Wagner Gomes 

Não sei se é Brasília que envelhece mal ou se sou eu que envelheço lúcido. Ou, sabe-se lá, estamos todos vivendo “no sistema de quase-doidos” (nas palavras de Guimarães Rosa), única forma de resistir – a conclusão é minha. Se Brasília fosse uma escola, já teria sido reprovada por cola reincidente. Agora, tenta passar de ano rebatizando o que não pretende mudar. Depois da implosão do chamado “orçamento secreto” — aquele esquema de distribuição bilionária de emendas por baixo da mesa e para dentro de bolsos indevidos — o Congresso sancionou uma reencarnação mais cínica que criativa: o “repasse estruturado com critérios técnicos”. Agora é sofisticado, com grife, parecer jurídico e selo ESG. Em bom português: tudo como antes, só que com Excel. A Comissão Mista de Orçamento discutiu e aprovou, com ar grave e linguagem barroca, como retomar a farra das verbas sem chamar de farra. Trocou-se o nome, manteve-se o vício. A República da semântica segue viva. O governo pisca, o Centrão cobra, e o contribuinte — sempre ele — paga a conta, dessa vez com recibo timbrado. O jogo é tão bem montado que, nas eleições, a renovação vira miragem. É o único campeonato em que os donos do VAR jogam, apitam e ainda cobram o ingresso. O Congresso, além de comprar o mapa da mina, também botou porteiro na entrada. E não aceita PIX de estreante. A nova versão do orçamento secreto promete transparência. Só não diz onde, nem para quem. Porque, em Brasília, o sigilo é sempre uma questão de narrativa. É secreto até virar escândalo. Depois, é técnico. Enquanto isso, a saúde pública corta remédios, a educação coleciona promessas, e o bom senso, esse sim, segue com orçamento negativo desde 1988. O único repasse que não falha é o da paciência do brasileiro para a conta bancária dos articuladores de plantão. Como diria o Barão de Itararé, “o Brasil é o país onde os sábios perdem o juízo e os idiotas ganham poder de emenda”. E o povo? O povo acompanha tudo de longe, como quem assiste a uma peça ruim: já sabe o final, mas não consegue sair no meio. Muito menos, pedir o dinheiro de volta. Brasília virou uma espécie de Hogwarts da hipocrisia: todo mundo finge acreditar na mágica enquanto o cofre some. A base governista aplaude como quem recebe Pix. E a oposição grita, mas já com o CPF no balcão. E nos botecos, onde ainda se fala a verdade, constata-se que Brasília não precisa de reforma política. Precisa de dedetização. (Foto/reprodução internet)

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Last Update: 05/05/2025