A prisão criminosa do comediante Léo Lins pelo “crime” de fazer piadas motivou o militante do PSTU Marcel Wando a publicar, no último dia 15, um artigo intitulado A condenação de Leo Lins é o resultado previsível da liberdade irrestrita ao Capital, com a defesa de tudo o que um trotskista sério jamais deveria defender: a repressão estatal contra opiniões, a defesa da arbitrariedade e até mesmo a defesa de um monopólio odioso como a Rede Globo. Diz Wando em seu artigo:

“No passado, a mídia analógica tinha mais controle e, portanto, mais barreiras éticas. As redes destruíram esse represamento e hoje somos empurrados para um lamaçal.”

Ora, quando foi que existiram essas “barreiras éticas”? Em primeiro lugar, quando a Globo, por exemplo, falava que a democracia estava sendo reestabelecida com o golpe de 64? Quando a Folha de São Paulo cedia seus carros para a ditadura militar torturar o povo brasileiro — a esquerda brasileira em especial? Quando a mesma Folha de São Paulo denunciava os combatentes que enfrentavam a ditadura militar como “inimigos de um governo sério e responsável” — no caso, o próprio General Médici? Talvez Wando se refira ao famoso episódio em que a Globo transformou uma manifestação das Diretas Já em uma comemoração pelo aniversário de São Paulo. É difícil saber o que se passa na cabeça de uma pessoa que se diz de esquerda e produz uma barbaridade dessas.

O que eles chamam de “barreiras éticas”? Primeiro, nunca existiram — e aqui é preciso destacar que, nesse ponto, a imprensa brasileira não é diferente da imprensa burguesa de nenhum outro país. Talvez seja mais escrachada, menos habilidosa, mas não foi uma exceção. Muito diferente no conteúdo, que motivou, por exemplo, o escritor inglês George Orwell, autor do clássico 1984, a situar o personagem principal no que ele chamou de “Ministério da Verdade”: um órgão de imprensa dedicado a produzir manipulações e mentiras. Isso vem da experiência do próprio Orwell com a BBC — algo que muita gente ignora, mas ele foi jornalista da BBC e conheceu de perto esse mecanismo pérfido de controle da opinião pública.

Wando deveria ser mais específico quando fala em “barreiras éticas” que existiam na época do que ele chama de “mídia analógica”. Era o mundo da Globo falando em “defesa da democracia” ao lado dos generais. Eram as “barreiras éticas” da Folha de São Paulo quando elogiava Médici como um governo “sério e responsável” em seus editoriais. Era o “Ministério da Verdade” do autor inglês. Quem seria?

Curiosamente, Wando continua afirmando que as “barreiras éticas” da Globo foram destruídas pelas redes sociais. Havia um “represamento” que órgãos como a Globo, a Folha e o Estadão faziam — que, evidentemente, ele encara como positivo —, mas que foi destruído quando as redes sociais passaram a disputar com os monopólios de imprensa na luta pela opinião pública.

É importante destacar: quando ele diz que “as redes destruíram esse represamento”, o que está afirmando é que, concretamente, a população parou de precisar dos sensores dos monopólios para produzir informação de forma muito mais democrática do que o modelo controlado por esses mesmos monopólios. Ou, como ele diz (acertadamente, é preciso reconhecer, ainda que com conclusões desencontradas), havia de fato um “represamento” das notícias e da verdade. Isso foi destruído. Felizmente — diria uma pessoa verdadeiramente interessada na luta contra os monopólios.

Os oprimidos comemoram o fim dessa pressão; os opressores, naturalmente, lamentam. Que poderia ser melhor do que ter uma Rede Globo, uma Folha e um Estadão produzindo mentiras sem contestação? É muito estranho que um trotskista encare isso como algo negativo, mas é exatamente o que faz Wando ao dizer que a democratização da informação “empurrou o mundo para um lamaçal”. Isso é mais uma evidência do fracasso completo dessa organização morenista, que já não consegue sustentar posições minimamente coerentes sobre o que seria uma posição revolucionária. É uma posição que assume abertamente a defesa dos opressores, do imperialismo e da manipulação informativa pela ditadura do capital que diz combater — mas que, na prática, defende.

Finalmente, a pérola:

“Nas ditaduras, a luta por liberdade de expressão sempre tomou como paradigma ideias brilhantes, descobertas científicas, literatura refinada, denúncias jornalísticas e outras produções humanas que agregam como parte do patrimônio cultural da humanidade. Nas democracias, a luta pela liberdade de expressão parece se dar na defesa dos que abusam dela para praticar, incitar ou normalizar a violência.”

Para o imperialismo, isso faz todo o sentido. Trata-se de um sistema opressor, uma ditadura que precisa manter sua dominação, e, para isso, a elevação cultural não interessa. Se ideias positivas ou negativas serão censuradas, o imperialismo tanto faz — porque seu objetivo é a manutenção da opressão, não a evolução da humanidade.

Para um revolucionário, porém, ter assegurado o direito de defender suas posições livremente, sem ameaça de repressão estatal, é a diferença entre conseguir arregimentar simpatia para a causa revolucionária e não conseguir — ou conseguir sob condições extremamente duras, em um processo que fatalmente atrasa a luta pela libertação da classe trabalhadora.

Quando Wando assume a defesa da censura que o imperialismo promove no mundo inteiro, coloca-se indiscutivelmente como um instrumento da contrarrevolução, um aliado da manutenção do sistema opressivo. O que faz desse artigo e dessas posições? Uma defesa imperialista vulgar, que deve ser duramente criticada por quem está comprometido com a causa revolucionária.

Aqueles que sabem — como ensinava Trótski — já experimentaram na prática que não importa contra quem a censura comece: ela sempre recairá sobre os trabalhadores. É uma lição que os morenistas abandonaram.

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Last Update: 17/06/2025