Não haverá recuo em direção a reduções nas normas de remuneração mínima, complemento salarial e benefício de prestação continuada

Por Adilson Araújo, presidente da CTB

Embora o pacote fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresente algumas medidas positivas, ele também contém retrocessos inaceitáveis para a classe trabalhadora.

O governo propõe isenção do Imposto de Renda para os assalariados que recebem até R$ 5 mil reais, compensando a queda consequente de receita com o aumento da tributação de quem ganha mais de R$ 50 mil. Iniciativa justa, que corresponde a um compromisso de campanha e tem o apoio da CTB e da classe trabalhadora.

Luta pela distribuição da renda

No entanto, o pacote limita o índice de valorização do salário mínimo, reduz o universo dos beneficiários do abono salarial aos que recebem até 1,5 salário mínimo e também do Benefício de Prestação Continuada. Ou seja, tira recursos dos mais pobres para agradar os grandes capitalistas.

Convém considerar que a política de valorização do salário mínimo é estratégica para uma política que busca a distribuição mais justa da renda nacional, que aí fim e ao cabo é produzida pela classe trabalhadora.

O valor do salário mínimo vigente ainda está situado muito abaixo do mínimo necessário para a sobrevivência de um assalariado com família de quatro membros, conforme determina a Constituição Brasileira.

De acordo com cálculos do Dieese, o valor do salário mínimo necessário para satisfazer os preceitos constitucionais subiu a R$ 6769,87, 4,9 vezes maior que o piso nacional pago hoje, de R$ 1412,00.

A mudança na regra sepulta a previsibilidade do tão desejado salário mínimo, calculado mensalmente pelo Dieese. É uma medida indigesta. Não dá para engolir.

Por esta e outras razões, o retrocesso proposto na política de valorização do salário mínimo é inaceitável. O mesmo se pode dizer em relação às restrições ao acesso ao abono salarial e BPC.

É preciso acrescentar que, longe de constituir uma ameaça à economia, as políticas de redistribuição da renda a favor dos mais pobres são companheiras do crescimento do PIB e parcerias do desenvolvimento nacional.

Ajuste pode aumentar desigualdade

Conforme alerta estudo do Made (Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades) da USP (Universidade de São Paulo), a limitação do ganho real do salário mínimo às regras de crescimento do novo arcabouço fiscal terá impacto negativo na distribuição de renda e aumentará a desigualdade no Brasil, na contramão dos compromissos assumidos pelo governo Lula.

Mas, o “mercado” ainda não está satisfeito com os cortes propostos por Haddad e ficou irritado com a proposta de aumento da faixa de isenção do imposto de renda e aumento da tributação dos mais ricos. Reverberando os interesses dos grandes capitalistas, que dão a voz do mercado, a mídia burguesa desencadeou uma campanha terrorista por cortes mais profundos na carne do povo.

Os riscos de retrocesso não advém apenas nem principalmente das concessões do governo à pressão dos ricos e poderosos, que ao ditar as regras de funcionamento do sistema capitalista e distribuição do orçamento exacerbam as contradições de classes e as desigualdades sociais.

Políticos de direita e extrema direita, majoritários no Congresso Nacional, estão dando curso a uma agenda extremamente hostil à classe trabalhadora. É o que transparece na proposta de emenda constitucional que vem sendo urdida pelo deputado Pedro Paulo (PSD/RJ) em contraposição ao projeto do governo federal.

Arrocho do salário mínimo

A PEC do parlamentar carioca vai bem além da proposta governamental, pois simplesmente põe fim à Política de Valorização do Salário-Mínimo, que passaria a ser corrigida apenas pela inflação entre 2026 e 2031.

Além disto, a partir de 2032, o salário-mínimo não poderia ser reajustado acima do limite do arcabouço fiscal, o que pode significar reajustes abaixo da inflação e, consequentemente, queda do valor real ou, em outras palavras, arrocho do salário mínimo.

O Abono Salarial não seria mais atribuído ao trabalhador ou trabalhadora que recebe até 2 salários-mínimos. O benefício seria destinado apenas a quem recebe até 1 salário-mínimo.

A proposta ainda prevê que os investimentos constitucionais em saúde e educação seriam desconstitucionalizados, devendo ser tratados por Lei Complementar.

A PEC do parlamentar joga exclusivamente sobre as costas da classe trabalhadora o ônus de um ajuste fiscal ainda mais duro e perverso, moldado de acordo com os interesses e as pressões do “mercado”.

Ricos devem arcar com o ônus

A verdade é que o país não está na iminência de uma crise fiscal, como os meios de comunicação controlados pela burguesia alardeiam. Além disso, é preciso reiterar o fato óbvio olvidado pela direita de que a grande causa do déficit e da dívida pública reside no pagamento de juros, que consomem cerca de 50% do Orçamento da União.

Não é a inclusão dos pobres no orçamento, mas a apropriação do orçamento pelos rentistas que provoca o desequilíbrio entre receitas e despesas públicas, elevando o peso do déficit e da dívida pública, que cresce como uma bola de neve sob o peso dos juros compostos.

Mas, não se fala em reestruturar o pagamento da dívida e reduzir substancialmente as taxas de juros porque os interesses de um grupo muito restrito de banqueiros e bilionários rentistas é considerado sagrado e “imexível”. É um tema e um debate interditados na grande mídia, que produz e reproduz diuturnamente o pensamento único neoliberal.

A CTB, as centrais e o conjunto dos movimentos sociais, que representam os interesses da classe trabalhadora e do povo brasileiro, não devem ficar passivos.

É imperioso conscientizar e mobilizar as bases para reagir à ofensiva reacionária, derrotar a agenda pevertida da direita e extrema direita no Parlamento e preservar e ampliar as conquistas sociais que configuram a inclusão dos mais pobres no orçamento.

Devemos lutar para que os ricos paguem a conta do ajuste fiscal que julgam indispensável, o que pode ser viabilizado com a taxação das grandes fortunas, bem como dos dividendos apropriados por rentistas improdutivos e das remessas de lucros ao exterior e o fim, ou ao menos, uma rigorosa revisão das desonerações e renúncias fiscais gozadas pelo empresariado sem nenhuma recompensa à nação.

Vai ter luta. Não vamos admitir retrocessos.

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