Por Leonardo Silva*, em Ahí Les Va
A Rússia fortalece suas alianças na Ásia. E desta vez, não falamos da China, embora também sim, senão que do Vietnã e da Coreia do Norte.
Vladimir Putin visitou a ambos países em uma recente gira, que deixou anúncios importantes, deixou nervosos a mais de um e adicionou mais um tijolo na construção de um mundo multipolar.
O giro começou em Piong Yang, capital da República Popular Democrática da Coreia, país que o mandatário russo não visitava desde o ano 2000.
O recebimento foi muito ao estilo norte-coreano, com cidadãos agitando bandeiras na passagem da comitiva, ruas coloridas e cartazes de boas-vindas.
Putin e Kim Jong-un mantiveram tanto encontros privados, como junto a seus ministros e assessores.
O mandatário russo, de fato, viajou à capital norte-coreana acompanhado de boa parte de sua equipe de governo.
Na agenda bilateral foram tratados temas econômicos, energéticos, de transporte, agricultura, e segurança, entre outros.
Os acordos alcançados foram registrados em um novo documento fundamental que substituiu outros firmados por ambas nações no passado, para definir o alcance de suas relações e aprofundá-las.
A assinatura do Tratado de Associação Estratégica entre a Rússia e a Coreia do Norte prevê a assistência mútua em caso de agressão de terceiros a alguma das duas.
Um documento que Putin qualificou de inovador, e Kim descreveu como pacífico e defensivo.
Neste contexto, o presidente russo enfatizou que ambas nações não cederão à linguagem de chantagem e aos ditames que o Ocidente busca impor ao resto do mundo, e que Moscou como Piong Yang continuarão se desenvolvendo de forma soberana e independente, apesar da prática ocidental de estrangulamento por meio de sanções.
O acordo não prevê o envio de armamentos entre as partes, mas não o descarta, dependendo das circunstâncias.
Nesse sentido, o mandatário russo recordou como o Ocidente já leva mais de dois anos inundando a Ucrânia com armamento cada vez de maior alcance, violando, assim, vários compromissos internacionais assumidos por eles mesmos.
Nos dois dias de atividades, Vladimir Putin também visitou junto a Kim Jong-un o monumento pela libertação da Coreia pelo Exército Vermelho na II Guerra Mundial e a única igreja ortodoxa que há na Coreia do Norte, inaugurada em 2002.
No entanto, o momento mais comentado na redes, fora do oficial e estritamente protocolar, chegou sobre quatro rodas e a toda velocidade.
Putin convidou o mandatário coreano a dar um passeio pelas ruas de Piong Yang em uma limusina russa.
No começo, o presidente russo foi ao volante e Kim Jong-un de acompanhante. Porém, mais tarde, trocaram de posições.
Esse momento gerou muitíssimos comentários entre os internautas e deixou uma autêntica onda de memes e até mesmo montagens de vídeo, quase todos afiadamente geopolíticos.
Depois de anunciar que ambos países abandonariam o dólar em seus intercâmbios comerciais, para priorizar suas respectivas divisas, chegou o momento da despedida.
Que, por sua vez, deixou uma cena menos afiada, mas terna, ou brega, conforme os gostos, digna de uma festividade asiática, em que os amigos se despedem, depois de um encontro inesquecível no qual selaram sua amizade para sempre.
E como se estivéssemos em algum momento da Guerra Fria novamente, e nem confirmamos, nem descartamos, que seja assim, de Piong Yang, nos transferimos a Hanói, capital da República Socialista do Vietnã.
Ali, Putin foi recebido por seu homólogo vietnamita, junto a jovens pioneiros e uma orquestra militar. As conversas bilaterais se desenvolveram no Palácio Presidencial capitalino.
Lá fora, como não, as pessoas presentes na cerimônia de boas-vindas fizeram fila para se fotografarem ao lado da limusine russa, que nesta viagem, conseguiu se promocionar mais e melhor do que em seus seis anteriores anos de existência.
