Henri Charrière, morto aos 88 anos, no domingo 18, em sua casa, em Douchy-Montcorbon, na França, foi, ao longo de muitos anos, um símbolo forte do cinema francês para o mundo. E foi também um símbolo incontornável do padrão de beleza masculina nos anos 1960 e 1970.
Em um post nas redes sociais, o presidente Emmanuel Macron saudou-o como “mais que uma estrela, um monumento francês”. Não chega a ser um exagero.
Os dois primeiros papéis a alçá-lo a esse status foram interpretados em filmes de 1960: Rocco e Seus Irmãos, dirigido pelo italiano Luchino Visconti, no qual vivia um boxeador atormentado, e O Sol Por Testemunha, do francês René Clément, em que deu vida a Tom Ripley, o famoso personagem criado pela romancista Patricia Highsmith.
Embora tenha tido uma forte e profunda relação com os realizadores franceses – foi dirigido por Louis Malle, Bertrand Blier e, pós-Nouvelle Vague, Jean-Luc Godard –, foi também sob a batuta de Visconti que se tornou famoso no mercado norte-americano, com O Leopardo (1963), filme no qual dividia a cena com o ator Burt Lancaster.
A conquista da América e do mundo ganharia novo impulso poucos anos depois, com O Samurai (1967), de Jean-Pierre Melville, no qual vivia Jef Costello, um assassino de aluguel representativo de um tipo de gângster que Delon encarnaria muitas outras vezes, tanto no cinema francês quanto nos filmes rodados no Reino Unido e em Hollywood.
Embora sua beleza caísse como luva nos papéis de galã, o ator dizia não se sentir totalmente à vontade nesse lugar. Ficou famosa sua declaração à revista britânica Film and Filming, nos anos 1960, de que, no set, preferia lutar a fazer cenas de amor e beijos românticos.
Delon nasceu em 1935, numa família de boa condição financeira, e cresceu com pais separados. Na escola, tinha problemas de disciplina e, na tenra juventude, entrou para a Marinha francesa, da qual acabou expulso. Seu destino seria retorcido ao ser descoberto, em uma passagem aleatória pelo festival de Cannes acompanhando uma amiga, pelo lendário produtor David O. Selznick.
O ator teve vários casamentos e deixou três filhos que, nos anos recentes, apareceram na mídia em razão de uma batalha jurídica em torno de seu tratamento após a deterioração de sua saúde.
Os últimos filmes de que participou, em 2012 e 2019, foram comédias nunca lançadas no Brasil, nas quais vivia a si mesmo.
Publicado na edição n° 1325 de CartaCapital, em 28 de agosto de 2024.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘O galã que gostava de viver gângsters’