O chanceler brasileiro aproveitou a audiência para explicar o asilo concedido à ex-primeira-dama do Peru.

 

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, explicou nesta quarta-feira (28/5), na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, os critérios para a concessão de asilo diplomático à ex-primeira-dama do Peru Nadine Heredia. O chanceler comparou o caso à situação dos opositores venezuelanos que estavam sob custódia brasileira na Embaixada Argentina em Caracas. Ele também criticou a ação de Israel em Gaza e defende papel do Brasil na mediação de conflitos globais.

Vieira afirmou que o asilo a Heredia, esposa do ex-presidente peruano Ollanta Humala, foi concedido por “urgência humanitária”, já que ela passou por uma cirurgia na coluna e tem um filho menor de idade. “A concessão do asilo diplomático segue a praxe diplomática regional, conforme a Convenção sobre Asilo Diplomático de 1954, também conhecida como Convenção de Caracas”, disse. “Não cabe análise do mérito, dada a circunstância de urgência humanitária que nos foi apresentada”.

O ministro destacou que o governo peruano emitiu rapidamente o salvo-conduto para a saída de Heredia. “O próprio Estado peruano concordou com a vinda da Sra. Nadine Heredia ao Brasil. O uso de um avião da Força Aérea foi justificado pela urgência e está em linha com a praxe regional”.

Em defesa do asilo

O deputado Alencar Santana (PT-SP) elogiou a concessão de asilo diplomático à ex-primeira-dama peruana Nadine Heredia, ressaltando que a medida tem base legal e humanitária. “Quando o Brasil concede asilo diplomático com justificativas humanitárias, baseado em convenções internacionais das quais o país é signatário, demonstra o novo momento em que vivemos, com respeito aos direitos humanos”, afirmou.

Santana aproveitou para criticar a política externa do governo anterior. “Não é o Brasil anterior, que atacava parceiros comerciais como a China ou cujo ex-presidente agrediu a esposa de um chefe de Estado. Esse é o Brasil da vergonha. Hoje, vivemos um Brasil melhor, internamente e nas relações exteriores”.

O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) também se manifestou em defesa do asilo. “Muita gente está questionando o custo do transporte de Nadine Heredia, mas ninguém se preocupou com o custo das motociatas do ex-presidente, feitas com dinheiro público em plena campanha eleitoral”, criticou.

Zarattini lembrou que a Corte Constitucional do Peru declarou inconstitucional a ordem de prisão contra o ex-presidente Ollanta Humala. “A Nadine foi expulsa de casa com os filhos. Isso é perseguição política, como foi a Lava Jato no Brasil”.

Venezuelanos

Sobre os quatro opositores do governo de Nicolás Maduro que ficaram 413 dias asilados na residência da Embaixada Argentina em Caracas, Vieira explicou que o Brasil assumiu a custódia do local a pedido da Argentina em agosto de 2024, mas que as negociações com a Venezuela não avançaram. “Diferentemente da atitude do governo peruano, a Venezuela jamais concedeu os salvos-condutos. Fizemos gestões repetidas vezes, oferecemos um avião, mas não houve abertura”, disse.

Os asilados deixaram o local em 6 de maio em circunstâncias não esclarecidas. “O governo brasileiro não foi informado previamente, mas confirmamos que saíram em segurança, o que sempre foi nosso objetivo”, observou Vieira, ao ressaltar que os venezuelanos agradeceram ao Brasil publicamente.

O chanceler lembrou que o asilo político é um princípio da Constituição brasileira e citou o artigo 4º. “Sua caracterização em defesa do asilado normalmente é mais eficaz quanto mais cedo se faça o pedido, evitando situações complexas”. O ministro reforçou o papel tradicional do Brasil na mediação diplomática, citando a custódia de embaixadas como a do Peru na Venezuela, em linha com a Convenção de Viena.

Guerras

Sobre os principais conflitos internacionais, Mauro Vieira criticou duramente as ações de Israel na Faixa de Gaza e reiterou o compromisso do Brasil com a mediação da paz, tanto no Oriente Médio quanto na guerra da Ucrânia. “O Brasil sempre condenou os atentados de 7 de outubro de 2023, perpetrados pelo Hamas contra civis israelenses”, afirmou o chanceler, ao lembrar que os ataques resultaram na morte de cerca de 1,2 mil pessoas. “Repudiamos com veemência o assassinato de dois jovens funcionários da Embaixada de Israel em Washington. Não é admissível que haja espaço para o antissemitismo, para o extremismo e para crimes de ódio”.

Ao mesmo tempo em que reconheceu o direito de Israel à autodefesa e à devolução dos reféns, Vieira foi categórico ao apontar os excessos cometidos pelo governo israelense. “As ações do Governo de Israel contra a população civil de Gaza […] já ultrapassam, há muito tempo, qualquer limite de proporcionalidade em relação à sua autodefesa, em clara violação do direito internacional e do direito internacional humanitário”.

Gaza destruída

De acordo com dados citados pelo ministro, mais de 80% da infraestrutura de Gaza foi destruída, e cerca de 90% da população foi deslocada. “Temos, até o momento, o inaceitável número de mais de 56 mil palestinos mortos, dos quais mais de 15.600 são crianças e cerca de 8.300 são mulheres. Além disso, há cerca de 122 mil feridos”.

Vieira destacou ainda decisões recentes da Corte Internacional de Justiça e do Tribunal Penal Internacional que apontam para a possibilidade de crimes de guerra e genocídio. “O direito de defesa não é direito de vingança”, enfatizou.

