 anos na cidade, o prefeito perguntou de qual cidade ela tinha vindo até chegar ao Queixadas. Ao ouvir a resposta, inacreditavelmente, ele ofereceu transporte de volta.
Mas, Kauãn ainda fez pior. Tentou constranger a mulherada lutadora dizendo ao microfone: “Respeitem as mulheres…”. Ao que responderam: “E nós? Não somos mulheres?”.
Queixadas fica!
Nossa humanidade, a gente afirma na luta
A pergunta das mulheres tocou em uma questão central. Os poderosos não veem o povo trabalhador como gente igual a eles. Só isso explica a completa falta de sentido da fala do prefeito.
Os trabalhadores e trabalhadoras da periferia, especialmente negros e descendentes de indígenas, são tratados como um “problema” a ser eliminado. Há séculos.
Não importa que a cidade tenha recursos para dar moradia a todo mundo. A opção é expulsar, pura e simplesmente, para o mais longe possível, como prova a “sugestão” da administração de levar os pertences dos moradores para a Ocupação Esperança, que fica em outra cidade.
Nossa humanidade, a gente afirma na luta. E, por isso, é hora de intensificar a batalha para garantir a permanência da ocupação. Não ao despejo! Casa é pra morar e não pra lucrar! Queixadas fica!