To Lam, o presidente vietnamita, afirmou que seu governo considera a Rússia uma de suas prioridades da política exterior de seu país.
Ao passo que ressaltou a gratidão com a qual o Vietnã sempre recordará o apoio do povo russo durante sua luta de independência.
Durante a visita, Putin citou Ho Chi Minh para descrever como pensa que deveria ser o papel da Rússia em relação ao Vietnã. Os primeiros da fila durante as dificuldades, e os últimos na hora das recompensas.
Assim mesmo, o mandatário assinalou que ambos países têm um enfoque similar, ou próximo, nas questões importantes e urgentes da agenda internacional.
Nos marcos da visita e o fortalecimento da associação estratégica integral entre ambas nações, Rússia e Vietnã concordaram em não fazer alianças com outros países que possam prejudicar ao outro.
Foram estreitadas, também, as relações em cultura, turismo, energia, educação, esporte, defesa e segurança.
Moscou e Hanói mantêm boas relações desde a época soviética. E dezenas de milhares de vietnamitas se formaram, e continuam se formando, em universidades russas.
Além disso, ambas nações estão impulsando cada vez mais o uso de suas divisas nacionais em seu intercâmbio comercial.
Em 2025, celebra-se o 50º aniversário da libertação do sul do Vietnã, o 75º aniversário do restabelecimento de relações diplomáticas entre o Vietnã e a União Soviética, e o 80º aniversário da vitória na Grande Guerra Patriótica.
Eventos que ambos mandatários levam em conta na hora de dar impulso mais que simbólico a suas relações.
Assim, após um total de quatro intensos dias, concluía a gira do presidente russo pela Ásia. Um par de encontros bilaterais, cujos frutos ainda estão por ser vistos. Mas cujos primeiros resultados já podem ser intuídos pelas reações do Ocidente Coletivo.
Como era esperado, os grandes meios manchetaram num misto entre alarmismo e sensacionalismo. Combinando triunfalismo com derrotismo.
Por um lado, a gira seria prova da debilidade e isolamento da Rússia. E, por outro, ao mesmo tempo, seria prova do perigo de que a Rússia esteja encontrando formas de superar essa suposta debilidade e isolamento. Enfim!
A visita de Putin a Piong Yang foi descrita pela Casa Branca como preocupante. O governo do Reino Unido condenou a dissuadir o que chamou de Novo Eixo da Tirania.
E a Coreia do Sul condenou os acordos alcançados entre as partes, advertindo que reavaliariam começar o envio de armas a Ucrânia.
Como se o Ocidente Coletivo já não estivesse há mais de dois anos armando Kiev à mão cheia.
Por sua parte, a OTAN aproveitou a ocasião para se dedicar à atuação com a qual ficaram famosos. Tristemente, mas famosos: o expansionismo militar.
Seu Secretário Geral em extinção disse que a Aliança Atlântica deveria involucrar-se mais e mais no que ocorre na Ásia, onde, pelo que sabemos, não há nem sequer uma gota do Oceano Atlântico.
Segundo Jens Stoltenberg, a OTAN não aspira a operar num âmbito regional, e sim global.
Olha! A gente não tinha se dado conta. Obrigado, Jens, por tê-lo esclarecido!
Embora a maioria dos esperneios tenha sido por causa do encontro com Kim Jong-un, também houve descontentamento em Washington pelo estreitamento das relações entre Rússia e Vietnã.
Em concreto, da embaixada dos Estados Unidos em Hanói, criticaram o governo vietnamita por supostamente brindar uma plataforma à guerra de agressão russa.
Como escutaram: Estados Unidos dando lições de moral ao Vietnã sobre guerras de agressão.
Como veem, no norte global, continuam sem se darem conta de que com sua estratégia de tratar de afogar com sanções a seus adversários o máximo que conseguem é que seus rivais se unam entre si e se fortaleçam mutuamente.
Pelo bem de um mundo mais justo, balanceado e multipolar, esperamos que continuem sem se darem conta por muito tempo.
Tradução e legendas do vídeo: Leonardo Silva