Ministro acha “absurda” a comparação entre os guetos de Varsóvia e Gaza
por Luiz Cláudio Cunha
Especial para GGN
Para evitar constrangimentos e poupar reputações, não vou revelar a identidade, nem localizar o titular que ocupou um dos ministérios mais relevantes do Brasil, na fase democrática após a queda da ditadura em 1985. O que importa aqui é o milagre, não o santo pecador.
O mais relevante é desvendar o mecanismo mental que torna um homem de sólida formação acadêmica e invejável biografia pública incapaz de classificar e interpretar a chacina diária de Gaza como um genocídio deliberado, uma ação clara de um governo extremista que desde outubro passado pratica um legítimo e incessante Terror de Estado que até este sábado, 13 de julho de 2024 — dia 281 da guerra –, já produziu 38.443 mortos, incluindo mais de 16 mil crianças, e 88.481 feridos.
E continua contando: na manhã de sábado 13, em novo ataque que chocou o mundo, os caças do premiê Benjamin Netanayahu bombardearam o campo de refugiados de Al-Mawasi, a oeste de Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza. É uma “zona humanitária”, definida assim pelos próprios militares israelenses e para onde eles encaminhavam parte dos 1,9 milhão de refugiados civis que tentam escapar da morte. Pois foi justamente ali que a Força Aérea de Tel Aviv descarregou suas bombas, matando 90 pessoas, entre civis, mulheres e crianças, e ferindo outras 300, incluindo o pessoal das equipes humanitárias que imaginavam trabalhar sob a proteção do Estado militar de Netanyahu. O pretexto do novo ataque, pelo qual Israel não se desculpou, é a mesma de sempre: “matar dois chefes militares do Hamas”, objetivo que Israel não conseguiu confirmar. Na letal matemática de Netanyahu, a conta é sempre assassina: 90 mortos civis explicam e justificam a caçada, mesmo fracassada, a apenas dois militantes do Hamas…
No final de fevereiro de 2024, quando a guerra já durava 133 dias e registrava o martírio de mais de 27 mil vítimas fatais, entre elas mais de 11 mil crianças e 8 mil mulheres, publiquei um ensaio de 21 mil palavras (quatro mil linhas) e 90 fotos traçando um desconcertante paralelo factual e gráfico entre o massacre das tropas nazistas de Hitler no gueto de Varsóvia em 1943 e o genocídio das tropas israelenses de Netanyahu no gueto de Gaza em 2023. As imagens e as histórias, lá e cá, mostram uma aberrante simetria de estupidez e barbárie. A eloquência do texto fica clara no título do trabalho: “Varsóvia e Gaza: dois guetos e o mesmo nazismo …e a mídia finge não ver o Terror de Estado de Netanyahu!”. O ensaio foi acolhido corajosamente na íntegra em 94 páginas da Humanitas, na edição digital nº 357 do Instituto Humanistas Unisinos, a Universidade do Vale do Rio dos Sino, UNISINOS, de São Leopoldo, RS. Leia a íntegra em: (https://drive.google.com/file/d/199vi31w3Wwr8OyA5GGIm7NI0lflSHtX8/view)
Não por acaso, a publicação desfralda uma insígnia copiada de uma frase pichada nas paredes do teatro Odeón, em Paris, nos dias trepidantes de maio de 1968: “Arrisca teus passos por caminhos pelos quais ninguém passou; arrisca tua cabeça pensando o que ninguém pensou”. Quatro meses depois, início de junho, repassei o ensaio para um amigo meu, ex-ministro, com as melhores expectativas: “É uma dura avaliação de 20 mil palavras sobre a política assassina e vingativa de Netanyahu no massacre deliberado de Gaza. Uma ação brutal que despertou a reação indignada do mundo civilizado e consciente, inclusive da maioria democrática e progressista do povo de Israel, que repudia de forma vigorosa o método sanguinário do premiê mais extremista e impopular que já governou o país. Tenho certeza que tu, como parte influente e consciente da comunidade judaica, estás incluído nessa parcela crescente que repudia a bestialidade de Tel Aviv”.
Contei a ele que o ensaio rendeu, depois de publicado, uma live da Unisinos que eu compartilhei com o ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), José Geraldo de Souza, sobre o “Genocídio em Gaza” e outra no site do Tutameia, festejado sítio do casal de jornalistas Rodolfo e Eleonora de Lucena. Relatei ao ministro que a Reitoria da UNISINOS resistiu bravamente a uma forte e surda pressão da Federação Israelita do Rio Grande do Sul (FIRS), que tentou tirar do ar a edição da Humanitas e a cancelar a live. Lembrei ao ministro: “A universidade convidou a FIRS a se manifestar ou a participar do debate, mas a federação recusou. Ela preferiu se refugiar numa nota previsível e rasteira, carimbando qualquer crítica justificada à ação injustificada de Netanyahu como “antissemitismo” – uma forma ladina de fugir da questão central, desqualificando qualquer crítico como “anti-judeu”. Isso nivela toda oposição como uma defesa insensata do absurdo Holocausto, como se todos nós, que criticamos a bestialidade militar de Tel Aviv, fôssemos idiotas e defensores de um novo extermínio de judeus… Não entendem que nós somos – como parte da consciência moral do mundo e da parcela civilizada da humanidade – somos apenas defensores do extermínio do Governo Netanyahu e seus comparsas fundamentalistas e psicopatas…”
E mandei meu ensaio ao ministro, às 07h51 de 1º de junho. Passados 55 minutos, ele respondeu às 08h46, ainda sem ter lido meu texto da Humanitas, numa curta mensagem de 79 palavras onde se definia como “judeu pacifista”. Três dias e 11h depois completada a leitura de meu ensaio, o ministro, com um desapontador silêncio sobre o ação criminosa de Israel em Gaza, respondeu em 4 de junho com uma defensiva mensagem de 32 linhas desqualificando minha comparação entre as tropas nazistas de Hitler e as israelenses de Netanyahu nos guetos de Varsóvia e Gaza como “absurda, sem qualquer sentido histórico, que soa militante”.
Para repor a verdade dos fatos e esclarecer dúvidas sem sentido histórico, fui obrigado a responder ao ministro, agora agindo como um militante sionista, numa mensagem mais didática de 550 linhas que enviei em 22 de junho passado, encerrando a questão. O texto da resposta tinha o título de “Carta a um Militante”.
A narrativa desses fatos aqui tem um único objetivo: mostrar a inacreditável, surpreendente dificuldade que muitos homens inteligentes, até mesmo judeus pacifistas, têm para reconhecer a barbárie e a violência sem sentido que choca o mundo e anima protestos nas maiores capitais do mundo – e até mesmo em Tel Aviv, onde a maioria progressista e democrática de Israel manifesta seu repúdio e exaustão com o governo mais extremista e violento de sua curta história de 76 anos. A seguir, a troca de mensagens:
1] O MINISTRO, ANTES DE LER O ENSAIO – 1/junho/2024 — 08h46
Bom dia, Luiz Claudio: vou ler e espero que a dura condenação a Israel e a seu terrível governo venha precedida de uma honesta e profunda crítica aos atos horrorosos feitos pelo Hamas em 7/10/23, quando tudo começou. Depois comento. Meus valores, não se preocupe, continuam os mesmos: judeu pacifista, repudiando a morte de civis não importa quem sejam e profundamente triste tanto com o desastre da guerra em Gaza, como na Ucrânia, na Síria, no Gabão, etc
2] O MINISTRO, DEPOIS DE LER O ENSAIO – 4/junho/2024 — 20h06
Caro Luiz Claudio,
Agradeço o texto que li com atenção. É desafiador resumir em um parágrafo a minha opinião sobre ele, dada a diversidade de suas partes.
