Mais de 100 milhões de eleitores são aptos a votar, mas participação não deve passar de 20%, estimam autoridades mexicanas. Foto: Stringer/AFP

Publicado originalmente por DW 

Os mexicanos participam neste domingo (1/06) de uma eleição inédita para escolher todos os juízes do país, incluindo os que compõem a Suprema Corte, em uma tentativa do governo de blindar o poder judiciário da influência do crime organizado.

Serão eleitos por voto popular 881 juízes federais, incluindo os nove ministros da Suprema Corte do México, além de juízes estaduais e magistrados que integrarão o Tribunal Eleitoral e o Tribunal Disciplinar — responsável por fiscalizar a atuação das cortes. Ao todo, o México renovará 2,6 mil cargos no Judiciário. Outros 4 mil postos deverão ser preenchidos em uma nova eleição prevista para 2027.

Este é o primeiro pleito deste tipo em todo o mundo, resultado de uma polêmica reforma judicial aprovada em 2024. O governo da presidente mexicana, Claudia Sheinbaum, defende que o novo modelo de escolha de magistrados será a solução para combater a corrupção enraizada no Judiciário.

A reforma foi defendida pelo antecessor de Sheinbaum, Andrés Manuel López Obrador, que frequentemente entrou em conflito com os tribunais e os acusou de servir às elites política e econômica.

Contudo, o novo modelo tem gerado fortes críticas quanto à possível perda de independência do Judiciário e ao risco de que organizações criminosas consigam ocupar cargos por meio de aliados eleitos pela população. Também é visto como uma forma de o partido de Sheinbaum ganhar poder nos tribunais. Os escolhidos terão mandatos de nove anos, com direito à reeleição.

A presidente do México, Claudia Sheinbaum, defende a reforma judicial como ato democrático. Foto: picture alliance / ASSOCIATED PRESS

Sheinbaum argumenta que apenas aqueles que desejam preservar a “corrupção e os privilégios” se opõem à reforma. “Agora, o que queremos é que seja o povo do México a decidir”, declarou a presidente em um vídeo divulgado no sábado.

“Hoje não escolhemos apenas pessoas. Escolheremos o tipo de justiça que queremos para nosso país”, disse Guadalupe Taddei, presidente da autoridade eleitoral mexicana, o INE, durante a cerimônia de abertura do pleito que classificou como “um desafio sem precedentes”.

Risco de baixa participação

A expectativa é de baixa participação nas urnas neste domingo — o INE estima que entre 13% a 20% dos quase 100 milhões de eleitores aptos compareçam à votação. A complexidade do processo e o elevado número de candidatos — 7,7 mil disputando 2,6 mil cargos — são apontados como obstáculos à adesão popular.

Além disso, especialistas alertam para o risco de que organizações criminosas ampliem sua influência sobre o Judiciário.

“Há razões para acreditar que as eleições podem ser mais facilmente infiltradas pelo crime organizado do que outros métodos de seleção judicial”, disse à agência de notícias AFP Margaret Satterthwaite, relatora especial da ONU sobre a independência de juízes e advogados.

Ela acrescentou que isso também representa o risco de o eleitorado não escolher os candidatos com base em seu mérito.

Para Luis Carlos Ugalde, ex-presidente da autoridade eleitoral mexicana, é provável que os cartéis tentem influenciar os resultados de forma velada.

Ampla lista de candidatos e complexidade do pleito são vistos como desafios para a participação da população. Foto: Fernando Llano/AP/picture alliance

Candidatos ligados ao crime organizado

A ONG Defensorxs identificou cerca de 20 candidatos “arriscados”, que teriam contato com o crime organizado, incluindo Silvia Delgado, antiga advogada do narcotraficante Joaquín “Chapo” Guzmán, cofundador do Cartel de Sinaloa preso nos Estados Unidos.

“Toda pessoa tem direito a ser assistida por um advogado”, disse Delgado à AFP, que concorre ao cargo de juíza no estado de Chihuahua, no norte do México.

Fernando Escamilla, candidato a juiz estadual em Nuevo León, também está nesta lista. Ele foi advogado de Miguel Ángel Treviño, antigo líder dos Zetas, um extinto cartel conhecido por sua brutalidade.

Leopoldo Chávez, outro candidato do estado de Durango, esteve preso por quase seis anos nos Estados Unidos por tráfico de metanfetaminas. “Nunca me apresentei a vocês como o candidato perfeito”, afirmou ele em um vídeo no Facebook.

Triagem de candidatos

Para concorrer, é necessário apenas ter autorização para advogar, não possuir antecedentes criminais no México e manter “boa reputação” entre os juízes. Deixa de ser exigida a aprovação em concurso público ou, no caso das cortes superiores, a indicação presidencial.

Carlota Ramos, advogada e subdiretora do gabinete de Sheinbaum, reconheceu que embora o risco de que as máfias se infiltrem nas instituições seja real, isso já ocorre de forma “invisível”.

“Temos cortes e tribunais locais inteiros que foram efetivamente capturados pelo crime organizado”, apontou a funcionária, que participou da seleção dos candidatos. Segundo ela, o modelo de seleção permite uma triagem melhor dos candidatos.

Originalmente publicado no Deutsche Welle

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Last Update: 01/06/2025