Mato Grosso aprova lei que pode gerar desmatamento de mais de 5 milhões de hectares
Carolina Bataier
Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Na última quarta-feira (8), a Assembleia Legislativa do Mato Grosso aprovou um Projeto de Lei Complementar (PLC) que pode gerar a derrubada de até 5,5 milhões de hectares de floresta – área equivalente ao tamanho da Croácia – de acordo com estudo apresentado pelo Observatório Socioambiental do Mato Grosso (Observa MT), que publicou uma nota de repúdio à proposta.
O PLC 18/2024 permite que áreas do bioma amazônico no estado sejam reclassificadas como Cerrado. Com isso, a reserva legal (porcentagem de mata que deve ser preservada) nas propriedades rurais nessas áreas cai de 80% para 35%, já que o Código Florestal Brasileiro é mais tolerante com o desmatamento no Cerrado. Como consequência da flexibilização, o país fica mais longe da meta estabelecida pelo Governo Federal de zerar o desmatamento até 2030.
“Esse desmonte acontece em um contexto de agravamento da crise climática. Em 2023, Mato Grosso foi o segundo estado com a maior emissão bruta de gases de efeito estufa, responsável por 11,4% das emissões totais do Brasil”, informa a nota de repúdio emitida pelo Observa MT, que aponta os riscos da aprovação do projeto. O estado líder em emissões de gases do efeito estufa é o Pará.
O observatório destaca que parte dessas emissões é resultado das mudanças de uso do solo. Atualmente, cerca de 38% do território do Mato Grosso é ocupado por atividades agropecuárias, com destaque para pastagens, que ocupam mais de 21 milhões de hectares; e plantações de soja, ultrapassando os 10 milhões de hectares. A maior parte do desmatamento concentra-se no Cerrado mato-grossense. As áreas com cobertura florestal representam 54% do território, com concentração na Amazônia, ao norte do estado.
“O avanço do desmatamento tanto na Amazônia quanto no Cerrado mato-grossense é uma ameaça ao clima global e à biodiversidade”, destaca a nota.
Para Alice Thuault, diretora-executiva do Instituto Centro de Vida (ICV), organização dedicada a pesquisas socioambientais há mais de 30 anos no Mato Grosso, a proposta responde a uma demanda do mercado internacional.
“O agronegócio brasileiro está muito confortável em termos de demanda. Vai ter nova demanda, tem uma pressão sobre o território e, com isso, uma pressão para aumentar a área de plantio e buscar a expansão”, avalia.
O PLC 18/2024 foi apresentado pelo deputado estadual Nininho (PSD), ruralista, cujo patrimônio declarado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas eleições de 2022 ultrapassa os R$ 6 milhões. Entre bens do deputado, estão dez fazendas, em municípios dos estados de Mato Grosso e Pará.
Pressão do agronegócio
Na avaliação de Marcondes Coelho, membro do Observa MT, a aprovação do PLC 18/2024 é mais um sinal da articulação entre as câmaras legislativas para o desmonte de políticas ambientais.
“Projetos com redações muito similares surgiram no Congresso Nacional e nos estados de Goiás, Rondônia e Pará. Esse padrão reflete uma estratégia coordenada de desmonte das políticas ambientais, incluindo o Código Florestal, com propostas que desconsideram evidências científicas e ignoram os impactos ambientais e climáticos”, diz.
Em outubro de 2024, em outro golpe contra a preservação da floresta, o governador do estado do Mato Grosso sancionou a lei 12.709, que restringe a concessão de benefícios fiscais a empresas que aderirem à Moratória da Soja no estado. A moratória é um pacto firmado em 2006 entre empresas que se comprometem a não comprar o produto de fazendas com lavouras em áreas abertas após 22 de julho de 2008 na Amazônia.
A decisão foi celebrada pela Associação dos Produtores de Soja e Milho do Mato Grosso (Aprosoja MT). “Agora temos certeza de que além da justiça aos produtores, isso também movimentará ainda mais e ajudará no crescimento da economia do Estado do Mato Grosso”, celebrou Lucas Beber, presidente da Aprosoja MT, em vídeo publicado em seu perfil no Instagram.
Em texto publicado em novembro de 2024 no site da Aprosoja Pará, o presidente da associação, Vanderlei Silva de Ataídes, acusa a moratória de ser um embargo ao futuro do estado.
Edição: Nicolau Soares
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