A comparação com o nazismo, por exemplo, não tem qualquer sentido histórico e me parece, sinceramente, absurda.
Há partes interessantes, quando recuperas a biografia da família Netanayahu e faz um levantamento de comentários racistas de jornalistas e políticos israelenses. Interessante que aqui mesmo, em nosso Brasil, temos jornalistas e políticos que fazem comentários de todos os tipos e nem por isso ousaríamos dizer que os brasileiros são isso ou aquilo. O Einstein parece que tinha razão ao dizer que o exercício mais difícil que existe é o da generalização.
As comparações entre o que ocorre em Gaza com o Gueto de Varsóvia simplesmente não fazem qualquer sentido. Não me consta que embaixo da rua Mila, em Varsóvia, existisse algo minimamente proporcional aos 500 km de túneis com mais de 5 mil pontos de acesso que o Hamas construiu. O Hamas teve escolhas onde investir o dinheiro recebido (aproximadamente 1,3 bilhão de dólares), os meus patrícios seguramente não.
Os dados sobre a força militar em Gaza são uma boa apuração jornalística e parecem fazer sentido, mas novamente, a tentativa de comparar com a força aérea nazista soa militante. Não te ocorreu comparar com o bombardeio britânico sobre Dresden, cidade sem alvos militares? Eu também reagiria mal, só para constar.
Enfim, acho que nós judeus – não só os israelenses, mas também os judeus da diáspora, temos bons motivos para estarmos alertas para o crescimento do antissemitismo estrutural. Afinal, é um sentimento que nos persegue há mais de 3.000 anos e, vai ver, está no DNA. Meus antepassados foram expulsos de seus lugares de nascença e, felizmente, fomos muito bem acolhidos no Brasil onde nos assimilamos. Os israelenses não têm mesmo para onde ir.
Enfim, felizmente vivemos em uma democracia e podemos defender nossos pontos de vista e conversarmos sobre temas que discordamos, sem que isso signifique agressão pessoal.
Forte abraço
3] RÉPLICA AO MINISTRO – 22/junho/2024 — 16h05
Ministro, meu caro,
Sou muito grato a ti pela atenção dedicada e pela avaliação crítica ao meu longo texto sobre o genocídio em Gaza, circunstância reconhecida pela Corte Internacional de Justiça da ONU, em Haia, e pela consciência civilizada do mundo.
A relevância de tuas observações ganha destaque porque o mensageiro, além de meu amigo, é um homem inteligente, dono de sólida formação intelectual e invejável biografia pública e, mais importante, um “judeu pacifista”. Tudo isso me gratifica e honra.
Tua resposta ao meu texto, Ministro, apesar de tuas admiráveis credenciais, me decepciona. Não era o que esperava de um legítimo judeu pacifista, diante de tanta barbárie perpetrada pelo Terror de Estado de um governo obcecado pelo extremismo, gerido por psicopatas, orientado por fanáticos fundamentalistas e que se vale do terror contra crianças, mulheres e civis desarmados a pretexto de combater o terrorismo. É o que mundo vê, inerte e horrorizado, há oito meses.
Nossas posições e visões diante dessa tragédia abrem um portentoso, intransponível, lamentável abismo entre nós, Ministro. Fico triste que meu esforço doloroso de resumir esse drama em 21 mil palavras corajosamente agasalhadas em 94 páginas da Humanitas, a revista digital da Unisinos, buriladas ao longo de três meses de trabalhosa, angustiante pesquisa, tenha produzido apenas “partes interessantes”, aqui e ali, conforme tua implacável e reducionista sentença. Fico muito frustrado.
Sou obrigado a um derradeiro reparo, aqui, para ampliar, esclarecer ou justificar algumas de minhas informações, estribadas em fatos, e que não são o desabafo irrisório de um reles “militante”, como me carimbaste com um viés de condenação. Meus valores — não te preocupes, Ministro — não se confundem com os slogans fanáticos de um “militante ideológico”, se bem entendi. Sou de fato um militante, mas um militante consciente e irresignado dos direitos humanos, Ministro, como prova minha biografia e meu trabalho como repórter ao longo de meio século de jornalismo, sempre do lado certo da História.
Assim, vamos aos fatos:
A crítica ao terror do Hamas
Atendendo teus reclamos prévios, minha “dura condenação a Israel e seu terrível governo foi precedida de uma honesta e clara crítica aos atos horrorosos do Hamas em 7 de outubro”. Antes de falar das atrocidades industriais do terrível Netanyahu, eu carimbei o ataque do Hamas de “abominável” logo no início, na página 5 do meu texto, ao descrever a operação do Al-Qassam, “o braço armado e terrorista do Hamas”, autor do “maior e mais brutal ataque ao território de Israel desde a fundação, em 1948”.
Repito o que escrevi então: “Em poucas horas, em ação abominável, os terroristas massacraram quase 1.200 homens, mulheres e idosos, incluindo 33 crianças, numa operação que tinha como alvos indefesos civis israelenses, não militares. Quando retornaram a Gaza, os atacantes do Hamas levaram 240 reféns, incluindo 40 crianças. Foi o maior atentado terrorista no mundo desde o 11 de setembro de 2001…”
Escrevi mais: “A ação da brigada assassina do Hamas destravou a linguagem mais encanzinada da elite governante de Israel”… Na página 8, de novo, “o ataque terrorista do Hamas”. Na página 67, ao relatar a visita do correspondente brasileiro da CNN, América Martins, ao kibutz de Be’eri, eu lembrei: “Ali moravam 1.100 civis – e mais de 120 foram assassinados friamente pelo Hamas na manhã de sábado, 7 de outubro, com suas casas saqueadas e queimadas”. Uma releitura mais atenta e cuidadosa do meu texto, Ministro, vai te provar que meu trabalho não é obra de um militante, como chegaste a suspeitar. É apenas um exaustivo, honesto labor de um jornalista, militante dos direitos humanos, um repórter indignado com o terrorismo continuado de um Estado mergulhado e entrevado numa política segregacionista, extremista e sanguinária.
A simetria de Israel com o nazismo
Lamento meu fracasso em te demonstrar, por atos, fatos e fotos, que existe uma perfeita correlação entre o nazismo que massacrou o gueto de Varsóvia, 80 anos atrás, e a prática nazista que massacra agora o gueto de Gaza. Depois de uma extensa pesquisa sobre os 400 guetos que o III Reich disseminou pela Europa ocupada, concluí que o maior deles, justamente o da capital polonesa, tinha uma perfeita simetria com o enclave palestino. Ambos, tecnicamente, são guetos, local isolado ou cercado onde vive um grupo ou minoria étnica confinada ou discriminada. É o caso dos judeus de Varsóvia e também dos palestinos de Gaza. Assim, Ministro, o paralelismo entre um e outro tem um rigoroso sentido histórico e, como comparação, tem toda a lógica e coerência exigidas para uma precisa, decorosa reflexão. Para perceber a rombuda verdade de que aqui não existe nenhum absurdo, Ministro, basta não ser militante.
