Donald Trump retorna à Casa Branca aplicando o que prometeu na campanha: desestimular a participação dos Estados Unidos no debate global sobre mudanças climáticas e fomentar o uso de combustíveis fósseis. “Perfurar, perfurar”, bradou, ao defender a extração de petróleo, símbolo maior da prosperidade norte-americana no século XX.

A repercussão foi imediata. Trump retirou os EUA do Acordo de Paris, afastou funcionários da Agência de Proteção Ambiental (EPA), reduziu a equipe da Divisão de Meio Ambiente e Recursos Naturais do Departamento de Justiça e, sem freios internos, derrubou dezenas de iniciativas climáticas e de energia limpa criadas por seu antecessor Joe Biden.

A crise climática, no entanto, é de tal magnitude que decisões aparentemente locais ou burocráticas podem ter impactos globais imediatos e relevantes. Além disso, a guinada de Trump reconfigura o papel dos grandes atores internacionais no debate climático.

Essa mudança de rota abriria caminho para que a China, maior rival no radar do republicano, assumisse a liderança da agenda climática? Ainda é cedo para dizer com certeza, mas os primeiros movimentos geopolíticos sinalizam o interesse de Pequim em preencher o vácuo deixado pelos EUA.

Quem vai conduzir o debate sobre as mudanças climáticas?

CartaCapital ouviu especialistas sobre os efeitos do negacionismo de Trump e o potencial papel da China como nova líder do debate climático. Isis Paris Maia, professora do grupo GeChina da Universidade de Brasília e especialista em políticas públicas e governança chinesa, aponta que essa possível transição de protagonismo pode ser consequência direta do cenário atual.

“Onde os EUA não se apresentam como líderes, a China assume o espaço”, explica. “O desenvolvimento econômico gera contradições, mas o ponto é como o país lida com elas. Trump preferiu negar. Já a China reconhece a contradição e busca soluções. Hoje, o país detém 80% do mercado global de energia solar.”

Para Samuel Spellmann, coordenador da especialização em China Contemporânea da PUC-MG, “mesmo antes da gestão Trump, os Estados Unidos já demonstravam falhas na resposta às mudanças climáticas”.

“Se a China hoje se coloca como líder, isso não era verdade há alguns anos”, ressalta. Esse avanço reflete o próprio custo do desenvolvimento chinês, historicamente apoiado no uso intensivo de carvão.

Ainda assim, o país traçou metas audaciosas. A China deseja zerar as emissões líquidas de carbono até 2060 e vem investindo em energias renováveis e na produção de veículos elétricos. Além disso, cresce a exportação em larga escala de painéis solares.

Brasil realiza COP30 em momento estratégico

Os desdobramentos das ações de EUA e China na pauta ambiental são acompanhados de perto por nações como o Brasil, que receberá a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, a COP-30, em novembro, em Belém (PA).

Há o risco de o evento perder força, especialmente diante da nova postura dos norte-americanos. Ainda assim, encontros desse porte costumam gerar oportunidades para acordos bilaterais. “Quando Trump implode relações internacionais, empurra os demais países a concretizarem esses entendimentos por conta própria”, avalia Isis Maia.

Spellmann acredita que esse cenário favorece “a construção de uma pauta climática mais ampla”, embora exija forte articulação diplomática. “Há interesses de mercados específicos, como o de carbono, envolvidos na COP, e isso certamente estará sobre a mesa.”

Assista à íntegra da entrevista:

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Last Update: 08/02/2025