Moraes abre mais um inquérito em que ele é a vítima

Nesta segunda-feira (26), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes abriu inquérito contra o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por buscar sanções dos Estados Unidos contra autoridades brasileiras, o próprio Moraes entre elas, além de outros membros do Judiciário. A Procuradoria-Geral da República (PGR), liderada pelo procurador-geral Paulo Gonet, acusa Eduardo de tentar coagir ministros do STF, procuradores e policiais federais envolvidos em investigações contra bolsonaristas, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro, réu por tentativa de golpe após as eleições de 2022.

Relator dos inquéritos sobre o ato bolsonarista de 8 de janeiro e das “fake news“, Moraes decretou sigilo no processo e autorizou as seguintes medidas: monitoramento das redes sociais de Eduardo e depoimentos dele e de Jair Bolsonaro em até 10 dias. Como Eduardo reside nos EUA desde fevereiro, poderá responder por escrito, via e-mail.

Gonet aponta três crimes: coação no curso do processo (art. 344 do Código Penal), embaraço à investigação de organização criminosa (art. 2º, § 1º, da Lei 12.850/2013) e tentativa de abolição violenta do regime democrático (art. 359-L do Código Penal). “Há elementos suficientes para a instauração de inquérito”, afirmou o procurador.

Eduardo, que se licenciou da Câmara para “focar em buscar as justas punições que Alexandre de Moraes e a sua Gestapo da Polícia Federal merecem”, mantém reuniões com congressistas republicanos e aliados do presidente norte-americano Donald Trump. Ele busca sanções: cassação de vistos, bloqueio de bens e proibição de negócios com empresas ligadas aos EUA, medidas que ele descreveu como “pena de morte financeira”.

“O sancionado fica impossibilitado de realizar transações internacionais ou abrir contas bancárias”, disse Eduardo, segundo a denúncia da PGR. Na última quarta-feira (21), o secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, declarou, em audiência no Congresso, que “há uma grande possibilidade” de sanções contra Moraes.

Gonet sustenta que Eduardo age com “motivação retaliatória” e “tom intimidatório” para obstruir o julgamento de Jair Bolsonaro e interferir nas investigações da Polícia Federal. “É dado intuir que o intuito é impedir o funcionamento pleno do Judiciário, da PF e da PGR, atentando contra a normalidade do regime democrático”, escreveu Gonet. Ele destacou que Jair Bolsonaro, que financia a estadia do filho nos EUA, é “diretamente beneficiado” pela campanha e deve ser ouvido. A PGR cita declarações públicas de Eduardo, que condicionou suas ações ao avanço do processo contra o pai: “quanto mais a Primeira Turma avançar no julgamento, mais trabalharei nos EUA por sanções, especialmente contra Moraes”.

A ofensiva gerou reações no STF. Um ministro, sob anonimato, afirmou ao portal de notícias da Globo g1: “eles não entendem que, ao tentar punir alguém pelo exercício de seu trabalho, sinalizam que o mesmo pode ser feito contra cada um de nós”. Até ministros indicados por Bolsonaro teriam expressado apoio a Moraes, vendo a campanha como um ataque às instituições. O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), anunciou, na última segunda-feira (26), que levará o caso ao Conselho de Ética da Casa: “estamos entrando no Conselho porque ele ainda é deputado. Ele quer coagir ministros do STF e articula com autoridades estrangeiras contra o Brasil. Está mentindo fora do país”.

Eduardo respondeu no X, chamando o inquérito de “tiro no pé” e “medida injusta e desesperada” que prova um “regime de exceção” no Brasil, onde “tudo no Judiciário depende de quem seja o cliente”. Ele acrescentou: “os EUA têm uma chance de ouro para resgatar sua tradição de exportadores de liberdade, atingindo Moraes e sua quadrilha tirânica com punições exemplares contra protótipos de ditadores”.

A campanha de Eduardo para que autoridades estrangeiras intervenham na situação brasileira é, por si só, um crime de lesa-pátria. No entanto, as medidas tomadas pelos ministros do STF são ilegais e arbitrárias. Em primeiro lugar, pois não se investiga as ofensivas norte-americanas contra o Brasil em si, mas sim declarações e intenções de Eduardo Bolsonaro – ou seja, crimes de opinião. Em segundo lugar, é escandaloso que Moraes seja o responsável pelo inquérito que investiga ações contra ele mesmo, mais uma ocasião em que o ministro é juiz, procurador, investigador, policial e vítima ao mesmo tempo.

Sem contar no fato de que, recentemente, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, admitiu ter pedido “apoio” aos Estados Unidos para evitar um suposto golpe de Estado no Brasil:

“Em três vezes pedi declarações dos Estados Unidos de apoio à democracia brasileira, uma delas ao próprio Departamento de Estado. Acho que isso teve algum papel, porque os militares brasileiros não gostam de se indispor com os Estados Unidos, pois é aqui que obtêm seus cursos e seus equipamentos”, afirmou durante evento em Nova Iorque.

“Mais recentemente tivemos um decisivo apoio dos Estados Unidos à institucionalidade e à democracia brasileiras em momentos de sobressalto”, continuou.

Alexandre de Moraes não abriu, no entanto, inquérito contra o ministro lesa-pátria, que fez ainda pior que Eduardo Bolsonaro.

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