Percebo que estás solidamente entrincheirado contra a ousadia da comparação, Ministro. Mas, esse é um argumento útil e didático para o pensamento, que só não funciona nos limites estreitos da militância, de judeus ou de gentios. Uma boa explicação para as vantagens da comparação foi feita pela escritora e jornalista Masha Gessen, uma combativa e corajosa russa-americana, que cito no meu texto. Ela publicou na prestigiada revista The New Yorker, em 9 de dezembro de 2023, um luminoso ensaio de 17 páginas sob o título de “À Sombra do Holocausto”, que vale tua leitura, Ministro. Com a autoridade de ser uma judia que teve avós e bisavós mortos nos campos de extermínio do III Reich, Gessen vai ao osso da questão. Lá ela diz que tratar o massacre de judeus pelos nazistas como um “evento singular”, diferente de tudo o que ocorreu antes ou depois na História, é incorreto, pois torna “impossível aprender lições do Holocausto que são necessárias para prevenir futuros genocídios”. A expressão, diz Gessen, nos dá a palavra exata para expressar o que está acontecendo agora com o ataque de Netanyahu: “O gueto de Gaza está sendo exterminado”, diz ela, usando o mesmo termo que eu uso para definir o enclave sob ataque impiedoso de Israel. O subtítulo do ensaio de Gessen já é explícito: “Como a política da memória na Europa obscurece o que vemos hoje em Israel e em Gaza”.
A densa obra intelectual de Gessen acabou merecendo, em agosto de 2023, o Prêmio Hannah Arendt para o Pensamento Político, conferido pela Fundação Heinrich Böll (FHB), uma das instituições culturais mais importantes da Europa, ligada ao Partido Verde da Alemanha. Ao atribuir a distinção, a fundação definiu Gessen como “um “espírito crítico e pessoa com um grande amor pela liberdade e pela resistência contra tendências autoritárias”. Todo esse derramado elogio se dissolveu menos de quatro meses depois, em dezembro passado, quando ela publicou seu contundente ensaio na The New Yorker. A comparação com o nazismo enfureceu a patrocinadora do prêmio, assim como a comparação do meu texto te pareceu insensata e absurda, Ministro. A afirmação de que o gueto está sendo exterminado por Netanyahu nivelou tu, Ministro, e a fundação no mesmo patamar rebaixado de repulsa indignada: “É uma frase inaceitável, insinua que Israel trata Gaza como um gueto nazista”, protestou a Fundação Böll, ecoando quase com as mesmas palavras a tua condenação ao meu ensaio, Ministro. Quatro dias após a publicação do ensaio em Nova Iorque, a fundação na Alemanha capitulou em 13 de dezembro à sórdida pressão da influente Sociedade Alemã-Israelense (DIG, Deutsch-Israelische Gesellschaft, no original alemão), que representa a comunidade de 85 mil judeus que vivem no país. São números de 2018 do Berman Jewish Databank da Universidade de Stanford sobre a População Judaica Mundial, estudo coordenado por Sérgio Della Pergola na Universidade Hebraica de Jerusalém.
O valor didático da comparação
Gessen ensina, de maneira exemplar, porque a comparação — espinha dorsal de meu longo texto na Humanitas –– é um exercício inspirador e objetivo para o pensamento. Vale lembrar Gessen: “Por que comparamos? Comparamos para aprender. É assim que entendemos o mundo. Uma cor é uma cor apenas entre outras cores. Uma forma só é uma forma quando é distinta de outras formas. Um sentimento só é um sentimento se você tiver experimentado outros sentimentos. […] Temos linguagem, imagens, estatísticas que estão prontamente disponíveis para imaginar o Holocausto. Tornamos mais fácil para os outros evocar imagens comuns e até memórias do Holocausto. E, no entanto, existe uma regra – e certamente não é exclusiva da Alemanha – de não comparar as coisas com o Holocausto. Existe um paradoxo: imaginamos o Holocausto detalhadamente, mas concebemo-lo como fundamentalmente inimaginável. É o tipo de mal que não podemos compreender. Mas tudo o que acontece no presente é, por definição, imaginável. Podemos ver isso”.
Gessen observa que é justamente pela comparação — que tanto te incomodou, Ministro– que podemos acionar nossos alertas civilizatórios para manter a humanidade na rota certa que previne o mal e evita a barbárie. Diz Gessen: “O que mudou? A posição política mudou. A imaginação mudou. No início, não se sabia o que iria acontecer. Não se sabia que o Holocausto era possível. Nós sabemos. Não somos mais inteligentes, mais gentis, mais sábios ou mais morais do que as pessoas que viveram há noventa anos. É igualmente provável que renunciemos desnecessariamente ao nosso poder político e permaneçamos deliberadamente ignorantes da escuridão à medida que amanhece. Mas sabemos algo que eles não sabiam: sabemos que o Holocausto é possível.”
Os holocaustos da fome
Da mesma forma, Ministro, como tu sabes melhor do que eu, são os holocaustos da fome que nos dão a dimensão comparativa da tragédia da inanição na África profunda, na Etiópia e no Sudão, ou em Bangladesh e até no Brasil. Nesse campo é forçoso comparar com o Holodomor, a palavra ucraniana para “matar pela fome”, uma tragédia deliberada que o regime assassino de Stálin provocou na Ucrânia soviética em 1931-32. Ainda se discute, academicamente, qual a causa principal daquilo: um resultado da coletivização agrária forçada pelo estalinismo ou um artificio cruel de Stálin para sufocar um movimento de independência ucraniano. O certo é que uma declaração conjunta das Nações Unidas, assinada por 25 países em 2003, reconheceu que uma multidão entre 7 e 10 milhões de pessoas morreram no Holodomor – pela comparação, Ministro, uma cifra ainda maior e mais absurda do que o grotesco Holocausto nazista de 6 milhões de mortos. A comparação, aqui, não confunde, nem desinforma. Ao contrário, dá sentido, relevância e lógica ao pensamento. Como sabemos, Ministro, só um militante stalinista ou um rematado imbecil poderia ignorar a força dos fatos. Graças às comparações, sabemos agora que o Holocausto e o Holodomor, obras terrivelmente humanas e intrinsecamente desumanas, são historicamente possíveis. Só não se envergonham disso os militantes.
Como uma legítima militante sionista, a Sociedade Alemã-Israelense pressionou a Fundação Böll, que cancelou o prêmio a Gessen, retirando-se do evento, junto com a Câmara Municipal de Bremen. A festa triunfal prevista para dezembro passado em um salão lotado por mais de 400 pessoas foi confinada em uma saleta improvisada, estreita como um gueto, onde se amontoavam não mais do que 40 pessoas para a entrega envergonhada do prêmio – um rebaixamento que deixaria envergonhada a pensadora judia que dá nome à distinção. Hannah Arendt, por acaso, é a filósofa alemã que refletiu sobre o totalitarismo no Século 20 e a “banalidade do mal” que acabou gerando a serpente do nazismo.
