O renomado professor Milton Santos, em seus estudos sobre globalização, alertava para o fato de que, se o processo tivesse a capacidade de aproximar povos e culturas distantes, poderia, por outro lado, fazer reaparecer movimentos de xenofobia e de racismo aparentemente eliminados.
Infelizmente, suas previsões se confirmaram. Refugiados, imigrantes, aqueles em deslocamento colecionam frequentemente relatos e denúncias de violências que se manifestam de diversas maneiras. A violência cotidiana da intolerância, das ofensas gratuitas, do desemprego, da falta de oportunidade, da exclusão, das agressões psicológicas e físicas e até os assassinatos e linchamentos, que envergonham aqueles capazes de reconhecer a humanidade intrínseca em cada ser humano.
A questão dos refugiados no mundo ganha contornos cada vez mais dramáticos. Além dos graves problemas nas suas áreas de origem, ainda existem aqueles enfrentados nos locais para onde se deslocam. Entre esses problemas, destacam-se as diferenças culturais, as dificuldades com idiomas, a busca por emprego e, principalmente, a xenofobia praticada pela população residente nas áreas de destino.
O Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) criou um site para os solicitantes de refúgio no Brasil encontrarem informações confiáveis e úteis. Os dados divulgados pelo Acnur revelam que o número de refugiados tem aumentado sistematicamente. “Por 12 anos consecutivos, houve aumentos dos números globais de deslocamento forçado. No ano passado, atingiu níveis históricos em todo o mundo, chegando a 120 milhões de pessoas, de acordo com dados de maio de 2024.”
Cabe destacar o relevante papel desempenhado pelo Programa de Apoio para a Recolocação dos Refugiados – PARR, criado em outubro de 2011 pela Endoc, consultoria especializada em imigração, com o apoio do Acnur e do Centro de Referência para Refugiados da Cáritas Arquidiocesana de São Paulo, com o objetivo de sensibilizar a sociedade e, principalmente, o empresariado para a assimilação da capacidade que refugiados e solicitantes de refúgio têm de contribuir para a economia do Brasil.
O PARR possui um dos maiores bancos de dados eletrônicos do País exclusivamente sobre os refugiados e as informações coletadas contêm dados essenciais para um mapeamento detalhado do perfil pessoal, acadêmico e profissional desse público, com o objetivo de melhor inseri-lo no mercado de trabalho. Os registros do programa incluem ainda dados específicos sobre empresas mais sensibilizadas com a causa e dispostas a receber os candidatos, além de informações sobre as vagas oferecidas.
Muitos são profissionais extremamente qualificados, competentes e talentosos, mas, por serem refugiados, acabam por se tornar invisíveis para a sociedade. Para aqueles que se interessam pelo tema, sugiro uma visita ao site talentosinvisiveis.com.br, que busca apresentar as qualificações daqueles que pretendem construir uma vida nova no Brasil.
Outra iniciativa interessante: algumas universidades oferecem vagas para refugiados, a partir de formulário de solicitação na diretoria acadêmica. É obrigatório ter o status de refugiado reconhecido e validado pelo Comitê Nacional Brasileiro para os Refugiados no momento da solicitação, ter o ensino médio completo e apresentar as documentações exigidas. Comissões internas avaliam as referidas solicitações de vaga.
Temos o desafio de formar e educar os estudantes e a sociedade para o respeito às diferenças culturais, a diversidade e para o exercício da cidadania. A Lei 13.445, de 2017, tem como princípios a universalidade dos direitos humanos, o repúdio e a prevenção à xenofobia, ao racismo e a qualquer tipo de discriminação, não criminalizando a migração. Garante a igualdade de tratamento e de oportunidade ao migrante, além de inclusão social, laboral e produtiva por meio de políticas públicas. Temos a lei. Precisamos agora exigir e garantir que ela seja cumprida.
Publicado na edição n° 1316 de CartaCapital, em 26 de junho de 2024.