O ministro citou uma conferência recente em Madri sobre a solução de dois Estados e reforçou o apelo por ações da comunidade internacional. “Ninguém poderá alegar agora ou no futuro ignorância quanto ao que está acontecendo em Gaza e também na Cisjordânia”, disse. Ele mencionou ainda uma nota assinada pelo presidente Lula condenando o bombardeio a um hospital que matou nove filhos de uma médica palestina.

Vieira também criticou a decisão do governo israelense de bloquear ajuda humanitária desde 2 de março. “É intolerável o sofrimento humano em Gaza”, afirmou, referindo-se a uma declaração conjunta de Reino Unido, Canadá e França que se uniram ao Brasil na condenação às ações israelenses.

Alencar Santana foi enfático sobre o conflito em Gaza. “O Presidente Lula foi um dos primeiros líderes mundiais a se manifestar contra o genocídio que está acontecendo com o povo palestino. Aquilo é uma atrocidade. E não podemos nos calar diante da violência contra crianças, mulheres e idosos”.

Zarattini expressou profunda preocupação com a situação em Gaza. “Estamos diante da destruição da Faixa de Gaza e da matança generalizada. Fala-se até em transformar aquilo numa espécie de colônia de férias, uma ideia bizarra inicialmente proposta por Trump e aparentemente apoiada por Israel”.

Zarattini afirmou que espera que a Comissão aprove uma moção de repúdio ao governo israelense. “Temos que condenar o terrorismo do Hamas, sim. Mas também temos que condenar o massacre promovido por Israel, que já matou 50 mil pessoas”.

Ucrânia

Sobre a guerra na Ucrânia, Mauro Vieira destacou o papel ativo do Brasil na promoção do diálogo e de uma solução negociada. “Desde o início das hostilidades, o presidente Lula vem conclamando pelo estabelecimento de um processo de paz que envolva todas as partes”, disse.

O chanceler ressaltou a participação brasileira em reuniões internacionais e elogiou o entendimento com a China sobre a resolução política do conflito. “A proposta feita pelo presidente Putin de abrir negociações para a paz foi acolhida pelo Brasil e pela China”, contou Vieira. Segundo ele, houve também manifestação positiva do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. O chanceler revelou ainda que, a pedido da Ucrânia, o Presidente Lula telefonou diretamente para Vladimir Putin, solicitando sua presença nas negociações em Istambul.

“Apesar da ausência dos presidentes na reunião de 15 de maio, foi acordada a troca de prisioneiros de guerra, mil de cada lado, o que é um sinal muito positivo”, avaliou.

Vieira reforçou o papel do Brasil como ator global de diálogo. “A vocação brasileira é da defesa da paz, da solução pacífica dos conflitos, da prevalência dos direitos humanos, da cooperação entre os povos, do repúdio ao racismo e ao terrorismo e da defesa da igualdade soberana das nações.”

Atuação Internacional

O chanceler também enfatizou a atuação internacional do Presidente Lula, que já se encontrou com líderes de 68 países, e mencionou a relevância da Presidência brasileira no G20. “Estabelecemos três prioridades: a inclusão social, o combate à fome e à pobreza e a transição energética com desenvolvimento sustentável e reforma da governança global”, afirmou.

Vieira celebrou ainda o avanço nas negociações entre Mercosul e União Europeia e o fortalecimento das relações com países da África e da Ásia. “Essas iniciativas são exemplos do trabalho incansável e do renovado dinamismo da política externa brasileira em prol dos interesses nacionais”.

O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), elogiou o reposicionamento do Brasil no cenário internacional após o governo Bolsonaro. “Nós temos uma tradição no Itamaraty, uma tradição centenária de defesa dos interesses nacionais e comerciais. O senhor, ministro Mauro Vieira, junto com o presidente Lula, recolocaram o país no mundo de forma impecável”, declarou o parlamentar.

Lindbergh destacou os avanços nas relações internacionais, especialmente no comércio exterior. “Só em 2023, foram 56 novas aberturas comerciais, mais de 356 oportunidades de exportação para o agronegócio. Tudo isso foi destruído no governo anterior e agora está sendo reconstruído. ”

O deputado Rui Falcão (PT-SP) ressaltou o papel do ministro Mauro Vieira na retomada da credibilidade do Itamaraty. “Vossa excelência está trazendo de volta as honras da diplomacia brasileira. Diferente do que foi feito no passado, quando se dizia que o que era bom para os Estados Unidos era bom para o Brasil”.

Falcão criticou duramente a gestão anterior do Itamaraty, especialmente sob Ernesto Araújo. “Ele dizia que o globalismo era uma ideologia anticristã e que o Ocidente só poderia ser salvo por uma divindade: Donald Trump. Isso é sabujismo, um vexame para a diplomacia brasileira”.

Interesses Nacionais

Lindbergh acusou parte da oposição de agir contra os interesses nacionais. “É a primeira vez na história que temos um grupo político com posições claramente antinacionais. Vestem a camisa dos Estados Unidos e o boné do Trump. Isso é traição à pátria”, declarou, ao criticar a atuação do deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) contra ministros do Supremo Tribunal Federal. “O que ele está fazendo é crime. Coação no curso do processo. Tentando proteger o pai dele e atentando contra a soberania nacional”.

O deputado também mencionou a tentativa de envolvimento de Bolsonaro em ataques à democracia. “Todo mundo sabe que ele vai ser julgado por tentativa de assassinato do Lula, do Alckmin, do ministro Alexandre de Moraes. Isso tudo está sendo investigado e há provas”.

 

Lorena Vale

 

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Last Update: 28/05/2025