O judeu sionista e terrorista
Ministro, tu lembras que Einstein alertava que o exercício mais difícil que existe é o da generalização. O teórico genial da relatividade certamente não generalizava, em 4 de dezembro de 1948, quando assinou com Hannah Arendt e outros 26 influentes judeus nos Estados Unidos uma carta aberta no The New York Times repudiando o desembarque na véspera, em Nova Iorque, do líder sionista Menachem Begin. No texto da carta, redigido por Arendt, está transcrito: “Entre os fenômenos políticos mais perturbadores dos nossos tempos está o surgimento, no recém-criado Estado de Israel, do ‘Partido da Liberdade’ (Tnuat Haherut ), um partido político estreitamente semelhante na sua organização, métodos, filosofia política e apelo social aos partidos nazistas e fascistas”. Com a força de pensadora, não de militante, Arendt lembrava que oito meses antes, em 9 de abril de 1948, três milícias sionistas atacaram a aldeia palestina de Deir Yassin, onde viviam 700 pessoas, nas cercanias de Jerusalém. Cerca de 250 homens, mulheres e crianças foram massacrados. Begin era o líder da mais violenta das milícias, o Irgun, sigla abreviada em hebraico da “Organização Militar Nacional na Terra de Israel” – na verdade, uma organização terrorista paramilitar sionista que combatia os britânicos na Palestina. O Irgun era, portanto, terrorista, como se diz hoje do Hamas. O extremista Begin foi primeiro-ministro de Israel (1977-1983) e ainda abocanhou, sem constrangimento, o Prêmio Nobel da Paz de 1978. Três décadas antes, ainda antes da criação de Israel, Begin, o líder terrorista do Irgun, arquitetou e comandou o abominável ataque ao Hotel King David, na cidade antiga de Jerusalém: um agente do Irgun entrou no hotel, carregando explosivos ocultos em caixas de leite. A explosão de 22 julho de 1946 matou 28 britânicos, 41 árabes, 17 patrícios judeus e outras cinco pessoas, além de produzir 45 feridos graves. O Irgun terrorista de Begin deu origem ao Likud, o partido extremista que hoje tem Netanyahu como seu mais implacável integrante. O Hamas, como se vê, teve ilustres antecedentes, Ministro. E eu, como Einstein, não gosto de generalização…
Os túneis da resistência
Ministro, não te consta que debaixo da rua Mila, no gueto de Varsóvia, existisse “algo minimamente proporcional aos 500 km de túneis com mais de 5 mil pontos de acesso que o Hamas construiu”. Como conhecedor da precisão básica dos números, Ministro, sabes bem que não se pode sofismar com a matemática. No exíguo espaço de 3 km² em que os nazistas confinaram quase 400 mil judeus, é materialmente impossível construir algo, mesmo “minimamente proporcional”, aos 500 km de túneis que existem em Gaza. Na verdade, não eram túneis construídos no subsolo de Varsóvia, mas a rede de esgotos original que os judeus usavam para se deslocar de forma mais segura, nos poucos dias que ali sobreviviam, desde outubro de 1940, quando os nazistas inventaram o gueto, cercado no mês seguinte (novembro) pelo muro de tijolos de 3 metros de altura. O ‘Levante de Varsóvia’ — expressão do desespero da resistência judaica ao perceber que os trens que saíam dali paravam a 106 km da capital, numa estação chamada Treblinka, para uma escala sem volta e sem esperança – explodiu em 18 de janeiro de 1943. Era humanamente impossível construir em tão pouco tempo uma rede tão extensa de túneis, mesmo proporcional, para resistir aos opressores. Portanto, tua comparação aqui, Ministro, é absurda e sem sentido.
De forma insidiosa, Ministro, tu sugeres que o Hamas teve “escolhas melhores para investir o US$ 1,3 bilhão recebido” (?) do que construir túneis, conforme tua insinuação. Eu não insinuo, Ministro, eu informo que o muro colossal de concreto, com seis metros de altura e 65 km de extensão para o cerco a Gaza levou três anos para ser erguido, inaugurado por Israel em 2021 ao custo de mais de US$ 800 milhões. E a finalidade da rede subterrânea de túneis de Gaza, é bom esclarecer, não era o terror, mas a resistência – como também perceberam os judeus da resistência em Varsóvia. Pelos túneis de Gaza circulam primordialmente medicamentos, suprimentos de sobrevivência e alimentos, contrabandeados do exterior para ludibriar o cerco militar impenitente que obriga a sitiada Gaza a transitar bens essenciais pelo subsolo para fugir da dura repressão militar israelense à flor da terra — e da pele.
A mesada de Washington para a barbárie
Ministro, é mais fácil entender, e mais difícil de justificar, o suprimento letal de armas e tecnologia que Israel recebe aos bilhões de dólares, todo ano, de seu maior sustentáculo militar. Segundo um relatório do Congresso americano de março de 2022, sobre o US Foreign Aid to Israel, com dados dos Departamentos de Estado e de Defesa, o total de ajuda exclusivamente militar dos Estados Unidos a Israel, no período de 1946 (dois anos antes da criação do Estado) a 2003 chega a US$ 114,4 bilhões, sem a correção da inflação. Com mais US$ 10 bilhões só no programa de mísseis e outros US$ 34,3 de ajuda econômica, o tubo de oxigenação norte-americano que faz Israel respirar supera os US$ 158,6 bilhões, sem o reajuste da inflação. Em 1987, no segundo Governo Reagan, os Estados Unidos promoveram Israel à rara condição de “principal aliado fora da OTAN”. Israel se junta assim a outros 18 países do mundo, três do Golfo Pérsico (Qatar, Bahrein e Kuwait) e três da América do Sul (Argentina, Colômbia e Brasil) — gentileza em 2019 de Donald Trump ao seu adorador brasileiro, Jair Bolsonaro. O capitão, aliás, é um grande, fraterno amigo de Netanyahu. Esse trio, convenhamos, se merece…
Israel é o maior destinatário de ajuda cumulativa dos EUA no mundo. E essa fonte é cada vez mais generosa. Em 1999 um Memorando de Entendimento garantiu aos menos US$ 2,67 bilhão de ajuda militar por ano, nos dez anos seguintes. Em 2009, a mesada da década aumentou para US$ 3 bilhões. Agora, a mesada anual elevou-se para US$ 3,8 bilhões. Os teus patrícios, Ministro, certamente, tiveram e têm muitas escolhas onde investir toda essa fortuna a fundo perdido. O povo massacrado de Gaza pode te informar com mais precisão onde recaiu a parte bombástica dessas escolhas.
Dresden, Gaza e outras imoralidades
Eu também pensei como tu, Ministro, na barbárie aliada dos bombardeios sobre Dresden, a bela capital da Saxônia, com mais de 650 mil habitantes, então conhecida como a ‘Caixa de Joias’ da Alemanha por sua riqueza cultural e arquitetônica do barroco e do rococó. Penso principalmente no maior dos bombardeios, os quatro ataques de 13 e 15 de fevereiro de 1945, quando 1.300 bombardeiros pesados da RAF e da USAF despejaram 3.900 toneladas de bombas em três ondas de ataque, arrasando 40 km² da cidade, inclusive as joias barrocas do centro histórico, matando cerca de 25 mil pessoas.
