No último domingo (25), o sítio A Terra é Redonda publicou um artigo de Emilio Cafassi em defesa da figura de José “Pepe” Mujica, ex-presidente do Uruguai. O texto, recheado de sentimentalismo e saudosismo besta, constrói uma figura mitológica do ex-mandatário, ignorando por completo o conteúdo concreto de sua atuação política. Apesar de suas origens em um movimento revolucionário, Mujica se tornou símbolo da política de capitulação da esquerda latino-americana.

Cafassi escreve: “como bom jardineiro, não foi um político que semeou o ressentimento, mas o sonho”. A política revolucionária não tem como objetivo evitar o ressentimento, mas organizar a revolta consciente da classe trabalhadora. A esquerda não pode — sob risco de se dissolver na ordem burguesa — substituir a luta de classes pela contemplação de símbolos pacificadores.

Mujica foi apresentado como “o presidente mais humilde do mundo”. Essa imagem, centrada em sua modesta casa, seu Fusca azul e suas roupas simples, nada tem a ver com o socialismo. A romantização da pobreza é uma farsa que serve a dominação burguesa. O socialismo não tem como ideal a escassez ou a simplicidade voluntária, mas a abundância social, a superação da miséria imposta pelo capital.

O autor exalta Mujica por “recusar o aparato cerimonial” e por ter “vivido como falava”. Ocorre que essa estética hippie encenada, por quem administra o Estado capitalista, não tem qualquer valor. Nenhum operário uruguaio foi emancipado porque Mujica calçava sandálias. Nenhuma criança deixou de passar fome porque o presidente morava no campo.

O culto à “vida simples” funciona, nesse caso, como um verniz moral sobre uma política que, em essência, serviu para conter a mobilização popular e preservar os interesses do capital financeiro no Uruguai.

O texto tenta apresentar Mujica como “síntese entre guerrilheiro e estadista”. Na prática, porém, o guerrilheiro foi engolido pelo estadista. Seu governo jamais enfrentou os monopólios estrangeiros, não reverteu a privatização dos recursos nacionais nem colocou o aparato estatal a serviço dos trabalhadores.

Pelo contrário: como presidente, Mujica declarou apoio a governos de direita, atacou a Venezuela, defendeu a “democracia liberal” como modelo político e se declarou contra a luta de classes, buscando promover o “entendimento” entre a classe dominante e os oprimidos. Um programa que nada tem de socialista e que não representa avanço algum do ponto de vista da classe operária.

Ao final do artigo, Cafassi afirma: “a esquerda não pode se permitir desprezar exemplos como o de Mujica”. O que está sendo proposto, na prática, é que a esquerda abdique de seus princípios, se contente com a administração do Estado burguês e se renda ao elogio da impotência. Mujica não deixou nenhum legado revolucionário. Seu governo não trouxe transformações reais para o Uruguai, não avançou na organização independente dos trabalhadores, não promoveu reformas estruturais e tampouco desafiou o imperialismo.

O culto exagerado de Cafassi à figura de Pepe Mujica é parte da política de domesticação da esquerda. O socialismo não será construído com base numa política franciscana, mas com a luta organizada da classe operária contra o regime capitalista. Nesse sentido, o ex-presidente uruguaio é um exemplo a não ser seguido, ou pelo menos, não por quem realmente deseja a libertação dos trabalhadores e dos povos oprimidos de toda América Latina.

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Last Update: 28/05/2025