Juliana Mateus, 40 anos, tinha medo do ex-companheiro. E recorreu à polícia para pedir ajuda. Três dias depois, foi assassinada por ele a facadas, exatamente como temia, em Três Coroas (RS). Sua mãe também foi atacada e luta pela vida no hospital. A filha, de apenas 5 anos, presenciou tudo. 

O caso brutal soma-se a uma série de outros feminicídios ocorridos no Rio Grande do Sul nos últimos anos. Somente em 2025, de janeiro ao início de maio, 33 mulheres perderam a vida desta forma no estado. 

Há um mês, dez mulheres foram mortas durante o feriadão de Páscoa — seis apenas na Sexta-feira Santa. A série de feminicídios fez com que os números saltassem 1.000% no mesmo mês entre um ano e outro: em 2024, havia sido registrado um caso; em 2025, abril teve 11, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública. Na ocasião, uma delegada, acostumada a lidar com a violência, disse nunca ter visto nada igual. 

A situação alarmante levou parlamentares e movimentos sociais a, mais uma vez, clamar por medidas efetivas por parte do governador Eduardo Leite, durante audiência pública realizada nesta quarta-feira (21), na Assembleia Legislativa gaúcha.

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Leite não foi; nem mandou representação, um indicativo do valor que sua gestão atribui ao tema. “Esse silêncio do governo também é uma resposta. É a omissão de quem governa há sete anos de costas para as mulheres”, disse a deputada estadual e coordenadora da Procuradoria Especial da Mulher, Bruna Rodrigues (PCdoB). 

Bruna também denunciou a falta de orçamento, de estrutura e de protocolos nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams); revelou que apenas 300 das 2 mil tornozeleiras eletrônicas disponíveis estão em uso e voltou a defender a retomada da Secretaria Estadual de Políticas para as Mulheres, extinta em 2015, no governo de José Ivo Sartori (MDB).

“Não dá mais para ficar nesse empurra-empurra, dizendo que política é monitoramento de tornozeleira”, criticou a parlamentar. Além disso, enfatizou que “política de segurança não é a única que nós queremos. Eu não vi sequer uma peça publicitária sobre o tema”, destacou. Infelizmente, pontuou, “não estamos falando de um estado parceiro das mulheres”. 

A deputada defende, entre outras iniciativas, que haja assistência para geração de emprego e renda, de maneira que as mulheres tenham autonomia financeira; suporte para os trabalhadores das Delegacias da Mulher; Patrulha Maria da Penha ativa; educação, nas escolas, contra a violência e uma rede de assistência à mulher que seja realmente articulada.

Ações urgentes

Dentre as medidas deliberadas durante a audiência estão — além do pedido de urgência para a criação da Secretaria de Política das Mulheres, com orçamento e estrutura adequados —, a formulação de denúncia à ONU Mulheres e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos relativa ao descaso do governo estadual com a situação de violência de gênero.

“Nós temos batido às portas do Ministério Público, do governo do estado, e simplesmente temos sido ignoradas. Agora, chega. É hora de a gente voltar a ser ouvida e que seja, então, por organismos internacionais”, declarou a deputada Stella Farias (PT). 

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A audiência também definiu que os projetos de lei que tramitam na ALRS com temática relacionada à proteção das mulheres terão preferência na tramitação, bem como decidiu realizar uma audiência junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) sobre o descaso na instalação da Casa da Mulher Brasileira, cujos recursos já foram disponibilizados pelo governo federal. 

Outro encaminhamento é a produção de campanhas educativas; a realização de uma auto-agenda com o governador; a mobilização para uma Marcha de Mulheres e para um ato público em frente à sede do governo estadual. 

Também ficou estabelecida a tomada de medidas articuladas com o governo federal, entre as quais uma agenda com o Ministério da Mulheres sobre o tema e um pedido para que seja declarada a situação de “estado de emergência” e “estado inseguro para as mulheres” no RS. 

“Infelizmente, o governo Leite não tem orçamento para o enfrentamento à violência contra a mulher, não tem política pública e nem sequer escuta os anseios da sociedade”, salientou o deputado Adão Pretto Filho (PT), que criou e coordena a Frente Parlamentar de Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres.

Na avaliação de Bruna Rodrigues, feita após a audiência, “essa é uma batalha de toda a sociedade mas, sobretudo, de quem tem a caneta na mão”. 

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Last Update: 23/05/2025