A primeira onda de bombardeiros Lancaster da RAF, que chegou às 22h13 da noite de 13 de fevereiro, jogou bombas de magnésio que tinham a função de atear incêndios que iluminariam os alvos para as ondas seguintes. Veio em seguida a frota de mais 254 Lancasters com sua carga mortal de 500 toneladas de bombas de alta explosão e outras 375 toneladas de bombas incendiárias, algumas delas pesando 1.840 kg. Tinham o poder de chegar ao subsolo e destruir a rede hidráulica, tornando impossível aos bombeiros combater os incêndios da superfície. O fogo ateado com tanta sofisticação técnica criava vórtices de chamas incontroláveis que sugavam todo o oxigênio e matavam as pessoas por sufocamento, antes de incinerá-las, gerando funis de fogo e de ar quente ascendente que chegavam a quase 500 metros de altura. Foi uma ação tão bestial que causou constrangimento e reação nas lideranças civis da Inglaterra e EUA. Churchill foi obrigado a determinar maior contenção ao chefe do Comando Aéreo, general Hasting Ismay, reconhecendo: “Parece-me que chegou o momento em que a questão do bombardeamento de cidades alemãs simplesmente para aumentar o terror, embora sob outros pretextos, deveria ser revista. Caso contrário, assumiremos o controle de uma terra totalmente arruinada…”
Dresden permanece como um ato imoral, um crime de guerra, um ‘holocausto de bombas’, como reconhecem historiadores do Reino Unido e dos EUA. Uma ação letal tão condenável quanto os bombardeios dizimando populações civis, incluindo mulheres e crianças, como aconteceu em Tóquio, Hiroshima e Nagasaki… e continua acontecendo em Gaza. O ataque devastador a Dresden, dois meses antes do suicídio de Hitler, ocorreu quando as forças nazistas já recuavam em todas as frentes. Em 8 de fevereiro, cinco dias antes da primeira incursão aérea a Dresden, o exército soviético tinha cruzado o rio Oder, chegando a 70 km de Berlim. Não havia, aparentemente, nenhuma justificativa militar para sustentar tamanha devastação nos estertores do conflito mundial. Mas os aliados sustentam que havia…
O pretexto para atacar Dresden
As inteligências britânica e americana — ao contrário de ti, Ministro– garantem que Dresden era sim um alvo militar. Quando Churchill chegou a Yalta, na Crimeia, para a conferência de cúpula com Roosevelt e Stálin, em 4 de fevereiro de 1945, foi alvejado na primeira pergunta pelo líder soviético: “Por que vocês ainda não bombardearam Dresden?”. O britânico respondeu apenas que o ataque era iminente, sem revelar que ele aconteceria em apenas nove dias. Stálin estava preocupado com as ramificações ferroviárias que tornavam Dresden um centro estratégico de redistribuição de tropas alemãs para o fronte oriental, onde avançavam as divisões soviéticas.
Segundo a RAF, Dresden era a sétima maior cidade alemã e a maior concentração urbana ainda intocada pelos bombardeios. Em 1944, o escritório de armamentos do Alto Comando do Exército nazista listava 127 fábricas de médio e grande porte e oficinas que supriam a Wehrmacht com material bélico. Em um relatório que permaneceu classificado até dezembro de 1978, 33 anos após o final da II Guerra Mundial, a Divisão Histórica da Força Aérea dos EUA tentou responder à preocupação internacional sobre o bombardeio – e a tua também, Ministro. Lá dizia que havia em Dresden 110 fábricas e 50.000 trabalhadores na cidade apoiando o derradeiro esforço de guerra alemão no momento do ataque. Segundo o relatório, havia fábricas de componentes para aeronaves; uma fábrica de gases venenosos (Chemische Fabrik Goye); uma fábrica de armas antiaéreas e de campo (Lehman); uma fábrica de produtos ópticos (Zeiss Ikon AG); fábricas que produziam aparelhos elétricos e de raios X (Koch & Sterzel [de] AG); engrenagens e diferenciais (Saxoniswerke); e medidores elétricos (Gebrüder Bassler). O relatório também mencionava quartéis, acampamentos e um depósito de armazenamento de munições.
A crônica assassina dos ‘bombardeios de terror’ (terror bombs), que tem em Gaza agora sua expressão mais horrenda e atual, inaugura a fase dos alvos civis em concentrações urbanas que, a pretexto de objetivos militares, tentava quebrar a moral do inimigo pelo extermínio de populações supostamente imunes ao braço longo do terror. A estreia nessa lista de horrores cabe à pequena Guernica, cidade de quase 700 anos no País Basco, que entrou para a História como o primeiro alvo urbano de um ataque terrorista de um Estado miitarizado. Em 26 de abril de 1937, 24 bombardeiros da Legião Condor da Luftwaffe nazista jogaram ali 22 toneladas de bombas, matando 1.600 de seus cinco mil habitantes. Era apenas um laboratório para experimentar a eficiência dos aviões e das táticas da blitzkrieg que a Força Aérea de Hermann Göring usaria a partir de setembro de 1939 na invasão da Polônia, início da II WW.
Entre maio de 1940 e setembro de 1944, de Abbeville a Saint-Julien de Crempse, aconteceram 20 massacres de civis em cidades da França ocupada. Mas nenhum foi pior do que o de Oradour-sur-Glane, uma pequena comuna de pouco mais de mil habitantes na região central da França. Em 10 de junho de 1944, quatro dias após o Dia D da Normandia, uma companhia da Segunda Divisão Panzer, da Waffen-SS, cercou a cidade e colocou toda a população na praça, na busca de um oficial nazista sequestrado pela Resistência. Os 195 homens fora separados num celeiro e as 452 mulheres e crianças encerradas na igreja. Os homens foram fuzilados e a igreja foi queimada, com as mulheres e crianças trancafiadas. Só seis pessoas, uma delas mulher, sobreviveram ao pior massacre nazista na França. De Gaulle, depois da guerra, determinou que as ruínas de Oradour-sur-Glane ficassem intactas, como um memorial permanente da barbárie.
O pior bombardeio da guerra
Não falei de Dresden, Ministro, mas falo de um absurdo maior na escalada de bombardeios aliados no final da guerra. Pforzheim, uma cidade com 80 mil habitantes no sudoeste da Alemanha, nas cercanias de Stuttgart, sofreu um ataque devastador de 22 minutos de 379 bombardeiros da RAF na noite de 23 de fevereiro de 1945, quando o fim do Reich estava ainda mais próximo. Em instantes, morreram ali 18 mil pessoas, um quarto da população, e 83% dos prédios da cidade foram pulverizados. Proporcionalmente, foi a maior destruição, em vidas e casas, de uma única cidade na guerra. Havia, como sempre, um pretexto para justificar a barbárie: um relatório do Comando de Bombardeiros da RAF, de 28 de junho de 1944, afirmava que Pforzheim era um dos centros do comércio alemão de joalheria e relojoaria e, portanto, “provavelmente tornou-se de considerável importância para a produção de instrumentos de precisão”. Assim mesmo, com essa flagrante ambiguidade, forte incerteza militar e clara imprecisão, Pforzheim virou o alvo civil mais arrasado pelos aliados na Alemanha. Mais ou menos o que faz Israel, hoje, ao banalizar a morte de 38 mil civis, a maioria mulheres e crianças, como sendo alvos colaterais do terrorismo… Netanyahu massacra e a culpa é do Hamas!…
Estranho muito, Ministro, que te pareça “militante” a comparação que faço entre as forças aéreas do Reich nazista e de Israel sionista. Ela faz todo o sentido e vou mostrar, para teu espanto, que o poderio letal da força aérea de Netanyahu é ainda maior do que o da Luftwaffe de Hitler. Vou demonstrar isso, Ministro, com a ajuda de meu maior heroi na História, um jornalista beberrão, conservador, anticomunista ferrenho, irônico, mordaz, o artesão incomparável de mais de 5 milhões de palavras disseminadas com esmero e brilho por centenas de livros e artigos magistrais e outro tanto de discursos memoráveis pela relevância histórica e pelo vigor intelectual: Winston Churchill, o maior britânico de todos os tempos, segundo eleição da BBC em 2002, à frente de gigantes como Charles Darwin, Shakespeare, Isaac Newton, Horatio Nelson e John Lennon.
