Na China, Lula e Xi defendem multilateralismo e rechaçam guerras comerciais

Antes de embarcar de volta ao Brasil, o presidente Lula concedeu, nesta terça-feira (13), coletiva à imprensa internacional na China, onde fez um balanço positivo da viagem a Pequim e dos acordos estratégicos firmados com o governo chinês e com empresários locais. O presidente respondeu a questionamentos sobre os temas globais mais relevantes, ainda em meio à notícia do falecimento do líder progressista Pepe Mujica, ícone da esquerda latino-americana e ex-presidente do Uruguai.

Lula se disse “muito feliz” pela maneira como a comitiva brasileira foi recebida pelo presidente chinês, Xi Jinping. “A nossa relação é estratégica, é muito estratégica. E a gente quer aprender […] a gente quer atrair mais investimento, a gente quer mais coisa no Brasil, a gente quer mais ferrovia, a gente quer mais metrô, a gente quer mais tecnologia, a gente quer inteligência artificial, a gente quer tudo que eles podem compartilhar conosco”, enumerou.

O petista relatou uma conversa que teve com Xi Jinping no intuito de superar a burocracia estatal e agilizar as parcerias acordadas. Segundo Lula, o presidente chinês vai designar alguém de sua confiança para tratar diretamente com o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa. “As coisas têm que andar mais rápido, os projetos têm que ser mais rápidos, a execução tem que ser mais rápida, porque a China precisa disso e o Brasil precisa disso”, avaliou Lula.

O alinhamento alcançado entre Brasil e China em prol do multilateralismo também foi elogiado pelo presidente, que reiterou as críticas dirigidas aos Estados Unidos (EUA) e à guerra comercial e tarifária declarada contra mais de 180 países. “Nós temos que defender a nossa soberania”, afirmou Lula.

“Nós queremos negociar com os EUA […] Mas se não tiver o acordo, nós vamos colocar em prática a reciprocidade ou vamos para a OMC [Organização Mundial do Comércio] brigar pelos nossos direitos”, antecipou.

O petista argumentou ainda que o adensamento das relações com os chineses não significa o enfraquecimento dos laços com Washington ou com qualquer outro parceiro importante do Brasil. “Eu quero melhorar com a China, melhorar com os EUA, melhorar com a União Europeia.”

“Exemplo de ser humano”

Nitidamente comovido, Lula iniciou a fala aos jornalistas lamentando a morte de Mujica e dizendo que “o dia havia começado muito ruim”. Por causa do fuso, a informação chegou ao conhecimento do presidente na manhã desta terça, hora local. O uruguaio foi definido pelo colega brasileiro como “um exemplo de ser humano”.

“O Pepe Mujica era um ser humano muito, muito importante para a democracia, para os setores progressistas da sociedade, para a esquerda. Porque eu acho que, se ele não tivesse nascido, precisaria nascer outra vez, para que a gente tivesse um exemplo de ser humano com muita dignidade, com muito respeito, com muita solidariedade e com muita coragem”, emocionou-se o petista, ao som dos aplausos dos presentes.

Em seguida, o presidente assegurou que viajará ao Uruguai para comparecer ao velório de Mujica.

Pela paz

Durante a entrevista, Lula rebateu as críticas da imprensa brasileira em relação à sua ida a Moscou, antes de desembarcar em Pequim, por ocasião dos 80 anos da redinção nazista às forças soviéticas na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O encontro com o presidente russo, Vladimir Putin, serviu para que pudessem dialogar a respeito da paz na Ucrânia.

“É com muita alegria que, ao visitar a Rússia na comemoração dos 80 anos da vitória da Segunda Guerra Mundial, a gente tenha encontrado oportunidade para conversar sobre a questão da paz”, contou, antes de ponderar que Putin pode comparecer às negociações previstas para esta quinta (15), em Istambul, na Turquia.

Lula também comentou a visita do presidente estadunidense, Donald Trump, ao Oriente Médio. O oligarca republicano chegou a Riad, capital da Arábia Saudita, na terça (13). Para o petista, apesar da guerra tarifária, Trump vem contribuindo, de fato, para a construção da paz na Ucrânia e pode fazer o mesmo na Palestina.

“Eu acho importante que o Trump viaje ao Oriente Médio para ele ver o que está acontecendo. Porque não é uma guerra normal, que eu já sou contra, entre dois exércitos. É uma guerra entre um exército altamente sofisticado e mulheres e crianças. É isso que, no fundo, no fundo, é o resultado”, condenou o petista.

Em outra parte da coletiva, o presidente foi aplaudido por classificar o conflito na Palestina de genocídio, em crítica às Forças de Defesa de Israel (IDF, sigla em inglês).

Nova ordem global

China e Rússia, países visitados por Lula nos últimos dias, integram o Brics. Aos jornalistas, o presidente enalteceu a ascensão do bloco pertencente ao chamado Sul Global e falou em alterar o eixo da política internacional, incluindo novas formas de trocas comerciais, à margem do dólar.

“O Brics é a possibilidade da gente mudar um pouco a história, para colocar os excluídos dentro do sistema político-econômico”, observou.

Lula repetiu, ao longo da entrevista, que o atual modelo de governança global se aproxima do esgotamento por não conseguir mais refletir a realidade geopolítica do mundo. Na avaliação do presidente, o Conselho de Segurança da ONU deixa de fora novos e antigos pólos de poder, como Índia, Brasil, Alemanha e Japão.

“Em 1947, 1948, a ONU teve força para criar o Estado de Israel. Hoje, a ONU não tem força para criar o Estado palestino. Alguma coisa mudou: houve um enfraquecimento das Nações Unidas nas suas decisões”, comparou. “E se não tiver a ONU com força, a questão climática vai ser tratada de forma secundária.”

Artigo Anterior

Proposta de Putin para as negociações de Istambul contraria os planos da Europa

Próximo Artigo

Cid confirma golpismo mais uma vez: Bolsonaro se recusou a desmobilizar 8/1

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter por e-mail para receber as últimas publicações diretamente na sua caixa de entrada.
Não enviaremos spam!