A democracia enfrenta desafios crescentes com o avanço da tecnologia. Um dos mais relevantes é a desinformação em massa, que compromete o debate público. Mas os impactos não param aí: a liberdade de imprensa e a pluralidade — pilares de uma democracia saudável — também estão em risco.

O crescimento das grandes empresas de tecnologia transformou profundamente a produção e o consumo de notícias, concentrando receitas publicitárias e pressionando os modelos tradicionais de financiamento do jornalismo. Nesse contexto, a regulação da remuneração de conteúdo jornalístico por plataformas digitais tem ganhado destaque no debate público, tanto no Brasil quanto no exterior, em meio a transformações estruturais do mercado de mídia.

No Brasil, o Projeto de Lei nº 1354/2021 propõe que plataformas digitais sejam obrigadas a remunerar veículos jornalísticos. O argumento central é corrigir distorções do mercado e fortalecer a sustentabilidade do setor.

A proposta parte da constatação de que há uma forte concentração da publicidade digital nas ‘big techs’, gerando um ambiente oligopolizado que compromete a viabilidade econômica da imprensa tradicional. O projeto buscaria, assim, estabelecer um modelo mais equilibrado de distribuição de receitas.

Críticos, no entanto, alertam para alguns riscos. A medida pode restringir a circulação de informações e favorecer grandes conglomerados de mídia, dificultando a atuação de veículos independentes e novos entrantes no mercado. Também se questiona se a medida realmente aumentaria a diversidade midiática ou apenas aprofundaria a dependência do jornalismo tradicional de fontes indiretas de financiamento, sem fomentar inovação no setor.

Também há ainda dúvidas sobre os critérios de remuneração propostos, que poderiam violar princípios de isonomia e livre concorrência, ao favorecer desproporcionalmente grandes empresas em detrimento das pequenas. Defensores do projeto afirmam que ele respeita a proporcionalidade entre os diferentes perfis de veículos.

Segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), a maioria dos vínculos empregatícios no jornalismo está concentrada nas capitais, especialmente no eixo Rio-São Paulo-Brasília. O projeto, ao privilegiar grandes veículos, pode aprofundar esse desequilíbrio, agravando os chamados desertos informacionais — regiões sem imprensa local ou independente.

Experiências internacionais indicam que regulações similares podem ter efeitos colaterais. Na Austrália, a legislação favoreceu grandes empresas, com pouca transparência. Na França e no Canadá, conflitos com as plataformas resultaram no bloqueio de notícias, restringindo o acesso à informação.

Sem um planejamento cuidadoso, a regulação pode acentuar desigualdades no setor. O mercado brasileiro já é concentrado, e o PL 1354/2021, como está, tende a beneficiar os grandes veículos, limitando o crescimento do jornalismo nas periferias e em municípios menores.

Propostas que adotem critérios mais justos — que considerem não apenas o tamanho do veículo, mas seu papel informativo e comunitário — já representam um avanço. Além disso, como toda regulação no campo das mídias sociais e do jornalismo, é essencial que o processo seja construído em diálogo contínuo com a sociedade civil, incluindo tanto grandes quanto pequenos veículos. Só com um debate amplo e inclusivo será possível garantir que a regulação das plataformas digitais fortaleça a liberdade de expressão, a imprensa livre e a pluralidade — fundamentos de uma democracia plena.

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Last Update: 30/04/2025