Na sua inspiradora fala de 18 de junho de 1940 ao Parlamento, “A hora mais gloriosa”, Churchill deu ao mundo a prova cabal de sua férrea determinação de enfrentar o monstro nazista. Duas semanas antes, acontecera o milagre de Dunquerque, quando mais de 300 mil soldados foram evacuados e salvos do cerco fatal por uma improvisada frota de botes e barcos pesqueiros. Uma semana após assumir o posto de premiê, em 10 de maio, alertou Churchill: “Hitler sabe que ele precisa nos derrotar nesta ilha ou perderá a guerra. Se nós pudermos resistir a ele, toda a Europa poderá ser libertada e a vida do mundo seguirá adiante para amplas e ensolaradas terras. Mas, se nós falharmos, então todo o mundo, incluindo os Estados Unidos, incluindo tudo o que conhecemos e amamos, afundará num abismo de uma era sombria feita do que há de mais sinistro, e talvez mais prolongado, devido às luzes da ciência pervertida.”
A ciência pervertida de Netanyahu
Como antecipou Churchill, as luzes da ciência pervertida, em sua evolução tecnológica imparável ao longo de oito décadas, agora suprida pela sofisticação da cibernética e da mecânica quântica, produziu avanços nunca imaginados nos aparatos de guerra. A miniaturização concentrou capacidades e ampliou funcionalidades que antes exigiam espaço, peso e tempo, reduzidos agora num dispositivo letal que garante uma ação coordenada mais rápida, mais destrutiva — e, portanto, mais perversa. Um bom exemplo, Ministro, está no campo nuclear.
A primeira bomba atômica, a Little Boy — que pulverizou em Hiroshima 120 mil pessoas de forma instantânea, às 8h15 da manhã ensolarada de 6 de agosto de 1945, e matou um total de 242.437 pessoas ao longo dos anos, por efeito de doenças e efeitos cumulativos da radiação –, era um monstrengo ainda mais feio da ciência pervertida: pesava mais de quatro toneladas (exatos 4.400 kg) contidas em seu rotundo formato de 3 metros de comprimento. Hoje, um único avião da Força Aérea de Netanyahu, o F-35, o caça múltiplo e furtivo mais moderno do mundo, custo unitário de R$ 400 milhões, carrega — além dos mísseis e artefatos de praxe – não uma, mas duas bombas termonucleares B-61. Ela é um prodígio tecnológico na sofisticada arte de matar, que Netanyahu conhece e domina. Cada bomba pesa apenas 320 kg, dez vezes menos do que a gorda bomba de Hiroshima. A Federação Americana de Cientistas reconheceu em 2012 que a B-61 vale mais do que o seu peso em ouro: cada uma custa módicos US$ 28 milhões. Apesar de esbelta, tem um poder de fogo 22 vezes maior do que o artefato pioneiro de Hiroshima em seu esguio corpo de 3,6 metros de comprimento: a B-61 explode com a força de destruição de 340 quilotons (cada quiloton vale 1.000 toneladas de TNT), uma letalidade humilhante para o modesto poderio de 15 quilotons da Little Boy. Além de ser compacta e destruidora, a B-61 é uma bomba nuclear por gravidade — cai verticalmente sobre o alvo, como a de Hiroshima, e não na ogiva de um míssil que se desloca horizontalmente até cair sobre o objetivo.
Antes que tu me acuses de outra comparação absurda, sem sentido, ilógica, de teor militante, Ministro, quero te alertar que esse paralelo não é maluquice minha, mas uma sensata simetria a partir da afirmação de um insensato, desatinado, tresloucado ministro e comparsa de Netanyahu. Um demente chamado Amichai Eliyahu — da irrelevante pasta do Patrimônio e integrante do extremado e irrisório Otzma Yehudit, partido de fanáticos fascistas, racistas e ultranacionalistas com apenas 6 das 120 cadeiras do Knesset — deu em novembro de 2023, um mês após o ataque do Hamas, uma bombástica entrevista à rádio Kol Berama, uma estação religiosa como tantas do teocrático Israel. Disse o imbecil Eliyahu: “O uso da bomba nuclear na Faixa de Gaza é uma opção. Não existe essa coisa de que civis não estão envolvidos com o terror em Gaza”. Em vez de demitir o cretino genocida com humilhação, o cúmplice Netanyahu se limitou a um ameno cartão amarelo – e suspendeu o maluquete só por uns tempos das reuniões do gabinete…
O dedo nuclear de Netanyahu
Não era uma piadinha de mau gosto do ministro exterminador, Ministro. Sempre cínico, Israel até hoje insiste oficialmente que não possui nenhum artefato nuclear. Uma mentira refutada em 2023 pela ONG norueguesa Norsk Folkehjelp. No seu respeitado relatório Nuclear Weapons Ban, que apontou o aumento de ogivas nucleares operacionais no mundo em 2022, Israel aparece como a oitava potência nuclear do planeta, com 90 ogivas. Os líderes desse ranking insano, com um total de 12.853 bombas e capacidade de destruição equivalente a 135 mil Little Boy de Hiroshima, são Rússia (5.977 ogivas) e Estados Unidos (5.550), donos de 90% do arsenal. Para não deixar dúvidas, o doidinho Eliyahu voltou a vomitar sandices em janeiro de 2024, quando a Corte Internacional de Justiça deliberava em Haia sobre a evidente ação de genocídio israelense em Gaza. Com ar de provocação, ele repetiu a proposta estúpida: “Mesmo em Haia eles conhecem minha posição… Lançar uma bomba nuclear na Faixa de Gaza é uma opção!”. Desta vez, o Netanyahu canalha calado estava e calado ficou, consentindo pelo silêncio com o desvario. O absurdo desse quadro patético, Ministro, é que agora Israel tem o meio (o caça F-35) e tem o instrumento (a bomba B-61) para consumar a tragédia. Só faltava o dedo de um assassino como Netanyahu. Agora não falta mais…
Como queria demonstrar, Ministro, Israel possui um único e imbatível avião de guerra que a Luftwaffe de Hitler nunca teve. Isso não soa nada militante… Além do fato inegável de que o III Reich nunca teve uma bomba nuclear, ao contrário das 90 ogivas que Israel mantém em seu arsenal, o governo de Tel Aviv reforçou seu equipamento aéreo com a compra no início deste mês, 4 de junho, de mais 25 caças F-35, um pacote de US$ 3 bilhões que é bem mais expressivo do que o US$ 1,3 bilhão supostamente recebido (?) pelo Hamas. Israel é o único país do Oriente Médio que opera o F-35, desde 2016, e agora terá uma frota aérea de 75 caças F-35, a sexta maior do mundo nesse tipo assustador de avião de guerra.
