A primeira vez que ouvi Nana Caymmi foi em um dos festivais da Record, cantando uma música do seu então marido Gilberto Gil “Bom Dia”, uma beleza de música com uma voz extraordinária. E foi vaiada. A sua voz ainda não havia sido assimilada por um público mais interessado em colocar nos festivais a energia militante que lhes era tirada na política.
Não sei quanto tempo durou o casamento com Gil. Depois disso, Nana teve vários casamentos, mas, a cada ano, ía se firmando como uma das maiores vozes do país. E sempre mantendo duas características: uma língua afiada e uma simplicidade que surpreendeu o cantor e compositor Georges Moustaki, quando passou pelo Brasil.
Disse mais ou menos o seguinte, depois de assistir a um show de Nana:
- Só no Brasil para uma das maiores cantoras do mundo terminar o show e dizer que tem que fazer a feita na manhã seguinte.
A carreira e as frases polêmicas caminhavam lado a lado.
Emocionava o público com “Atrás da Porta”, de Chico Buarque e Francis Hime e declarava que “a Tropicália foi uma grande palhaçada”.
Saia do samba canção e enveredar por Roberto Carlos em ritmo de bolero, no clássico “Não se esqueça de mim”. E disparava contra a amiga: “Elis Regina grita demais”.
Dourava a mais bela letra da MPB, “Resposta ao Tempo”. E atacava os colegas militantes: “Artistas tem que cantar. Não quero saber de artista fazendo discurso político no palco”.
No auge de um dos momentos mais sombrios da história, no final do governo Collor, os shows da família Caymmi eram um sopro de esperança na brasilidade. Mas Nana não poupava nem a eles próprios: “Ser Caymmi é uma merda. As pessoas acham que você tem que ser genial só por causa do nome”.
E, finalmente, a melhor definição sobre ela mesma: “Eu sou uma mulher insuportável, mas pelo menos sou verdadeira”.
Morre defitivimente consagrada como uma das maiores cantoras românticas brasileiras, ao da de Elizeth Cardoso, Alaide Costa, Maisa.
Mas sua lembrança definitiva para mim é a interpretação de “Por causa de você”, de Tom Jobim e Dolores Duran.
Fio ouvindo esta música, sentados em uma rede lembrando do nosso Vini, que Eugenia e eu nos demos conta de que a letra de Dolores Duran era para o filho que perdera. Conferindo depois em uma biografia antiga, constatei a morte da criança poucos meses antes da própria Dolores partir.