Conservadorismo, etapa superior do bolsonarismo

por Luís Carlos Silva

Nas eleições municipais deste ano, o nome mais comentado até aqui, sem sombra de dúvidas, é o de Paulo Marçal, candidato à prefeitura de São Paulo. Não é exagero dizer que o coach e empresário conseguiu sequestrar a agenda pública nacional. Fala-se nele nos mais variados meios. Falsas acusações a adversários, suspensão de perfis nas redes sociais e suspeitas de ligações com o crime organizado estão entre as questões debatidas.

A princípio, parecia que Marçal buscava visibilidade na atual eleição de olho no pleito de 2026 (disputar uma vaga no senado; talvez a presidência da República). No entanto, o crescimento nas pesquisas (infelizmente) o credencia como candidato forte para a prefeitura paulista.

Marçal conseguiu aquilo que direita tradicional e grande imprensa já tentam há alguns anos: ameaçar a hegemonia de Bolsonaro no campo conservador brasileiro. O que não é pouco, haja vista que o “gado” parecia lobotomizado no culto ao “mito”.

Não por acaso, Marçal tem sido atacado por grande imprensa e membros do clã Bolsonaro. Trata-se da típica ocasião em que “torcemos para a briga”.

Por falar nisso, se Bolsonaro já era um mergulho profundo no lamaçal da extrema direita, o coach candidato a prefeito de São Paulo dobrou a aposta.

Diferentemente do inelegível, que vegetou durante décadas no Legislativo, Marçal é realmente um outsider na política. Não respeita regra alguma do jogo. Elevou a ideia de tumultuar uma campanha eleitoral a patamares jamais imaginados.

Enquanto Bolsonaro se tornou conhecido do grande público a partir de declarações esdrúxulas em programas televisivos popularescos; Marçal foi forjado exclusivamente na internet (o terreno privilegiado das fake news). Cada polêmica, distracionismo e bate-boca que ele protagoniza com algum adversário parece ser estrategicamente pensado para gerar cortes nas redes sociais e, consequentemente, engajamento digital.

Já em relação ao slogan da extrema direita, “conservador nos costumes e liberal na economia”, o coach está muito além do ex-presidente. De fato, ambos compartilham as características do conservadorismo, como a paranoia de ameaça comunista, a misoginia e a (suposta) defesa da tradicional família cristã brasileira.

Porém, enquanto o ex-presidente se fez exclusivamente no setor público (se vendendo como “neoliberal” somente para obter apoio do grande capital e ganhar a eleição de 2018); Marçal, por sua vez, é um típico representante do capitalismo selvagem e da racionalidade neoliberal: o (suposto) self-made man.

De acordo com matéria no Portal Terra, como “coach” e “empresário”, Marçal tem em seu currículo a tentativa de operar um milagre em público (fazer uma mulher em cadeira de rodas voltar a andar) e a venda de palestras e infoprodutos de autoajuda, com títulos sobre “como tomar o governo da sua própria vida” e “como fazer pelo menos 6 mil por mês do zero”.

Portanto, Marçal representa o “combo completo” do conservadorismo brasileiro: anticomunista, messiânico, armamentista e adepto ao discurso da meritocracia (na teoria e na prática).

Não é exagero apontar que ele é mais bolsonarista do que o próprio Jair Bolsonaro. Melhor dizendo, parafraseando Lenin, o marçalismo é a etapa superior do bolsonarismo. Na extrema direita brasileira nada é tão ruim que não possa piorar.

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Luís Carlos Silva é doutor em Geografia pela Unicamp.

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Última Atualização: 28/08/2024