A força aérea que humilha a Luftwaffe
Com um poder de fogo insuperável, graças à sua frota de 700 aeronaves de vários modelos avançados e elevada sofisticação eletrônica, Israel simplesmente derrubaria qualquer uma das 120 mil aeronaves da Luftwaffe que integraram a força aérea de Hitler ao longo dos seis anos da II Guerra Mundial. Nem o revolucionário Messerschmitt ME 262, o primeiro caça a jato do mundo, que o Reich de Hitler botou em ação em 1944, já nos estertores da guerra, seria páreo para a destruidora força aérea de Israel de Netanyahu. O ME 262 voava a lerdos 900 km por hora, com um raio de alcance de 1.000 km, uma tartaruga aérea diante do furtivo e rápido F-35, com sua velocidade de 1.300 km horários (mais rápido do que o som) e alcance de 2.200 km. O avião mais letal de Hitler era, desde 1937, dois anos antes da guerra, o Messerschmitt BF-109, o caça mais produzido na história, com a marca de 34.248 aviões fabricados até o final do conflito, em 1945. Ele derrubou mais de 15 mil aviões aliados, e 105 ases da Luftwaffe ganharam a glória com o BF-109, abatendo cada um deles pelo menos 100 aeronaves inimigas.
Um hipotético confronto entre um BF-109 e um F-35 seria algo como a disputa aérea entre o David nazista e o Golias israelense. O caça alemão não superava os 640 km horários, menos da metade do super-caça israelense, que era mais do que duas vezes mais rápido, com seus 1.300 km por hora. O alemão carregava uma única e miserável bomba de 250 kg ou quatro de 50 kg, e o israelense leva 2.600 kg de bombas sob as asas e mais 8.200 kg de explosivos sob a fuselagem. Sem falar nas duas poderosas B-61, a bomba nuclear que Hitler, felizmente, nunca teve… Minha tentativa de comparar com a força aérea nazista, portanto, nada tem de militante, Ministro. É apenas reverência aos fatos e à inteligência. E uma triste constatação de que a ciência, como os homens da laia de Netanyahu, continua pervertida.
O Domo de Ferro das palavras
Ministro, chegamos ao longevo sentimento do antissemitismo, impregnado por justas razões históricas no DNA dos judeus de Israel e da diáspora. Mas o exagero, aqui, soa como militante. Como disse no meu longo texto na Humanitas, Israel criou um poderoso ‘Domo de Ferro’ para proteger o país dos ataques inimigos. Mas, com ele, criou-se também um falacioso ‘Domo de Ferro Retórico’, que transforma toda e qualquer crítica às ações extremistas de Tel-Aviv como manifestação antissemita. Como se o mundo civilizado, racional e progressista, ao contrário dos meliantes que integram o terrível governo de Netanyahu, fosse um bando ressuscitado de nazistas imbecis que pregam, outra vez, o extermínio judeu. Uma sandice que só pode ser explicada pela falta de argumentos sérios, inteligentes e honestos para rebater as críticas merecidas que recaem sobre o governo mais extremista e delinquente que já apareceu em Israel. Críticas que partem inclusive da indignada maioria democrática e progressista de Israel que em breve, espero, mais cedo do que se imagina, vai exterminar o governo genocida de Netanyahu…
A aversão endêmica às críticas, que está no DNA autoritário e fascista da pandilha ignóbil e fundamentalista de Bibi e sua corja, gerou esse inacreditável domo palavroso que se refugia na falácia do “antissemitismo estrutural” para rebater a condenação crescente do mundo horrorizado com a barbárie continuada de Israel e sua máquina de guerra sobre a sitiada e massacrada população civil da Palestina. Ao contrário do ‘Domo de Ferro’ antimíssil que protege os céus do exíguo território israelense – alargado ilegalmente à custa da ocupação, da espoliação e da anexação de terras dos palestinos –, o ‘Domo de Ferro retórico’ tem amplitude planetária e é acionado sempre e em qualquer lugar onde os militantes sionistas, cegos e surdos para o Terror de Estado de Israel, tentam justificar o injustificável ou perdoar o imperdoável. Quando nada disso funciona, as brigadas sionistas, em Israel ou na diáspora, apelam para o jogo bruto da censura, do silenciamento ou da patrulha ideológica. Coisa estúpida de militante, Ministro!…
Isso aconteceu com a pressão asquerosa da Sociedade Alemã-Israelense, que pressionou a Fundação Böll para desqualificar a entrega do prêmio Hannah Arendt para a lúcida jornalista judia Masha Gessen. Isso acontece com o infame Cláudio Lottenberg, presidente da militante Confederação Israelita Brasileira (Conib), que persegue o jornalista judeu Breno Altman, editor do site progressista Opera Mundi, tentando bloquear seus textos críticos na internet, suprimir suas entrevistas e pedindo até sua prisão. Isso aconteceu agora com a Federação Israelita gaúcha, indignada com o meu texto contundente na Humanitas. A entidade fez uma forte pressão para eliminar o meu texto da revista digital da Unisinos e ficou ainda mais indignada com a live que a universidade fez comigo e com o ex-reitor da UnB. A irritação maior da FIRS foi com o título do evento: “Genocídio em Gaza”. A reitoria da Unisinos resistiu bravamente ao apelo beócio para cancelar a Iive e expurgar meu texto. Elegante, a universidade ofereceu um lugar para a federação participar do debate e defender o indefensável. Como de hábito, a entidade judaica recusou o convite e se refugiou no burocrático ‘domo de ferro palavroso’: uma nota oficial, previsível, boboca e inócua, acusando tudo e todos de “antissemitismo”. Coisa de militante, Ministro!…
A mesma reação psicopata acontece agora em Israel, com a blitz do genocida Bibi contra a imprensa livre. Incapaz de refrear suas hordas assassinas, Netanyahu resolveu atacar o mensageiro que denuncia sua política deliberada de assassinato. Começou proibindo a ação em solo israelense da brava rede de TV Al Jazeera, do Qatar, que faz uma cobertura prodigiosa, comovente do massacre em Gaza, ecoando o desespero das vítimas e exibindo as imagens dramáticas e sangrentas — que não se vê em nenhuma outra rede de TV –produzidas pela máquina de guerra de Bibi. Ele proibiu o trabalho da Al Jazeera e expropriou seus equipamentos. Isso parece, aos matadores, mais simples e lógico do que parar a matança.
Israel, não o Hamas, sustenta o terror
Os cavaleiros do apocalipse de Netanyahu também investiram, numa louca atropelada, contra o Haaretz, o mais influente e lido jornal israelense no mundo, o único diário de esquerda no país dominado pelo Likud, o partido de Netanyahu e, portanto, da direita mais conservadora e homicida. Na reação típica dos regimes autoritários e militaristas, o governo apertou um torniquete financeiro, bloqueando canais de financiamento, vetando anúncios e suprimindo qualquer acesso aos repórteres do jornal. Como no caso da Al Jazeera, carimbada como “defensora dos terroristas do Hamas”, o Haaretz foi identificado como “um porta-voz inflamado dos inimigos de Israel, com propaganda derrotista e falsa durante a guerra”. Nada poderia soar mais militante. A boçalidade institucional do governo de Tel Aviv levou o fundador e editor do jornal, Amos Schoken, 78 anos, a produzir uma das frases mais brilhantes e definitivas sobre o ancestral conflito entre os regimes autoritários e a imprensa aguerrida que combate seus excessos e patifarias: “Se o governo quer fechar o Haaretz, isso significa que é hora de ler o Haaretz !”.
