Na semana do 25 de julho, Dia do Trabalhador e da Trabalhadora Rural e da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) promove uma intensa agenda de mobilizações, diálogos e ações simbólicas em todas as regiões do Brasil. A “Semana Camponesa” traz neste ano o lema: “Para o Brasil alimentar, Reforma Agrária Popular!”, evidenciando o objetivo central da campanha: pressionar o governo federal, em especial o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a destravar a pauta da Reforma Agrária, paralisada há quase três anos.
O movimento cobra do governo o cumprimento da promessa de assentar pelo menos 65 mil famílias Sem Terra até o fim do mandato. Até agora, apenas 3.353 famílias foram assentadas em novas áreas. Para o MST, o ritmo atual aponta para o não cumprimento da meta — uma marca que mancharia o terceiro mandato de Lula junto à base social que o apoiou nas urnas.
Quatro eixos de luta
As mobilizações desta semana se organizam em torno de quatro eixos centrais:
- Democratização da terra e criação de novos assentamentos: O MST denuncia a ausência de novas desapropriações e cobra que o governo enfrente a concentração fundiária.
- Acesso a teto e crédito: Muitos assentamentos ainda carecem de políticas públicas básicas, como crédito de instalação e infraestrutura para produção.
- Educação no campo: O movimento demanda ampliação do Pronera e recursos para evitar o fechamento de escolas rurais e garantir formação aos jovens camponeses.
- Soberania nacional e defesa do território: O MST vincula a Reforma Agrária à soberania alimentar e à resistência contra o avanço do agronegócio e de interesses estrangeiros, como a ofensiva dos EUA no país.
Carta aberta: cobrança direta a Lula
Nesta segunda-feira (21), o MST lançou uma carta aberta à sociedade e ao governo federal. No documento, o movimento rompe com a estratégia de mediação institucional e se dirige diretamente a Lula, cobrando decisões políticas e orçamento. O texto afirma que “a Reforma Agrária continua paralisada” e questiona: “Lula, cadê a Reforma Agrária?”
A carta aponta que mais de 122 mil famílias vivem hoje em acampamentos à espera de terra, enquanto cerca de 400 mil famílias assentadas não acessam políticas públicas essenciais. O movimento também denuncia a lentidão de órgãos como o Incra e o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), além de criticar duramente a gestão do ministro Paulo Teixeira.
Críticas à “maquiagem” nos números e ao favorecimento do agronegócio
O dirigente nacional do MST, Jaime Amorim, acusa o governo de inflar dados ao contabilizar regularizações fundiárias antigas como se fossem novos assentamentos. Ele critica a falta de recursos para desapropriação e assistência técnica, contrastando com os R$ 557 bilhões destinados ao agronegócio no Plano Safra. “Se tirasse só 1 bilhão disso, já seria suficiente para destravar a Reforma Agrária”, afirma.
Para o MST, sem orçamento e decisão política, o atual governo repete erros do passado e deixa de enfrentar a raiz da desigualdade: a concentração fundiária.
Posição política e defesa da soberania
A carta pública do MST também aborda a conjuntura política, destacando ameaças internas e externas à soberania nacional. O movimento associa a estagnação da Reforma Agrária ao avanço de interesses transnacionais, à ofensiva legislativa da direita ruralista e à continuidade de medidas herdadas do governo Bolsonaro — como a Instrução Normativa nº 112, que facilita mineração em áreas de assentamentos.
Entre os projetos criticados, estão o PL da Devastação (2169/2021) e o PL 8262/2017, que permite ação policial sem ordem judicial em ocupações rurais e urbanas. Para o movimento, tais medidas representam um ataque direto ao direito à terra e à organização popular.
Caminhos para 2026
Com o atual cenário de paralisia, o MST inicia uma reconfiguração de sua estratégia, propondo uma “reprogramação da política de Reforma Agrária” a partir de 2026. Para isso, quer garantir já no orçamento de 2025 recursos para desapropriação, educação do campo e produção de alimentos.
A Semana Camponesa, marcada por atos públicos e ocupações simbólicas, reafirma a disposição do MST de seguir mobilizado. “Não podemos mais adiar nossas conquistas”, conclui o manifesto do movimento.
Uma encruzilhada política
O apoio do MST à eleição de Lula em 2022 foi estratégico e explícito. Agora, o movimento cobra reciprocidade. A Reforma Agrária Popular é apresentada não apenas como uma dívida histórica, mas como elemento essencial da soberania nacional, do combate à fome e da justiça social. Com 2026 no horizonte, a resposta do governo a esse chamado pode determinar o tom da relação entre o Planalto e o movimentos daqui para frente.