No artigo A política cede lugar ao Supremo, publicado pelo jornal golpista Folha de S.Paulo, a articulista Dora Kramer procura justificar a intervenção cada vez maior do Supremo Tribunal Federal (STF) no regime como o resultado da incapacidade política dos “políticos”.

Diz ela:

“Situações muito mais complicadas que a agora posta no Supremo Tribunal Federal para decidir sobre a constitucionalidade de ações do Executivo e do Legislativo já foram resolvidas no país pela via da política.”

Sim, é fato. Até aí, não há novidade. Corre, por exemplo, no STF, um julgamento para decidir como as emendas parlamentares deveriam ser utilizadas — algo que, naturalmente, deveria ser resolvido pelo próprio Congresso Nacional. Também corre no Supremo julgamentos que podem resultar na cassação de mandatos — o que, ainda que não devesse acontecer em um regime democrático, deveria ser discutido no Congresso, e não pelo Judiciário.

A questão é: qual a causa disso? Por que o Legislativo não pode discutir as suas próprias questões e “necessita” — será que necessita? — ser tutelado pelo STF?

“Na decisão sobre um decreto presidencial derrubado pelo Congresso, caberia ao STF dizer quem está certo à luz da Carta de 1988 e nada mais. Sairia com a razão aquele que tivesse atuado na conformidade da lei. Como disse o ministro Flávio Dino, uma demanda jurídica a ser resolvida “em cinco minutos”. Talvez um pouco mais, dada a complexidade do tema. A questão, no entanto, é de natureza política, conforme acrescentou o magistrado do alto de sua experiência nas duas searas. A audiência de conciliação convocada pelo relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, parece, em tese, uma boa solução e assim foi recebida pelas partes. Na prática, porém, expõe a incapacidade dos políticos em exercerem sua atividade fim: a de construir consensos em meio ao dissenso.”

A obrigação dos políticos não é “construir consensos”. A obrigação do Congresso é discutir as leis do País; a do Executivo, governar. Se quem governo o Executivo acha por bem ter uma boa relação com o Congresso e procure negociar com este, é direito dele, assim como é direito dele não fazê-lo.

O problema, como bem diz a autora, é que há uma crise política. E qual o fundo dessa crise? O fato de que o regime político virou uma bagunça, uma avacalhação. Nem o Executivo, nem o Legislativo são capazes de cumprir o papel que a classe ominante quer que eles exerçam. E, portanto, são incapazes de serem disciplinados pelos meios comuns da burguesia — a chantagem, a corrupção, a pressão da imprensa etc.

E é aí que entra a intervenção do STF; O Supremo é uma espécie de última trincheira do grande capital no regime político brasileiro. Quando não consegue eleger um presidente da República completamente domesticado, procura pressionar o Congresso, cujas eleições são muito mais despolitizadas, para que sabote o Executivo. Quando mesmo o Congresso se rebela, resta o Supremo para tentar impor a vontade dos banqueiros.

Se o regime político virou um caos, a solução é reformular o regime político. É convocar uma Assembleia Constituinte, por exemplo. Chamar o STF para intervir é, na verdade, modificar o regime da maneira mais autoritária e truculenta possível.

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Last Update: 06/07/2025