Protagonista de um dos primeiros e mais emblemáticos casos da Lava Jato, o doleiro Alberto Youssef está novamente no centro de um episódio potencialmente explosivo e com implicações sobre diversas outras investigações da operação.
A nova polêmica decorre de um acontecimento de 2014: o famigerado grampo ilegal na cela onde Youssef esteve preso. Após uma longa batalha judicial, a defesa teve acesso aos áudios nesta quarta-feira.
Coube ao juiz Guilherme Roman Borges, substituto na 13ª Vara Federal de Curitiba, decidir no início de julho que Youssef tem direito de conferir o resultado das escutas clandestinas.
Em sua breve passagem pela 13ª Vara, no ano passado, o juiz Eduardo Appio já havia requisitado as gravações à Polícia Federal. Persistia, porém, uma dúvida central: o local de armazenamento do HD com os grampos. Estava com a PF? Com o Ministério Público Federal?
Somente depois de o Conselho Nacional de Justiça cobrar respostas e Roman Borges determinar o acesso de Youssef aos áudios é que os advogados do doleiro descobriram que o conteúdo estava na própria 13ª Vara.
Agora, estão em posse da defesa mais de 200 horas de gravação, espalhadas por 64 arquivos. Outra surpresa dos advogados, porém, é o fato de que aparentemente 26 arquivos foram apagados. Eles terão de analisar todo o material e executar uma perícia para entender se esses áudios estão de fato perdidos ou se foram recuperados.
A defesa também levará as novas informações ao Supremo Tribunal Federal e ao CNJ, a fim de fortalecer petições de Youssef que já estão em tramitação.
A tendência é que, ao menos neste momento, Alberto Youssef aja com cautela. Ele tem a opção de lutar na Justiça para anular sua delação premiada, embora isso possa resultar na perda dos benefícios do acordo. Uma alternativa intermediária seria usar as gravações clandestinas para tentar anular algumas de suas condenações.
Esse “xadrez jurídico”, entretanto, não afeta apenas o doleiro; interessa a todos os envolvidos em sua delação. Qualquer decisão sobre o caso Youssef terá implicações simbólicas e práticas para diversos personagens.
A defesa no processo do grampo cabe ao advogado Gustavo Rodrigues Flores.
A CartaCapital, o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, enfatiza que já eram conhecidos dois aspectos graves sobre as escutas na cela de Youssef: a própria gravação ilegal e a subsequente tentativa de acobertá-la, motivada pelo medo de que o escândalo pudesse levar à anulação da operação Lava Jato.
Agora vem a notícia de que parte dos áudios foi apagada, o que é mais grave ainda, é uma obstrução de Justiça óbvia.
Ele defende uma investigação específica que alcance o ex-juiz Sergio Moro (titular da 13ª Vara à época do grampo) e os procuradores da Lava Jato, em especial Deltan Dallagnol.
Não é possível que essa instrumentalização por parte do Poder Judiciário, do Ministério Público e de delegados federais possa não ser investigada e punida exemplarmente.
Um laudo da Corregedoria da PF atesta que a gravação ilegal funcionou em março de 2014. Na cela onde o equipamento estava instalado havia outros quatro presos da Lava Jato: Luccas Pace, Carlos Rocha, André Catão e Carlos Alberto Pereira da Costa.
A apuração interna conduzida pela corporação nos meses seguintes concluiu que “restou comprovada a existência de indícios” da instalação do equipamento de interceptação ambiental.
Segundo o relatório, o conjunto de áudios demonstra que o equipamento foi utilizado “por pelo menos 12 dias (…) em cela da custódia da SR/DPF/PR, em época compatível com a primeira fase da Operação Lava Jato, quando foi preso, entre outros, o doleiro Alberto Youssef”.