Após governadores de oposição argumentarem que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública, apresentada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), interferiria na autonomia dos estados, um novo texto foi anunciado nesta quarta-feira (15). Parte das observações levantadas foi incluída e, no essencial, fica explícito que a União não avança sobre as atribuições dos demais entes federados.
De acordo com o ministro Ricardo Lewandowski, as alterações na PEC se fazem necessárias devido às novas características da criminalidade. “A natureza do crime mudou. Ele não é mais local, ele não é nem mais nacional ou transnacional. Ele é internacional, o crime se internacionalizou. Então, é preciso que nós repensemos o modelo de segurança pública que foi cogitado pelos constituintes de 1988”, declarou, ao comunicar a nova proposta.
Ainda segundo o ministro, foi acolhida a “parte mais substantiva das preocupações dos governadores e, em certa medida, dos prefeitos. A maior delas foi a suposta perda de autonomia dos governadores no que diz respeito ao comando das polícias civis, militares e dos corpos de bombeiros militares”.
Com a PEC da Segurança Pública, a atribuição de polícia ostensiva — que cabe às polícias militares — será estendida também à Polícia Rodoviária Federal (PRF), que passará a fazer esse tipo de policiamento em rodovias, ferrovias e hidrovias federais e se chamará Polícia Viária Federal.
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O ministro explicou que, “para garantir realmente que a União não tem nenhum interesse na gestão das polícias locais, nós estamos escrevendo aqui, com todas as letras, que esta competência ou essas competências atribuídas à União não restringirão a subordinação das polícias militares, civis e penais e a dos corpos de bombeiros militares aos governadores dos estados e do Distrito Federal”.
O trecho em questão diz que essas novas atribuições concedidas à União “não excluem as competências comum e concorrente dos demais entes federados”, “nem restringem a subordinação das polícias militares, civis e penais e a dos corpos de bombeiros militares aos governadores dos estados e do Distrito Federal”.
Quanto às mudanças na PRF, foi colocado no anteprojeto que a corporação, “no desempenho de suas atribuições, não exercerá funções próprias das polícias judiciárias nem procederá à apuração de infrações penais, cuja competência é exclusiva da Polícia Federal e das polícias civis”.
Além disso, a PEC amplia o escopo de trabalho da PF, que passará a atuar também em relação aos crimes ambientais e contra práticas cometidas por organizações criminosas e milícias privadas que tenham repercussão interestadual ou internacional e exijam repressão uniforme.
Outras alterações
Os fundos de Segurança Pública (FNSP) e Penitenciário (Funpen), que pela proposta original, além de incluídos na Constituição, seriam também unificados, foi outro ponto que sofreu alterações após reivindicação dos governadores.
Na nova redação, esses fundos continuarão separados, deixando claro que os recursos “serão compartilhados entre todos os integrantes da Federação, na forma da lei, vedado o seu contingenciamento”.
Lewandowski acolheu, ainda, a sugestão para que representantes da sociedade civil também fossem incluídos no Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social.
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Como resultado, a PEC passa a sugerir que a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social — que compreenderá o sistema penitenciário — seja estabelecida “ouvindo o Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social, integrado por representantes da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e da sociedade civil, na forma da lei”.
O novo texto também propõe que os órgãos de correição — as corregedorias e ouvidorias —, cuja a incumbência é apurar a responsabilidade funcional dos profissionais de segurança pública e defesa social, serão dotados de autonomia.
Além disso, prevê a instituição de ouvidorias públicas igualmente autônomas, nos três níveis da Federação, para receber representações, elogios e sugestões sobre as atividades desses servidores.
Análise pelo Congresso
De acordo com o MJSP, ainda não há previsão de quando a PEC será enviada para apreciação pelo Congresso Nacional. No entanto, Lewandowski sinalizou esperar que a matéria possa ser discutida com os parlamentares ainda no primeiro semestre deste ano, para evitar que acabe ficando para 2026 e sendo contaminado pelo contexto da disputa eleitoral.
Por se tratar de uma Proposta de Emenda à Constituição, o texto passará por dois turnos de votação na Câmara e no Senado, sendo preciso o voto de ao menos 308 deputados e 49 senadores.
A primeira versão do texto foi apresentada em outubro para a discussão junto aos governadores, o que foi feito num total de cinco reuniões. “As discussões foram de altíssimo nível, em que pudemos falar livremente e ouvimos o que os governadores quiseram externar”, declarou o ministro sobre o processo.