Finalmente, Ministro, quero encerrar voltando à primeira frase de tua mensagem de 1º de junho, quando confirmaste o recebimento do meu texto da Humanitas e das duas lives sobre o tema. Em tom de crítica antecipada, fizeste um alerta prévio: “…espero que a dura condenação a Israel e a seu terrível governo venha precedida de uma honesta e profunda crítica aos atos horrorosos feitos pelo Hamas em 7/10/23, quando tudo começou.”.
Errado, Ministro! Essa tragédia não começou naquele sábado, 7 de outubro, com o abominável ataque do Hamas. Mais justo e mais preciso do que tu, Ministro, foi o português António Guterres, o destemido secretário-geral da ONU. Em 24 de outubro, duas semanas após o ataque, ele desprezou as firulas diplomáticas para dizer a dura verdade que tu esqueceste: “É importante reconhecer que os atos do Hamas não aconteceram por acaso. O povo palestino foi submetido a 56 anos de uma ocupação sufocante. Eles viram suas terras serem brutalmente tomadas e varridas pela violência. A economia sofreu, as pessoas ficaram desabrigadas e suas casas foram demolidas”, lembrou Guterres, com aguda e honesta percepção histórica.
Ele se referia à Guerra dos Seis Dias, de 1967, quando Israel aproveitou sua esmagadora vitória contra Egito, Síria e Jordânia para anexar a Península do Sinai, a Faixa de Gaza, a Cisjordânia, Jerusalém e as colinas de Golã. Assim transbordando suas fronteiras e eternizando o conflito da Palestina, com ampliações territoriais que afrontam e desobedecem a sucessivas resoluções da ONU. Israel, num processo de deterioração moral que se agravou na gestão criminosa de Netanyahu, transformou-se num Estado bandoleiro e marginal, sem respeito à ordem internacional e contumaz violador de normas básicas do direito das nações e dos princípios humanitários, que tudo faz e nada respeita pelo declarado autoprincípio do “direito de defesa” e do uso sem limites do Terror de Estado a pretexto do combate inclemente ao terrorismo. A conclusão lógica, segundo a precisa denúncia de Guterres, é a de que Israel é que alimenta e inspira há meio século a resistência que agora, com o Hamas, descamba – no limite – para o terrorismo. O ataque covarde de 7 de outubro é um ato de barbárie que nunca se justifica, mas que se explica pela continuada, renitente, teimosa postura de crescente espoliação territorial adotada por Israel, que reduziu a ocupada Palestina a 20% de seu território original.
Neste sábado, 22 de junho, chegamos ao dia 260 da guerra de Israel contra Gaza, não contra o Hamas… A guerra do Hamas aconteceu apenas no primeiro dia, 7 de outubro, quando o grupo extremista cometeu o execrável massacre 1.200 civis, mulheres e crianças e voltou para Gaza com 240 reféns. Os outros 259 dias seguintes, Ministro, se transformaram na continuada, sangrenta, impiedosa, irracional, bárbara guerra de Israel contra Gaza, massacrando, expulsando, bombardeando e exterminando uma população aterrorizada de dois milhões de pessoas, exercendo na plenitude os talentos e funcionalidades de seu imbatível caça F-35. Essa postura infame, que ataca hospitais, escolas, mesquitas, campos de refugiados, abrigos da ONU e centros humanitários já produziu mais de 37 mil mortos civis, especialmente mulheres e crianças. E o massacre nunca cessa. Ou devemos acreditar, Ministro, que essa multidão assassinada é integralmente formada por terroristas, já que o olho preciso e a pontaria certeira de Israel nunca erram o alvo?… Nem o militante mais fanático acredita nessa bobagem, Ministro…
O terrorismo, há mais de oito meses, é a prática genocida de Israel em Gaza, não do acuado Hamas. Só um radical aloprado ou um extremista bíblico vai concordar que a investida militar desatinada e desalmada sobre a população civil de Gaza tem a justificativa supostamente moral de que ali apenas se combate o terrorismo do Hamas. Ou tu também achas, como os dementes de Israel, que não existem civis inocentes entre os dois milhões de habitantes em Gaza, mas apenas terroristas? Mais do que um homem inteligente, Ministro, ainda acredito plenamente que és um judeu pacifista — e consciente.
Ódio e nojo a Netanyahu e sua laia
Como militante dos direitos humanos, Ministro, tenho nojo — nojo e ódio, como dizia o mestre Ulysses Guimarães — de gente ignorante, estúpida e/ou fascista como Netanyahu, Putin, Trump, Bolsonaro e outros da mesma súcia. Como digo na abertura do meu longo texto, Ministro, e reafirmo aqui, nada justifica a brutal metamorfose que, produziu a dramática inversão de papéis dos judeus atacados no Gueto de Varsóvia para os judeus atacantes no Gueto de Gaza – a inacreditável degeneração do judeu perseguido para o vergonhoso papel de judeu perseguidor –, que marca talvez o pior retrocesso moral e ético dos princípios civilizatórios de um povo no curto espaço das últimas oito décadas da Humanidade. A vítima transformada em algoz e, pior, usando agora os mesmos métodos nazistas que horrorizaram o mundo, em Varsóvia, e voltam a aterrorizar a consciência do planeta em Gaza.
Estou decepcionado por ser obrigado a esse duro esforço intelectual para repetir todas essas obviedades, Ministro, pois não esperava ver um judeu pacifista como tu em posição oposta, na inacreditável defesa de coisas que me parecem tão claras e insuportáveis.
Dou por encerrado, aqui, esse debate inútil e inconcluso, porque percebi que sairemos ambos frustrados desse embate. Eu não vou te convencer da estupidez de Netanyahu e seus marginais, e tu não vais conseguir o contrário.
Assim, em nome de nossa amizade — e graças à democracia que temos aqui no Brasil e que inexiste em Israel — um Estado terrorista que pratica o apartheid racial, a exclusão social, a espoliação territorial e a colonização forçada –, é mais conveniente botar um ponto final nessa causa perdida pela insensatez.
Acho que nem tu, nem eu, temos tempo e disposição para tentar uma conciliação impossível em questões e diferenças tão inconciliáveis. Confesso, frustrado, que não esperava jamais te encontrar nessa deplorável condição de pétreo militante desse sionismo sem travas e sem escrúpulos que mata mulheres, crianças e civis desarmados, desonrando toda a mística de sofrimento que resume a saga dos judeus na História.
Um forte abraço, Ministro.
Educado, como deve ser um judeu pacifista, o Ministro atendeu meu apelo e não perdeu tempo com uma resposta, de resto impossível.
Perdi o interlocutor e, pelo jeito, o amigo.
Eu me consolo por saber que, ao contrário do Ministro, estou do lado certo da História.
Luiz Cláudio Cunha, jornalista, foi consultor da Comissão Nacional da Verdade em 2012-14.
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