O Senado aprovou recentemente a proposta que trata da renegociação das dívidas dos estados com a União, e agora seguirá para aprovação na Câmara dos Deputados. O PLP (Projeto de Lei Complementar) 121/2024 cria o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos estados – Propag – que autoriza desconto nos juros e prazo de 30 anos para pagar, além da possibilidade dos estados transferirem parte dos seus ativos para a União.
O grande problema é que o programa sacramenta o atual estoque da dívida dos estados, embrulhando todas as ilegalidades e ilegitimidades acumuladas ao longo de diversas décadas, além de propor a securitização, danoso esquema que desvia arrecadação tributária e outras receitas públicas por fora do orçamento. Ademais, esse projeto reproduz, no âmbito dos estados, as restrições do arcabouço fiscal, que privilegia o pagamento dos gastos com a chamada dívida pública.
A Ação Cível Originária (ACO) 2059, da OAB-RS, e que tem mais de 50 entidades apoiadoras que cobram a extinção da dívida do estado com o Tesouro, continua parada no Supremo Tribunal Federal (STF), sob relatoria de Luiz Fux. Já houve várias audiências, mas o processo não anda.
Com o decreto de calamidade pública no estado, em função das enchentes, a questão da dívida pública do Rio Grande do Sul com a União voltou ao debate. No início deste mês houve o relançamento da campanha “A Conta Está Paga”.
Este tema é muito importante pois 91% da dívida do estado é com a União. Os acordos firmados logo após a edição da Lei 9.496/97 previam condições financeiras extremamente danosas: juros nominais equivalentes ao IGP-DI acrescido de juros reais de 6 a 7,5%.
Tais condições provocaram o crescimento exponencial dessa dívida, apesar dos pagamentos realizados religiosamente pelos estados à União. O estado já pagou quase três vezes o valor refinanciado. Mas segundo o Tesouro Nacional o estado ainda deve quase nove vezes o montante refinanciado. Se somarmos todos os valores pagos, corrigirmos monetariamente pelo índice oficial de inflação, que é o IPCA, sem os juros do contrato, a dívida do RS estaria quitada desde maio de 2013. E por que a campanha #EstaContaEstáPaga defende retirar os juros do contrato? Porque essa relação entre a União e os estados deveria ser uma relação de parceria, de auxílio, e não de imposição de um contrato gravoso ao estado, que é o que aconteceu lá em 1998.
O senso comum e a mídia tradicional afirmam que a evolução da dívida do estado é uma responsabilidade do estado, por ter gasto além das suas possibilidades. No período de 1994 a 1998, a dívida mais que dobrou o seu montante. Isso por conta das elevadíssimas taxas de juros do Governo Federal nesse período, que foram os primeiros quatro anos de implantação do Plano Real. O Governo Federal usou e abusou da taxa básica de juro como forma de controlar a inflação, e isso levou a um crescimento brutal das dívidas dos entes subnacionais. Ou seja, a responsabilidade por esse endividamento brutal não é dos estados, é da União, e, portanto, se justifica menos ainda a cobrança dos juros.
Como afirma Maria Lucia Fattorelli, coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, essa perpetuação de danos precisa ser interrompida, e não novamente sacramentada por meio do PLP 121/2024, sendo imprescindível prever a possibilidade de revisão do estoque efetivamente existente conforme apurado, fundamentado e comprovado em procedimentos de auditoria integral, com participação social.
Josué Martins , Auditor Tribunal de Contas do RS, que faz parte da campanha, afirma que a questão da dívida pública não é apenas uma questão técnica ou uma questão econômica, é uma questão também política.
O PSTU concorda com Josué Martins. Por isto, no programa – já registrado no TRE – da candidatura de Fabiana Sanguiné à Prefeitura de Porto Alegre, este tema tem grande relevância, pois não há como prometer resolver quaisquer um dos problemas mais sentidos pela população sem acabar com a maior sangria, que é a dívida pública.